2. Dentes afiados e porrete de âncora! (Khirodon No’hi)

Khirodon No’hi sentiu a mudança da maré. Era hora de acordar. O ar salgado, tão familiar, lhe tocou o rosto escamoso e lhe deu vontade de sorrir. E seria um grande sorriso, pois a boca do Orc Marinho era gigantesca e cheia de dentes afiados.

O oceano era sua casa de verdade, onde havia nascido. Foi no oceano que ouviu, pela primeira e única vez, a voz do criador.

Mas isso era passado. Muito havia acontecido, mesmo nestes poucos 3 meses. Muito mesmo. O jovem Khirodon No’hi já sabia o que era a batalha e tinha inimigos. Justamente aqueles que deveria proteger.  Por Netuno, como aquele mundo era confuso. E ainda havia muito a se aprender.

Mas primeiro, necessidades mais imediatas. No'hi sentia fome, muita fome. Seu corpo grande e forte precisava de sustento e ele comia muito. Peixes frescos, principalmente. E sabia exatamente onde conseguir. A costa era cheia de grandes cardumes deliciosos e a emoção da caça em si era um entretenimento a parte.

Mas havia um problema. Desde de sua primeira aparição, as patrulhas de pescadores armados estavam ficando mais intensas. Depois do primeiro incidente, muitos temiam sua presença mas estavam dispostos a lutar para garantir o sustento.

Deveria ter cuidado, pois um conflito poderia lhe machucar e seria obrigado a reagir novamente, resultando em outro desastre.

E naquele sorriso existia uma pureza tamanha que mal podia ser associada a uma figura como a dele. Corpulenta, robusta, feroz... mas ainda assim era como uma criança que acabara de conhecer o mundo. A água lhe trazia bons sentimentos e nela via conforto, tal conforto que só poderia se comparar ao colo materno.

A maré lhe acordou com um beijo de "bom-dia" e lhe puxou para vida, junto ao seu bocejo matinal que mais parecia um rugido. Coçou um pouco os olhos e olhou para o horizonte. Era lindo, mas solitário. Pensou no que iria fazer no dia e temeu encontrar mais uma vez seus caçadores.

O jovem Orc Marinho ainda lavava de si os sentimentos de seus sonhos confusos, que sempre envolviam seu próprio nome, qual ele se auto proclamara, e à imagem de ódio e violência que antecediam as cenas de morte e sofrimento dos pescadores. Como uma simples criança, fugia daquilo dentro de seus pensamentos e continuava seguindo em frente com sua vida até então vazia de expectativas e ambições. Mas, mesmo sem saber, tinha uma tarefa a cumprir... mas não antes de satisfazer sua fome voraz.

"Minha barriga ronca, No'hi com muita fome" Pensou já completamente recuperado do estado de sono que sempre se encontra após despertar.

Seguiu nadando, junto a sua âncora amarrada em suas costas por algumas cordas que nela já estavam quando a encontrou, até a costa. No caminho, tentou se distrair com seus movimentos durante a natação, já que para si era algo ainda mais relaxante do que ficar parado, seu corpo parecia agir em automático enquanto movimentava-se submerso... mas a fome parecia maior. Antes de chegar muito perto, subiu até a superfície e apenas colocou para fora seus dois olhos, tentando esconder sua barbatana, pois sempre que a mesma era avistada, gerava-se um grande furdúncio por todo local.

A barriga roncava e seus músculos começaram a se contrair para estimular o movimento de caça. Era uma dor cruciante que deveria ser controlada ao máximo para poder obter alimento sem ser atacado por ninguém.  Com suas narinas submergidas, tentava sentia a presença dos peixes que lhe serviriam como alimento e, com seus olhos fora d'água, buscava notar qualquer humano que vigiasse a costa.

Tinha que dar o bote em um momento certeiro, mesmo que ele mesmo tivesse que criar esta brecha de distração.

No'hi era um predador nato, mesmo com muita fome, sabia que a paciência era inimiga perfeição. O segredo estava em aguardar o momento certo para dar o bote, pois au presa era rápida e minimamente organizada. Cardumes era constantemente atacados por outros predadores naturais mas tinham a união e velocidade como elemente chava seu favor para despistá-los.

Por falar em outros predadores, não era incomum que No'hi tivesse que lutar por sua comida com tubarões, grandes morsas e uma vez até teve que se virar contra uma baleia orca. A vida selvagem era livre mas dura.

No'hi finalmente começa a sentir aquela vibração característica quando um bom cardume começa a se aproximar. Era um dos grandes, bastante comida. Nada melhor para começar seu dia.

Ainda não havia\ sido notado e se isso acontecer ele saberia. As vibrações na água sempre mudam quando um cardume detecta um inimigo. Mas ainda era seguro se aproximar com calma para o abate.

Dez metros, 8 metros, 5 metros...e finalmente ele sente. A vibração mudou, o predador havia sido detectado. Começava a perseguição.

Spoiler:

Os movimentos a serem seguidos pareciam vim na sua cabeça como ordens a serem seguidas enviadas por alguma parte de seu cérebro que nem mesmo ele conhecia. Era seu instinto. Os seus alvos eram pequenos, mas se aglomeravam em bando, o que facilitava o cerco e, assim, o bote. Procurou por outros competidores pelo seu alimento ao redor e, aparentemente não achou e, com seus olhos, não identificou nenhum humano na superfície a vista.

Era hora de atacar.

Submergiu e com seu nado, rodeou ao longe o cardume, se aproximando cada vez mais e, quando se sentiu seguro de que ia conseguir um bom número de peixes para saciar sua fome, fez com que um jato de água saísse de suas mãos direcionadas para trás, o que o impulsionou subitamente em direção ao cardume com sua boca cheia de dentes com o máximo de abertura.

Abocanhou, abocanhou, até que toda aquela nuvem alimentar tivesse se dispersado, sua barriga cheia e se sentindo feliz pro toda diversão que caçar lhe proporcionava.

No'hi avança contra o cardume. Sua investida leva direto ao centro da presa e sua bocarra se enche com uma quantidade enorme de peixes. Estava envolto por eles e os devorava com uma eficiência que somente os grandes predadores possuíam.

Mesmo que estivesse distraído em sua caça, No'hi não pode deixar de notar uma leve mudança na vibração da maré. Algo que vinha de uma distância considerável e não a confusão desordenada de sua presa em fuga.

Algo se aproximava e alta velocidade. E era grande.

O grande orc das profundezas se alegra com a comida e agora se sentia feliz e satisfeito. Mas não podia baixar a guarda. Seu senso de perigo lhe alertou quando algo foi sentindo vindo em sua direção à uma distância que ele não sabia mensurar.

Pela velocidade e tamanho, pensou ser um navio, mas não podia arriscar. Subiu para a superfície e deixou apenas seus olhos para fora, conferindo se algo se movia no horizonte, pois caso fosse visível fora d'água, seria mais fácil para ele deduzir como se defender, mas caso nada fosse visto, teria que ser rápido para procurar terra firme.

" Khirodon confuso. Khirodon quer saber o que é isso" Pensava repetidamente.