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    A Mão Esquerda de Deus - Capítulo I

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    A Mão Esquerda de Deus - Capítulo I Empty A Mão Esquerda de Deus - Capítulo I

    Mensagem por JTaguchi Ter Jun 16, 2020 1:03 pm



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    Mais um dia começava na vida de Bárbara. Metrô cheio, ônibus cheio, ruas lotadas de gente que iam trabalhar naquela cidade imensa e fedida que era Rio de Janeiro. Ainda era de manhã, por volta das sete e quinze, quando ela chegou ao campus da Pontifícia Universidade Católica, uma das faculdades mais caras da cidade. Ela não era nenhuma milionária, mas o pai trabalhara muito para pagar seus estudos e a bolsa de 50% ajudava bastante. O fato de ter escolhido Teologia e de ter sido muito bem recomendada pelo padre Otávio pavimentara seu caminho para que ela obtivesse o privilégio de estudar em uma das melhores universidades do país.

    Ao adentrar os portões do campus, ela sentiu um calafrio. O que seria? Decidiu ignorar e continuar sua caminhada em direção à sala.

    Sentiu o celular vibrar no bolso. Era uma mensagem da mãe.

    Mãe escreveu:Por favor, toma cuidado. Vi um urubu empoleirado no poste na frente de casa hoje.

    Ela ficou entre rir e revirar os olhos. A mãe era muito supersticiosa. No entanto, mais de uma vez ela tivera um desses "pressentimentos" que se mostrara certo. Será que dessa vez ela erraria? Difícil saber.

    Estava para subir uma escada quando ouviu uma voz a chamando. Era o padre Roberto, um dos professores da faculdade. Era um homem já beirando os sessenta anos, pele branca e corada por causa do calor, calvície já em estado avançado. Parecia um tanto apressado naquele dia.

    - Bom dia, minha filha. - cumprimentou ele. - Estava te procurando justamente por você. Tenho uma coisa que gostaria que entregasse para Otávio. Por um acaso estou te atrasando?
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    A Mão Esquerda de Deus - Capítulo I Empty Re: A Mão Esquerda de Deus - Capítulo I

    Mensagem por Dracone Qua Jun 17, 2020 5:06 pm

    Parecia realmente ser mais um dia como qualquer outro na vida de Bárbara. Levantou cedo, colocou o café para coar enquanto terminava de se arrumar. Vestiu-se normalmente para ir para a faculdade, camiseta básica, uma calça mais folgada de tecido mole, tênis. Ajeitou o escapulário no pescoço enquanto se olhava no espelho. De um lado uma medalha de São Bento. Do outro, Santo Antônio. Tinha um carinho especial por Santa Bárbara também, por motivos óbvios, mas esses eram seus "padrinhos".

    Tomou café rapidamente com a mãe pois não queria se atrasar e foi para o campus. Chegando lá, pouco antes de entrar no local sentiu um calafrio esquisito. Não demorou muito para receber uma mensagem da mãe.

    "Por favor, toma cuidado. Vi um urubu empoleirado no poste na frente de casa hoje."

    Riu e guardou o celular no bolso. " Às vezes dona Maria tem a imaginação bem fértil para desgraças. O coitado do Urubu deve estar só esperando algum gato, possivelmente atropelado na rua, terminar de morrer ali por perto."

    Sua mente formulou isso para soar racional. Mas a mãe dificilmente errava suas intuições.

    Quando estava subindo as escadas ouviu Padre Roberto a chamando. Cessou o passo e o encarou séria enquanto ele se dirigia a ela. Bárbara sempre fora de poucos sorrisos, mas depois da mensagem da mãe já estava esperando inconscientemente alguma merda acontecer.

    Padre Roberto escreveu:- Bom dia, minha filha. - cumprimentou ele. - Estava te procurando justamente por você. Tenho uma coisa que gostaria que entregasse para Otávio. Por um acaso estou te atrasando?

    - Bom dia, padre. Não, cheguei ainda faltando alguns minutos. - olhou para o padre curiosa em saber o que era para ser entregue - Posso entregar o que precisar.
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    A Mão Esquerda de Deus - Capítulo I Empty Re: A Mão Esquerda de Deus - Capítulo I

    Mensagem por JTaguchi Qua Jun 17, 2020 5:25 pm

    Bárbara se aproximou do clérigo, beijou-lhe a mão e pediu a bênção. O padre seguiu o protocolo, mas dirigiu a ela um olhar preocupado.

    Bárbara escreveu:- Bom dia, padre. Não, cheguei ainda faltando alguns minutos. - olhou para o padre curiosa em saber o que era para ser entregue - Posso entregar seja lá o que for, estou indo vê-lo agora mesmo.

    - Não é nada muito grave, mas preciso que ele tenha isso em mãos. E, sabe como é, eu nem sempre tenho tempo de ir até a paróquia dele para uma visita. - Roberto secou algumas gotas de suor da testa e suspirou. - Estou ficando velho, minha filha. Acho que a aposentadoria não está muito longe de mim.

    Os dois foram até uma sala espaçosa, típica da universidade: mesas de qualidade, ar condicionado, iluminação boa. Na janela, a paisagem da cidade que se estendia até aonde a vista alcançava.

    Padre Roberto pegou um embrulho na mesa do professor. Era um envelope de papel pardo com um volume grosso dentro. Estava lacrado.

    - Por favor, minha filha, entregue isso ao Otávio. - pediu. - Não mostre a ninguém e diga apenas que veio de mim. Ele sabe do que se trata. E tome muito cuidado. É algo muito importante.

    Bárbara pegou o embrulho, um tanto preocupada. Não era do tipo que costumava questionar muito, mas teve curiosidade. O Padre Otávio era conhecido por algumas polêmicas - a última, inclusive, custara-lhe muito caro perante membros mais liberais da paróquia: o padre se recusou a assinar uma nota de repúdio aos vigilantes que estavam em ação na cidade há mais ou menos dois anos.

    No entanto, a curiosidade durou pouco. De algum lugar lá fora, provavelmente da entrada, ecoaram três tiros. Ela ouviu gritos e o claro som de uma multidão assustada. De repente, mais tiros.

    Alguma coisa estava acontecendo. E, ao que tudo indicava, sua mãe estava certa.

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    A Mão Esquerda de Deus - Capítulo I Empty Re: A Mão Esquerda de Deus - Capítulo I

    Mensagem por Dracone Qui Jun 18, 2020 8:54 am

    Padre Roberto escreveu:- Não é nada muito grave, mas preciso que ele tenha isso em mãos. E, sabe como é, eu nem sempre tenho tempo de ir até a paróquia dele para uma visita. - Roberto secou algumas gotas de suor da testa e suspirou. - Estou ficando velho, minha filha. Acho que a aposentadoria não está muito longe de mim.

    - O senhor já ofereceu muito de si aqui dentro, padre, e acredito que ainda tem muito a ensinar - falou com um sorriso sincero.

    Ele pegou o embrulho em uma gaveta e estendeu a ela. Bárbara pegou o envelope sentindo a espessura do embrulho. Ficou curiosa quase a ponto de perguntar o que tinha ali dentro, mas se manteve no seu lugar.

    Padre Roberto escreveu:- Por favor, minha filha, entregue isso ao Otávio. - pediu. - Não mostre a ninguém e diga apenas que veio de mim. Ele sabe do que se trata. E tome muito cuidado. É algo muito importante.

    - Levarei em segurança, padre. Não se preocupe. Assim que terminar minhas aulas o encontrarei na paróquia para rezar um pouco. Minha mãe andou tendo pressentimentos ruins - riu sem graça. Era engraçado como no fim ainda levava em conta as doideras supersticiosas da mãe. Guardou o pacote dentro de sua bolsa no bolso mais escondido. Era muito importante, segundo o padre, iria tratar o assunto com cuidado.

    Quando iria abrir a boca para pedir a benção e se retirar ouviu tiros. Seu coração parou no mesmo instante e sentiu seu corpo gelar. Mais tiros e pessoas gritando. Seria na rua? Dentro da escola?

    - Isso foram tiros? - falou rápido e assustada, tentando olhar pela janela para ver se via algo na rua. Sentiu aquele pressentimento horrível de novo. Algo muito ruim estava acontecendo e poderia ficar pior se não agisse com um pingo de racionalidade apesar do medo - Vá para o último andar e leve os alunos que ver no caminho com o senhor. Eu vou ligar para a polícia e tentar ajudar quem está mais perto da entrada. Acho que os tiros vieram de lá.

    [Bárbara vai tentar entender o que está acontecendo mas sem se expor. Ela acredita que os tiros vieram da entrada da escola ou ali na porta mesmo e vai tentar conduzir as pessoas que devem estar em pânico ali para os andares de cima e se esconderem se for preciso. Se ela perceber que não tem como fazer isso ali sem levar um tiro, ela vai subir e ir avisando os outros alunos das outras salas/andares para se protegerem até a polícia chegar. Ah, e vai ligar para a polícia também.]
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    Mensagem por JTaguchi Qui Jun 18, 2020 2:30 pm

    Bárbara escreveu:- Isso foram tiros? - falou rápido e assustada, tentando olhar pela janela para ver se via algo na rua. Sentiu aquele pressentimento horrível de novo. Algo muito ruim estava acontecendo e poderia ficar pior se não agisse com um pingo de racionalidade apesar do medo - Vá para o último andar e leve os alunos que ver no caminho com o senhor. Eu vou ligar para a polícia e tentar ajudar quem está mais perto da entrada. Acho que os tiros vieram de lá.

    O padre pareceu extremamente assustado ao ouvir os tiros. Tiroteios eram comuns no Rio de Janeiro, mas a maioria deles se restringia às áreas de periferia, onde o tráfico era mais intenso. No entanto, exceções aconteciam vez ou outra.

    - Não posso permitir que você se exponha ao perigo desse jeito, filha. - disse ele, segurando-a pelo braço. - Vamos tirar alguns alunos do caminho e escondê-los na sala. Antes que o pior aconteça.

    Bárbara o acompanhou, caminhando abaixada para não ser mais uma vítima. Mais tiros foram ouvidos, dessa vez em outro lugar. Ficava cada vez mais difícil de saber de onde vinham os disparos. Talvez fosse mais de um atirador.

    Encontrou vários alunos no caminho. Estavam todos no desespero, atingidos pelo pior que o efeito manada fazia nas pessoas: tirar delas a capacidade de pensar por si mesmas e simplesmente seguir o fluxo.

    Ela chegou até o pátio próximo à praça de alimentação. Ouviu mais um tiro e vários gritos. Tentou manter-se abaixada para não chamar atenção quando viu, atrás do banco em que se escondia, um rapaz apontando uma arma a esmo. Era um rapaz negro com uma mochila nas costas e óculos de lente colorida.

    - HOJE VOCÊS VÃO SENTIR O QUE O MEU POVO SENTE HÁ SÉCULOS, BRANQUELOS MALDITOS! - berrou ele, a arma em riste. - VAMOS FAZER VOCÊS PAGAREM, BURGUESES DE MERDA! VOCÊS NOS DEVEM ATÉ A ALMA!

    Bárbara decidiu ligar para a polícia. Pegou o celular e digitou o número, aguardando que fosse atendida. No entanto, o atirador virou-se na direção onde ela estava bem na hora em que a central de atendimento da polícia atendeu a chamada. Ela sabia que ela a tinha visto.

    - ESTOU TE VENDO, BRANQUELA MALDITA! - gritou ele.

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    Mensagem por Dracone Qui Jun 18, 2020 3:58 pm

    Padre Roberto escreveu:- Não posso permitir que você se exponha ao perigo desse jeito, filha. - disse ele, segurando-a pelo braço. - Vamos tirar alguns alunos do caminho e escondê-los na sala. Antes que o pior aconteça.

    "Onde eu estava com a cabeça? Pensando em ir sozinha de encontro com os tiros? Padre tem razão."

    Acompanhou o padre abaixada, tentando ser furtiva. O coração parecia querer saltar pela boca, sentia as mãos geladas e um tremor nas pernas. Parecia ter mais de um atirador ali dentro e isso a apavorava. Se fosse real matariam a metade do campus antes que a polícia chegasse.

    No refeitório tentou se esconder, mas viu ali o atirador. As palavras que ele gritava em ódio às pessoas ali dentro a fizeram pensar no tumulto que alguns grupos extremistas andaram causando pela cidade. Nunca pensou que veria isso diante dos seus olhos. Pegou o celular, tremula, mas conseguiu digitar o numero da polícia. Infelizmente o atirador percebeu seu movimento bem na hora que havia atendido do outro lado da linha.

    Atirador escreveu:- ESTOU TE VENDO, BRANQUELA MALDITA! - gritou ele.

    Sua primeira reação foi enfiar o celular dentro da blusa, na esperança de que ele talvez não tivesse visto o que ela estava fazendo, mas deixou a chamada ligada.

    - Por favor, não machuque ninguém. - falou mais alto, torcendo para que a chamada não tivesse caído e que ouvissem tudo isso do outro lado da linha - Nós da Pontifícia Universidade Católica não temos absolutamente nada contra sua luta, mas por favor não nos machuque.


    Se abaixou onde estava, fechou os olhos bem apertado e começou a orar em pensamento, desesperada.

    "Por favor, Deus, não deixe que ele machuque mais ninguém aqui. Por favor... Que a Cruz Sagrada seja a minha luz, não seja o dragão o meu guia. Retira-te daqui, satanás! Bebe tu mesmo os teus venenos...Pai, me proteja e a todos aqui dentro." rogava em pensamento, sentindo a medalha de São bento pesar em seu pescoço de tanta aflição.

    Manteve-se quieta e encolhida no canto, implorando para que aquele homem não se aproximasse dela e que a polícia chegasse logo.
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    A Mão Esquerda de Deus - Capítulo I Empty Re: A Mão Esquerda de Deus - Capítulo I

    Mensagem por JTaguchi Qui Jun 18, 2020 4:26 pm

    Bárbara não estava numa situação onde podia exigir alguma coisa. Para começar, estava desarmada. Além disso, o rapaz olhava para ela e agora direcionava o cano da arma para a sua cabeça.

    Bárbara escreveu:- Por favor, não machuque ninguém. - falou mais alto, torcendo para que a chamada não tivesse caído e que ouvissem tudo isso do outro lado da linha - Nós da Pontifícia Universidade Católica não temos absolutamente nada contra sua luta, mas por favor não nos machuque.

    - Vocês não tem nada contra? - indagou ele, indignado? - MENTIRA! VOCÊS NOS OPRIMIRAM POR SÉCULOS! CADÊ OS PRETOS NESSA PORRA?! ISSO VAI SER NOSSO! VAI SER TUDO NOSSO!

    Ele se aproximou, a pistola ainda apontada para ela. Bárbara rezava baixinho, tentando manter a mente calma e focada. A oração a ajudava nisso enquanto procurava por uma solução que não resultasse num disparo.

    - Reza bastante, braquela... - o rapaz disse, num riso de escárnio. - Você vai representar toda a vitória dos oprimidos contra os opressores. Nós finalmente vamos revidar tudo. Vai, ajoelha.

    Sua voz tinha uma entonação embargada, com um traço horrendo de fanatismo, como se ele fosse capaz de fazer qualquer coisa sem hesitar nem se arrepender. Com a mão livre, ele começou a soltar o cinto que prendia suas calças. Um sorriso insano apareceu em seu rosto.

    - EI! - uma voz desconhecida gritou, em algum lugar fora da visão de ambos.

    O atirador se virou para a direção do grito. Então, três tiros numa sequência rápida e implacável. Um segundo depois, o rapaz que estava para atirar em sua cabeça estava caído no chão, com três buracos de uma 9mm deformando seu rosto. Uma poça de sangue começou a se espalhar no piso da praça de alimentação enquanto ele tremia em estertores de morte.

    Um homem apareceu em sua frente, segurando uma pistola. Bárbara teve vontade de fugir, mas viu um distintivo na mão livre.

    - Calma, menina. Sou policial. - disse, checando os sinais vitais do rapaz.

    Foi apenas a constatação do óbvio.

    O policial respirou fundo, mas não guardou a pistola.

    - Ele atirou em você? - inquiriu.

    Lá na rua, viaturas da polícia começaram a estacionar. As sirenes estavam ligadas.

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    Mensagem por Dracone Sex Jun 19, 2020 8:52 am

    Não teria conversa com aquele sujeito. Ele andou na direção de Bárbara com a arma apontada para ela, ainda insistindo naquele discurso de opressão. Em toda a sua vida até agora tinha tratado a maioria das pessoas ao seu redor (pelo menos as que mereciam) com todo o respeito e dignidade. Não era justo ouvir aquilo, muito menos passar por algo assim. Mas se estava acontecendo era porque algo maior estava por trás, algum propósito haveria de ter, por pior que a situação fosse.

    Atirador escreveu:- Reza bastante, braquela... - o rapaz disse, num riso de escárnio. - Você vai representar toda a vitória dos oprimidos contra os opressores. Nós finalmente vamos revidar tudo. Vai, ajoelha.

    Quando Bárbara percebeu as intenções dele sentiu uma onda de nojo, seu estômago se revirou. Logo em seguida, sentiu raiva. Uma raiva que nunca sentira por nenhuma criatura viva nessa terra, uma raiva tão avalassadora que apertou as unhas na palma da mão com força até sentí-las ferir suas mãos, os dentes cerrados com tanta força como se segurasse algo insano e extremamente primitivo dentro de si.
    Talvez se aquele policial não tivesse chegado ali uma tragédia ainda pior tivesse acontecido. Certamente ela morreria porque jamais se prestaria àquilo. Ouviu os tiros e logo em seguida ele estava no chão, agonizando.

    Policial escreveu:- Calma, menina. Sou policial. - disse, checando os sinais vitais do rapaz. - Ele atirou em você?

    Bárbara deixou o ar de seus pulmões sair, um pouco mais aliviada. Mas sentia todo o corpo estar bambo e a cabeça doía. Havia sentido uma descarga de adrenalina muito grande e um estresse imenso em poucos minutos.

    - Não, estou bem. - falou com a voz um pouco trêmula - Mas só porque não chegaram nem um minuto depois.

    Procurou pelo padre Roberto para checar se ele estava bem. Pensava nos tiros que ouvira na porta, quantos feridos, quantos mortos? Algum de seus amigos estaria entre os feridos ou mortos? Sua cabeça doía muito ao pensar em tudo isso. Então veio a coisa mais obvia do mundo depois de todo aquele trauma: o choro. Sentiu as lágrimas correrem discretas por suas bochechas, limpou com a palma da mão mas elas insistiam em cair. Sentiu-se aliviada por ainda estar viva ao mesmo tempo que ainda tentava se acalmar. "Obrigada, Pai."
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    Mensagem por JTaguchi Sex Jun 19, 2020 9:58 am

    A tensão acumulada dos últimos minutos deu lugar a um choro compulsivo. Bárbara percebeu o quão próxima esteve de morrer como certamente algumas pessoas naquele dia tinham morrido. As lágrimas escorreram fartas por seu rosto enquanto ela soluçava. Diante dela, o policial respirou fundo, mas manteve a compostura de alguém calejado com situações como aquela. De forma atabalhoada e constrangida, ele passou o braço livre por seus ombros e encostou sua cabeça em seu ombro.

    - Calma - disse. - Já acabou. Está tudo bem.

    Os policiais começaram a vasculhar o campus. Dois deles se aproximaram de onde ela estava, apontando armas para os dois.

    - Bom dia - cumprimentou o policial, num tom profissional. Apresentou sua carteira de identificação. - Sou policial, como podem ver. Neutralizei os dois meliantes. Aqui está a arma. A garota aqui quase foi alvejada por eles.

    Os outros, ao verem a identificação, prestaram continência. Um agente recolheu as armas e as colocou em sacos plásticos enquanto outros cobriam os corpos com lona. Ela observou atônita enquanto a polícia evacuava o campus e trocava informações em rádios. Ouviu a palavra "mortos" algumas vezes.

    Foi tirada daquele estado de morbidez pelo toque gentil do Padre Roberto.

    - Vamos, filha. - disse, os olhos marejados. - Precisamos sair daqui. Vou te levar para casa.
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    A Mão Esquerda de Deus - Capítulo I Empty Re: A Mão Esquerda de Deus - Capítulo I

    Mensagem por Dracone Sex Jun 19, 2020 5:07 pm

    Antes de sair dali Bárbara respondeu algumas pergundas dos policiais. Iria ser chamada para depor mais tarde mas por hora estava liberada. Saiu dali com uma sensação de morte e ao mesmo tempo nunca se sentiu tão viva, afinal, se não tivesse tanta fé talvez estivesse morta agora. Era um alívio amargo pois pensava muito nas pessoas que tinham perdido suas vidas ali, apesar de ter saído ilesa a tragédia iria marcar o lugar por anos. "Que Deus conforte as famílias."

    Em casa contou tudo para a mãe que já estava sabendo de alguma coisa pela Tv e já tinha ligado vinte e duas vezes para o celular de Bárbara que se encontrava no silencioso pois estava até então respondendo perguntas. Contou tudo e chorou de novo no ombro da mãe, relembrando toda aquela desgraça.

    - Achei que fosse morrer. Mas morreria com dignidade, aquele cão imundo não tocaria um dedo em mim. Espero que queime no inferno para pagar o que fez... - falou, os olhos perdidos em algum lugar, um brilho de raiva aceso.

    A mãe tentou entender um pouco o lado do rapaz já que assistia muito à TV apesar do relato da filha e por ser uma senhora muito caridosa, até demais.

    - Não há perdão para isso, só punição. Do  lado de cá ou de lá. Felizmente a policia fez seu trabalho, mas duvido que estão achando isso bonito. O cara tem que ter muito sangue frio para assumir a responsabilidade de matar dois assassinos e ainda sair como escroto.

    Iria jejuar alguns dias, até porque as memórias do ocorrido tratavam de tirar boa parte do seu apetite. As velas brancas para os santos do seu pequeno e humilde altar no quarto iriam cumprir sua função. Trazer luz nessa escuridão. À noite antes de dormir acendeu a vela, colocou o copo de água ao lado. O brilho da chama refletia no rostinho pequeno da Aparecida. Pegou o rosário de madeira que deixava enrolado no manto azul da imagem e o beijou murmurando algumas preces. Ficou ali por muito tempo antes de dormir.

    No outro dia iria visitar padre Otávio. Precisava muito de seus conselhos e também entregar seu envelope.
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    Mensagem por JTaguchi Sáb Jun 20, 2020 9:32 am

    As velas queimavam no pequeno altar do quarto de Bárbara. Uma semana depois do tiroteio e a universidade ainda não voltara às atividades. A prefeitura tinha decretado três dias de luto oficial em solidariedade às vítimas do massacre, atitude que foi amplamente divulgada e origem de mais algumas polêmicas.

    A pior parte daquela merda toda era, sem dúvida, as redes sociais. Bárbara viu todas as desgraças possíveis digitadas por gente que estava a quilômetros de distância e que não fazia ideia do que tinha rolado. De repente, ela foi obrigada a conviver diariamente com a ridícula classificação de gente branca e rica que lhe deram sem nenhuma vez terem perguntado se ela realmente fazia parte do tal grupo privilegiado. A mídia fez um verdadeiro circo em cima do massacre, como urubus que se fartavam sobre cadáveres ainda frescos. O assunto ainda ia render muito pano para manga.

    Bárbara respirou fundo e fitou o altar, rezando o terço em voz baixa. Ouviu alguém bater na porta e a mãe indo atender. Alguma movimentação aconteceu na sala, algumas palavras foram trocadas. Ela não entendeu direito. Logo depois, batiam em sua porta.

    - Filha, tem visita para você. - a mãe anunciou.

    Assim que abriu a porta, Bárbara se deparou com o padre Otávio. Ele era um homem no mínino estranho. Tinha por volta dos cinquenta anos, mas parecia mais jovem. Possuía o aspecto saudável e vigoroso de um atleta e uma presença marcante quando entrava em qualquer ambiente. Bárbara sabia que ele tinha um histórico bem interessante para um clérigo: família pobre, infância difícil, três anos de serviço na marinha e um imenso prazer por praticar esgrima. Como padre, era muito querido pela paróquia, apesar de certas posições excêntricas e polêmicas recentes.

    O padre dirigiu-lhe um olhar preocupado.

    - Bom dia, filha. - ele cumprimentou. - Como você não apareceu na última missa, decidi fazer uma visita e ver como você está.
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    A Mão Esquerda de Deus - Capítulo I Empty Re: A Mão Esquerda de Deus - Capítulo I

    Mensagem por Dracone Dom Jun 21, 2020 11:09 am

    Padre Otávio escreveu:- Bom dia, filha. - ele cumprimentou. - Como você não apareceu na última missa, decidi fazer uma visita e ver como você está.

    Bárbara se aproximou dele e fez um cumprimento de mãos.

    - Sua bênção, padre. - falou abaixando a cabeça em sinal de respeito. Depois lhe dirigiu um olhar culpado - Me desculpe por faltar na missa. Eu não tenho me sentido bem para sair de casa. Tenho a sensação de que vou ouvir tiros a qualquer momento.

    E era verdade. Algumas vezes ameaçara sair, mas parou a mão no trinco da porta sem coragem para girá-lo e ver a rua. Afinal tinha prometido ao padre Roberto que entregaria aquele pacote para seu mentor e até então não tivera coragem de sair, apesar de ter ensaiado algumas vezes.

    - Parece que as coisas estão saindo fora de controle. É difícil até acompanhar as notícias. - sorriu com morbidez - Quase estouraram a minha cabeça e as pessoas ainda tentam defender aqueles loucos enquanto estou presa dentro de casa. Ficam distorcendo os fatos como se fossem uns coitados... Mas deixe esse assunto de lado, estou muito feliz em ver o senhor! Por favor se sente - e o conduziu para a sala - Como vão as coisas na paróquia?
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    A Mão Esquerda de Deus - Capítulo I Empty Re: A Mão Esquerda de Deus - Capítulo I

    Mensagem por JTaguchi Ter Jun 23, 2020 11:47 am

    Bárbara escreveu:- Sua bênção, padre. - falou abaixando a cabeça em sinal de respeito. Depois lhe dirigiu um olhar culpado - Me desculpe por faltar na missa. Eu não tenho me sentido bem para sair de casa. Tenho a sensação de que vou ouvir tiros a qualquer momento.

    Padre Otávio ouviu tudo com atenção, sentado numa cadeira ao lado de sua cama.

    - É normal, filha. - disse. - Você passou por uma situação muito difícil. Felizmente, saiu ilesa. Mas acredito que a lembrança desse triste episódio vai acompanhá-la pelo resto da vida. Tome seu tempo. Deus não está enclausurado dentro daquelas paredes.

    Bárbara escreveu:- Parece que as coisas estão saindo fora de controle. É difícil até acompanhar as notícias. - sorriu com morbidez - Quase estouraram a minha cabeça e as pessoas ainda tentam defender aqueles loucos enquanto estou presa dentro de casa. Ficam distorcendo os fatos como se fossem uns coitados... Mas deixe esse assunto de lado, estou muito feliz em ver o senhor! Por favor se sente - e o conduziu para a sala - Como vão as coisas na paróquia?

    A expressão dele mudou a expressão, parecendo saber do que ela dizia.

    - Eu tenho acompanhado o que andam falando. Se quer o meu conselho, não leia nada. A mídia está fazendo um verdadeiro circo em cima da desgraça alheia e parece ter transformado um massacre num debate político. As coisas parecem ter chegado a um novo nível de insanidade.

    Isso era verdade. Por todos os cantos, havia pessoas se aproveitando do momento para angariar apoio, anunciar novas candidaturas e ganhar novos seguidores. As coisas estavam realmente insuportáveis.

    - As coisas na paróquia vão bem, minha filha. Todos muito preocupados com você. - retomou o padre. Então respirou fundo, parecendo escolher as palavras. - Eu, inclusive, estou aqui para te pedir uma coisa. Sei o que você passou naquele dia e sei o quanto é difícil lidar com isso. Mas nossa paróquia está dividida. Infelizmente, tenho irmãos de batina que vêm falando coisas espúrias sobre o acontecido e mantendo nossa comunidade confusa. O que venho te pedir, minha filha, é que venha para a missa e fale sobre o que aconteceu com você diante de toda a nossa congregação. Conte a eles a verdade. Eu te darei este espaço.

    Era um pedido difícil. No entanto, Bárbara sabia o quanto as mentiras espalhadas pela mídia e por alguns padres corruptos estava confundindo as pessoas. A maioria não conhecia as vítimas do massacre e até o momento, nenhuma família tinha se pronunciado. Talvez, se ela falasse, seria capaz de dar voz aos demais. Se ela apenas começasse a corrente, outros poderiam criar coragem e falar sobre o que tinha acontecido.
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    A Mão Esquerda de Deus - Capítulo I Empty Re: A Mão Esquerda de Deus - Capítulo I

    Mensagem por Dracone Ter Jun 23, 2020 4:54 pm

    Padre Otávio escreveu:- Eu tenho acompanhado o que andam falando. Se quer o meu conselho, não leia nada. A mídia está fazendo um verdadeiro circo em cima da desgraça alheia e parece ter transformado um massacre num debate político. As coisas parecem ter chegado a um novo nível de insanidade.

    Bárbara abaixou os olhos, pensativa. Lembrou-se do rosto do atirador segundos antes de ele ser baleado. Nunca esqueceria aquele sorriso perverso mas isso ninguém se importaria nunca. Quantas pessoas passaram por algo assim, ou até pior - porque poderia ter sido bem pior - e ficaram desamparadas? Todos os dias. E ainda ver um bando de filhos da puta tentando defender o indefensável.

    - Sim. Isso aqui está virando o próprio inferno.

    Padre Otávio escreveu:- As coisas na paróquia vão bem, minha filha. Todos muito preocupados com você. - retomou o padre. Então respirou fundo, parecendo escolher as palavras. - Eu, inclusive, estou aqui para te pedir uma coisa. Sei o que você passou naquele dia e sei o quanto é difícil lidar com isso. Mas nossa paróquia está dividida. Infelizmente, tenho irmãos de batina que vêm falando coisas espúrias sobre o acontecido e mantendo nossa comunidade confusa. O que venho te pedir, minha filha, é que venha para a missa e fale sobre o que aconteceu com você diante de toda a nossa congregação. Conte a eles a verdade. Eu te darei este espaço.

    Ela engoliu seco e encarou o padre.

    -Não me diga que andam defendendo os assassinos dentro da igreja. Padre, por favor, retire essas pessoas que deixam os outros confusos do círculo. O senhor não pode fazer algo para tirá-los do nosso meio? Isso é detestável! - seus olhos transbordaram subitamente uma raiva e a voz carregada de revolta. - Não deveriam nem estar diante do altar quem tem esses discursos, a não ser para se ajoelhar e pedir perdão pela existência miserável.


    Bárbara se calou imediatamente. Por um segundo perdera o controle para a raiva que andava sentindo e temeu que o padre achasse que ela estava enlouquecendo.

    - Perdão, padre. - falou mais calma, tentando engolir toda a raiva, mas ela entalou na garganta. Era difícil receber essas notícias. - Eu... eu realmente não queria ter que falar sobre isso em público. Só queria que as pessoas parassem de tocar no assunto e tudo voltasse ao normal de novo, mas vejo que nada vai ser como antes pra mim. Mas também não posso deixar de tentar fazer algo para ajudar e se o senhor me pede por isso eu farei, mesmo que me cause tristeza.
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    Mensagem por JTaguchi Qua Jun 24, 2020 10:58 am

    O padre a ouviu em silêncio, parecendo compreender cada palavra que ela dizia. Bárbara não segurou as lágrimas por muito tempo e a lembrança do que passou no campus se transformou num choro que unia não só o trauma que tinha passado, mas também seu desejo por se vingar de todos os criminosos da cidade.

    - Sei que preferia ficar em silêncio e se recolher em oração. - disse ele. - Mas o dever e meu compromisso com a verdade me obrigam a dizer que seu silêncio nesse momento não fará diferença. Enquanto você se esconde, pessoas espalham mentiras, distorcem os fatos e transformam em vítimas aqueles que foram algozes. O policial que salvou sua vida está às vésperas de ser expulso por causa do que estão dizendo. Lembre-se de que o mal só triunfa quando os bons se omitem.

    Ele estava certo. Se ela se mantivesse calada, seria mais uma a garantir que os únicos a contar a história fossem os mentirosos. A verdade deveria vir à tona, e ela deveria ser sua mensageira. A ideia de que seu sofrimento poderia servir como condutor de uma nova mudança a fez pensar que, no fim das contas, ela sobrevivera por um motivo.

    - Você sobreviveu, Bárbara. - arrematou o padre. - O que acha que as pessoas que morreram gostaria de dizer? E as que ainda estão hospitalizadas, sem saber se vão poder ter a chance de estarem em seu lugar?

    Aquela era uma boa pergunta. O que ela fará?
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    Mensagem por Dracone Qua Jun 24, 2020 3:21 pm

    Padre Otávio escreveu:- Sei que preferia ficar em silêncio e se recolher em oração. - disse ele. - Mas o dever e meu compromisso com a verdade me obrigam a dizer que seu silêncio nesse momento não fará diferença. Enquanto você se esconde, pessoas espalham mentiras, distorcem os fatos e transformam em vítimas aqueles que foram algozes. O policial que salvou sua vida está às vésperas de ser expulso por causa do que estão dizendo. Lembre-se de que o mal só triunfa quando os bons se omitem.

    Barbara sentiu mais raiva ainda quando ouviu sobre o policial. "Não posso ficar quieta e me esconder de medo. Deus há de me ajudar a usar as palavras certas para fazer com que me entendam."

    Padre Otávio escreveu:- Você sobreviveu, Bárbara. - arrematou o padre. - O que acha que as pessoas que morreram gostaria de dizer? E as que ainda estão hospitalizadas, sem saber se vão poder ter a chance de estarem em seu lugar?

    Ela respirou fundo tentando filtrar todo aquele peso e aquele ódio do seu peito.

    - Elas iriam querer que a verdade fosse dita. E aparentemente ninguém mais está disposto a fazer isso além de mim. Irei comparecer à próxima missa, padre. Fique em paz. Espero que minhas palavras afastem as cobras que cercam a igreja e esclareça o que aconteceu para os confusos.

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    Mensagem por JTaguchi Qua Jun 24, 2020 4:15 pm

    No domingo de manhã, a paróquia cheia.

    Fazia tempo que Bárbara não via tanta gente e precisava admitir que sentia falta da missa. Usando seu véu branco e sentada discretamente ao lado da mãe, ela acompanhou tudo em silêncio e feliz por estar viva para rezar mais um pouco e, principalmente, por poder falar enquanto muitas vítimas daquele tiroteio não podiam.

    - Irmãos, o momento em que nos encontramos é difícil. - anunciou o padre, antes de encerrar a missa. - Muitas coisas foram ditas e, infelizmente, nem todas foram verdadeiras. Os irmãos sabem que falo sobre o triste massacre que presenciamos há pouco mais de uma semana. Vocês sabem que estão calando vozes dissonantes e que, aos poucos, criam a ideia de que criminosos foram vítimas enquanto as verdadeiras vítimas permanecem em leitos de hospitais ou mesmo na sepultura. Por isso, decidi que a verdade precisa vir à tona e convidei uma das vítimas do massacre que para falar sobre o que ela sofreu e como ela veio parar aqui. Bárbara, por favor. Compartilhe sua história conosco.

    Ela se levantou e caminhou até o altar, sentindo todos os olhos da paróquia sobre si. Havia curiosidade no ar, quase palpável. Ao se ver diante da igreja cheia, Bárbara sentiu as pernas tremerem de leve. Muitos rostos conhecidos e um em especial que lhe chamou a atenção: um homem na casa dos trinta anos sentado lá no fundo, próximo à saída. Era loiro e tinha o cabelo comprido, na altura dos ombros que estava amarrado num rabo de cavalo. Tinha o aspecto severo e usava óculos de grau que lhe dava um ar inteligente. Ela nunca o tinha visto por ali.

    Recuperou-se do devaneio e encarou a multidão à sua frente. Era hora de falar toda a verdade.

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    Mensagem por Dracone Qui Jun 25, 2020 6:35 pm

    Padre Otávio escreveu:- Irmãos, o momento em que nos encontramos é difícil. - anunciou o padre, antes de encerrar a missa. - Muitas coisas foram ditas e, infelizmente, nem todas foram verdadeiras. Os irmãos sabem que falo sobre o triste massacre que presenciamos há pouco mais de uma semana. Vocês sabem que estão calando vozes dissonantes e que, aos poucos, criam a ideia de que criminosos foram vítimas enquanto as verdadeiras vítimas permanecem em leitos de hospitais ou mesmo na sepultura. Por isso, decidi que a verdade precisa vir à tona e convidei uma das vítimas do massacre que para falar sobre o que ela sofreu e como ela veio parar aqui. Bárbara, por favor. Compartilhe sua história conosco.

    Nunca se imaginou naquela situação em toda a sua vida. Era constrangedor sentir todos os olhos da igreja sob si. Se levantou e ajeitou o véu, caminhou até o altar com calma, respirando fundo para se acalmar e ter forças para dizer. Olhou por alguns segundos as pessoas ali e reparou em um homem que nunca tinha visto antes sentados nos fundos. Parece que até gente desconhecida tinha parado para ver aquele show de horrores.

    - Bem... - começou, suspirando e tentando olhar diretamente para as pessoas ali, para passar convicção - Primeiramente quero que saibam que isso é uma das coisas mais difíceis que já tive que fazer na vida. Nunca pensei que minha voz seria tão necessária dentro dessa igreja, ainda se tratando de algo tão sórdido. Mas se Deus me permitiu sobreviver é porque tenho algo a fazer nessa terra ainda e sei que esse momento é um deles.

    - A verdade é tão obvia que me espanta saber das conversas que rondam essas paredes. O que me faz pensar que quem distorce a verdade ou caiu em completa ignorância - e isso por si já é uma grande armadilha do diabo - ou realmente não possuem caráter para aceitar a verdade. O que significa que já caíram não só na armadilha do diabo como estão sendo porta-voz dele dentro da igreja e isso... chega a doer em mim. Não espero agradar a todos com minhas palavras hoje afinal nem Nosso Senhor Jesus Cristo agradou a todos e por isso foi crucificado.

    - Estive cara a cara com a morte, com o assassino que tirou a vida daquelas pessoas. Ele entrou naquela universidade com um único propósito: matar o máximo de pessoas e destruir famílias. Eles chegaram atirando de forma aleatória, o pânico tomou conta das pessoas ali mas consegui me esconder com Padre Roberto que leciona na universidade. Quando tentei ligar para a polícia o atirador percebeu.

    A voz de Bárbara começa a estremecer ao chegar nesse ponto da narrativa. Lembrar daquele momento ainda era uma tortura.

    - Ele falou coisas horríveis o tempo todo para aterrorizar a todos ali. Disse que iria me usar como símbolo da sua luta que, sinceramente, não acredito que nada tem a ver com o que aconteceu ali. Se não fosse aquele policial ele teria me violentado na frente de um padre e depois atirado em minha cabeça e eu não poderia estar aqui para relatar aos senhores o que aconteceu. O que me faz pensar que aquele policial foi um instrumento valioso na mão de Deus para que a verdade pudesse ter chances de chegar até vocês. Não houve rendição da parte dos atiradores, não ouve sequer tempo para diálogo, um segundo a mais e eu estaria morta e talvez o próprio policial e por sua vez mais outras vidas.

    - O Atirador fez sua escolha naquele dia quando resolveu sair de casa para matar inocentes. E espero do fundo do coração que a punicão não termine na morte - seus olhos brilharam. Nesse momento ela não sentia mais medo e as palavras vinham com firmeza em sua boca. Tinha plena convicção de que o que estava falando era a mensagem do próprio Deus - O que me preocupa de verdade é o que estão dizendo dentro dessa igreja. Defender o imperdoável é um crime para nossas doutrinas e saibam que os anjos estão sondando suas intenções. Desde quando vidas inocentes e famílias destruídas para sempre valem menos do que uma alma que escolheu o caminho de Satanás? Eu não acredito que todos aqui dentro realmente acreditem que aqueles monstros foram vítimas e estão distorcendo a verdade para confundir nossos irmãos, mas tenho certeza de que essa tendência a passar a mão na cabeça das crias do diabo são mascaradas por uma "consideração ao próximo" ou uma "empatia" que vocês não tem pelas reais vitimas. E não me digam que tudo isso foi dito com a melhor das intenções para entender os dois lados da moeda, não existe dois lados e a verdade é uma só.

    - Suas intenções podem até parecer boas, mas como dizem, o inferno está cheio delas. E eu espero que ele transborde com suas boas intenções. - Fez silêncio então olhou para o padre, buscando aprovação - Não tenho mais nada a dizer, padre.

    Se retirou quieta e absorta em seus pensamentos, convicta de que tinha feito a coisa certa.
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    A Mão Esquerda de Deus - Capítulo I Empty Re: A Mão Esquerda de Deus - Capítulo I

    Mensagem por JTaguchi Seg Jun 29, 2020 9:21 am

    Bárbara sabia o que estava fazendo. Ao dirigir-se ao altar da igreja, aceitar o microfone do padre e discursar com todo o fervor que possuía, ela se colocou em evidência e defendeu aquilo que acreditava da forma mais veemente possível. Não podia permitir que a verdade fosse sufocada e usada para fins espúrios como estavam fazendo. O fato de isso tudo acontecer dentro da paróquia que frequentava tornava as coisas ainda piores.

    Na medida que falava, viu as pessoas ao seu redor ficando espantadas, desconfortáveis, outras demonstrando real discordância. A maioria, no entanto, parecia ter aderido completamente ao seu discurso e entendido sua mensagem. Eles a aplaudiram de pé, demonstrando completa solidariedade. Enquanto se retirava, muitos lhe diziam palavras de conforto e de incentivo. O desconhecido, no entanto, apenas olhou-a de uma forma enigmática enquanto a congregação se dispersava depois do fim da missa.

    Sua mãe lhe deu um abraço e acariciou seu cabelo.

    - Você precisa dizer a verdade, minha filha. - disse. - Seu pai ficaria orgulhoso.

    O sol brilhava naquela manhã. Enquanto abraçava a mãe, Bárbara vislumbrou aquele mesmo homem desconhecido ao longe, olhando diretamente para ela.

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    A Mão Esquerda de Deus - Capítulo I Empty Re: A Mão Esquerda de Deus - Capítulo I

    Mensagem por Dracone Qua Jul 01, 2020 9:16 am

    Sua vida ficara um pouco mais conturbada depois daquele episódio na igreja. Apesar dos presentes ali terem aplaudido de pé suas palavras a repercussão disso na internet descambou para alguns ataques às suas redes sociais - que Bárbara já não usava com tanta frequência desde o massacre - de pessoas que não concordavam com sua opinião. Viu algumas matérias de gente que assinava em baixo do seu discurso, mas muitos padres e a própria CNBB discordara e pior, ameaçaram punição a ela e ao padre Otávio. Ainda estava esperando o resultado disso mas até então a única coisa que fizera fora excluir suas redes sociais simplesmente porque ficara insuportável.

    Ainda tinha fresco na mente aquele homem misterioso que aparecera na paróquia naquele dia. O que ele estaria fazendo ali? Nunca o tinha visto. Cogitou se aproximar e perguntar se era novo nas redondezas, só para descobrir quem era, mas achou melhor ficar quieta. Apenas entregou o envelope do padre e foi para casa, pois se sentia esgotada mentalmente naquela manhã.

    Se passara alguns dias depois de ter excluído suas páginas na internet, estava sentada na frente do computador ouvindo uma música baixa enquanto fazia pesquisas de assuntos que se interessava quando ainda ia para as aulas na faculdade - até isso resolvera trancar por enquanto. Mas sempre com uma aba aberta procurando por mais notícias sobre a repercussão que tudo estava tendo na internet e na tv. Ultimamente sua vida se resumia a isso - internet, ajudar a mãe no trabalho, nem na paróquia tinha aparecido novamente e isso lhe incomodava. Decidiu que iria na próxima missa de cabeça erguida, não iria fugir como uma covarde.
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