A mão dele passa por dentro do próprio pilar que ele habitava, de lá de dentro sai um tridente como se a coisa fosse pura ilusão, uma ilusão impossível, já que eles estava acima dela segundos atrás.
Ele não parece se importar com quem faria a tradição, nem com o fato de Serge tomar afrente, as garras frias e “sem vida” arranham a pele escura do Ithaeur e tiram dele a essência que ele demandava, nada surpreendente.
- Nós somos os porteiros proles de Ur, nossa obrigação aqui é guardar o portão e guiar visitantes pelos caminhos da cidadela até o Rei de Espadas se é a ele que procuram. - a boa notícia é que provavelmente o porteiro não tinha entendido ou escutado nada que Serge havia dito, ou nada que havia sido comentado em língua humana, a má notícia é o que poderia estar do outro lado da porta e se eram exatamente com o Rei de Espadas que queriam negociar.
O tridente se enrosca no pescoço de um dos outros espíritos parecido com o próprio Porteiro, mas menor e nitidamente indefeso contra a força de seu abusador - Leve-os até o rei. - a ordem é expressa, mas sem vida, sem sentimento nenhum, nem medo.
O espírito armado os acompanha até o portão, o tridente toca e move aquela coisa monstruosa que provavelmente todos eles juntos nem teriam capacidade de mover, o menor toma a frente em silêncio seguindo as ordens de seu superior, no caminho eles são emaranhados por outros espíritos que aproveitam o portão aberto pra saírem da parte de dentro, a maioria deles nitidamente nem eram da corte do medo, boa parte pequenos demais, frágeis demais, alguns se destacavam fosse pelo tamanho mais avantajado, outros misteriosos nem pareciam visíveis, mas todos sentiam alguma coisa tocando seus corpos, alguma coisa que nem estava lá, mas um em especial passa par eles, voando logo acima de suas cabeças, o barulho irritante, beirando o insuportável como se fossem garras sobre quadro negro, a sombra amorfa com dezenas de mãos, mas Arranha-Dromo não parece dar nenhuma atenção especial a eles e passa direto.
O lado de dentro é diferente do lado de fora, é tão ou mais sufocante, o ar é repleto de cinzas e pesado, dá pra sentir o amargo delas no nariz e na língua, o ar seco, mas a temperatura não tem nada de especial, nem cheiro algum, torres pra cima e pra baixo habitam todos os lugares, repletas de celas sem luz, algumas eram apenas ruínas, outras pareciam novas, umas parecendo serem feitas de pedra na era medieval outras de tijolo e concreto, todas enegrecidas.
Olhar pros lados mostra um horizonte infinito que termina em fumaça ou nuvens, ou os dois, o mesmo acontece pra baixo só que escuro como fel e tudo que eles tem pra caminhar são pontes tortuosas cobertas por cinzas e cascalho, que parecem que vão desabar a qualquer momento, existem outras iguais a essas em níveis diferentes, mas além delas o céu não é diferente do horizonte e tudo parece enegrecido como em um dia pálido e nublado.
O porteiro segue com eles por pontes e escadas, por horas parece que ele está os enrolando, andando em círculos, mas qualquer tentativa de se comunicar com ele só trás silêncio, esse que era quebrado por vozes ao pé do ouvido, gritos de agonia e medo que cortavam o ar e vinham de lugar nenhum, ou de alguma “cela / morada” próxima, mas cada um deles tinham certeza de que confiar em seus instintos ali era provavelmente um mau negócio.
os aparelhos eletrônicos funcionam mal, o celular marca números distorcidos, ficam cheios de “glitchs”, o ponteiro do relógio enlouquece e nunca marca a hora certa, ou hora nenhuma porque ficou parado… A coisa toda parecia um inferno e a cada passo era como se sugasse um pouquinho mais de qualquer esperança que houvesse neles.
Finalmente o porteiro chega a algo que não parece uma torre sem fim, um castelo digno de um rei ou melhor, um rei do medo, espíritos guardando o lugar como soldados estranhamente armados, uns com clavas, outros com machados e mais outros ainda com um fuzil Ar-15 que chegava a dar um nó na cabeça.
O lugar não emitia luz alguma, e parecia tão pálido quanto o resto do não-lugar. O porteiro se aproxima do guarda da entrada principal e diz apenas uma palavra - Urlu. - aquilo chega a soar ofensivo, ser tratado como hostes do lobo, até como praga quem sabe, mas o mondrongo cheio de olhos, mãozinhas e pistolas parece entender o recado e abre a porta pra alcateia e os deixa passar.
O porteiro fica pra trás como se não pudesse passar dali, o guarda também não os segue e a porta bate pesado às costas deles, mas logo outra a frente se abre e assim eles são guiados sala por sala onde nenhum espírito ou morador parece andar até chegarem uma sala real, diferente de todas as paredes enegrecidas e sem cuidado, não pelas paredes, mas pelo que havia pendurado nelas, espadas, centenas delas, milhares talvez, ao fundo um trono que mais parecia ter saído de Game of Thrones, todo forjado com espadas inutilizadas, derretidas talvez, a criatura sentada ao fundo ostenta poder, na cintura três crânios humanos e um deles indistinguível, algo de carne osso que nunca havia sido uratha ou humano, talvez algo pior, mas pareciam serem ostentados com orgulho.
Uma luz esfumeada, roseada a lânguida se acende por trás do trono conforme eles se aproximam e ajuda a enxergar o rei, ou que parecia o rei não se levanta, mas estende a mão que parecia intangível e pura sombra a ponto de parecer inofensiva, ele também parecia esperar a tradição, mas não cobrava seu "pedágio" diretamente como os porteiros, mas o cenário dessa vez parecia muito, muito pior que o anterior no portão, ou era isso que o silêncio absoluto que havia ali os avisava.
- Rei de Espadas:
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