Fichas

Armadura Leve, Daisho, Katana (Reserva), 7 kokus

Braseiro, Guarda-chuva de vime, Garrafa de água, Kimono e Sandálias reservas,
Kit de chá, Lanterna, Manta, Pote de Culinária, Rações para uma semana e Tenda pequena
Adicionais: Banco Dobrável Pequeno, Chapéu de Abas Largas, Hakama, Haori, Netsuke (Colar), Mochila,
Pederneiras, Porta-níqueis e Tapete Tatami.

Uma Seda que Encerra o Gume da Espada


Há um fio invisível que atravessa os destinos humanos, ligando-os ao mesmo tempo em que os desgasta. Um fio que não pode ser cortado, mesmo pelo aço mais afiado. Nasci sob o peso desse fio, tecida na seda das tradições Kakita, mas condenada ao toque áspero de um segredo que me aprisionaria para sempre. Meu nome é Mio, e esta é a história de como uma lâmina pode ser forjada, não apenas no calor da forja, mas no fogo do desejo.
Era uma manhã de neblina quando Tomoe chegou. Eu tinha apenas três anos, mas a imagem da jovem sendo escoltada até nossa casa permanece vívida. Seu quimono branco, ornamentado com garças bordadas em azul pálido, contrastava com o semblante sombrio dos homens do clã Caranguejo que a entregaram. Ela era a filha mais nova dos Hida, um tributo silencioso ao equilíbrio político entre as casas após anos de conflitos.
Naquele momento, ela parecia uma boneca de porcelana que havia sido abandonada pela vontade de um destino cruel, suas mãos repousando imóveis como se tivessem sido quebradas. Meus pais a ignoraram com a mesma frieza com que se ignora uma mancha no tapete. "Ela não pertence a este lugar", dizia minha mãe sempre que sua presença era mencionada. "Uma peça de outro tabuleiro."
Por anos, Tomoe existiu nas sombras da casa Kakita, uma presença que todos percebiam, mas que ninguém ousava reconhecer.
Eu tinha sete anos quando a floresta me acolheu em seus braços frios e úmidos. Havia me perdido durante um passeio que deveria ser breve, mas o tempo escorregou como areia entre os dedos. Com as sombras da noite se fechando ao meu redor, me encolhi contra as raízes de uma árvore antiga. Soluçava de medo até que, exausta, sucumbi ao sono.
Foi então que ouvi o farfalhar das folhas. Não era meu pai, nem os servos. Era Tomoe. Ela parecia surgir da escuridão como um espírito benevolente, sua silhueta iluminada apenas pelo brilho distante da lua. Sem dizer uma palavra, ela me levantou e me carregou nas suas costas magras, o tecido do quimono roçando contra minha pele como seda fria.
Tomoe me carregava com passos firmes, embora seus pés descalços sangrassem sobre as pedras afiadas do caminho. Sua respiração era estável, como se suportasse não apenas meu peso, mas algo muito maior.
Ao chegarmos em casa, o olhar de meu pai foi primeiro de alívio, mas logo se transformou em fúria. Ele tomou-me nos braços, mas, ao ver Tomoe, os guardas avançaram com lanças em riste, prontos para perfurar o corpo que momentos antes fora meu abrigo.
Algo em mim se partiu. “Ela me salvou!”, gritei. Meus olhos encontraram os dele, e por um momento, senti o peso de toda a história de nossa família pairando sobre nós. Foi a primeira vez que usei minha posição para protegê-la.
Depois daquele dia, Tomoe tornou-se minha sombra. Onde quer que eu fosse, ela me acompanhava, sempre em silêncio, sempre atenta. Comecei a observar os detalhes que antes haviam me escapado: a forma como seus dedos habilidosos arrumavam meu cabelo, o brilho discreto de seus olhos quando pensava que ninguém a estava olhando, a maneira como sua voz soava como água correndo quando sussurrava alguma história para me distrair.
Mas a casa Kakita era cruel. Mesmo sob minha proteção, havia quem desprezasse sua presença. Lembro-me de um dia no dojo, quando encontrei os garotos mais velhos "treinando" com ela, seus corpos cercando-a como cães selvagens. Antes que pudesse pensar, minha mão já estava na empunhadura da espada de madeira.
A postura que assumi não era a de uma criança. Era a de uma Kakita. Quando o mais velho caiu ao chão, o silêncio no dojo era absoluto. O mestre Haruto, que assistia de longe, aproximou-se com olhos que avaliavam cada gesto meu. Ele propôs algo que mudaria minha vida: se eu aceitasse treinar formalmente, Tomoe seria deixada em paz. Eu aceitei. Não por ambição, mas por ela.
Os anos passaram, e meu treinamento me transformou. Eu já não era a menina que chorava na floresta. Meu nome era sussurrado com reverência no clã, e meu domínio da espada era comparado ao de mestres experientes.
Mas, enquanto eu crescia, algo mais crescia também. Algo que não podia ser ensinado nem repelido com disciplina. Os momentos que passei com Tomoe se tornaram diferentes. O simples ato de segurar sua mão enquanto ajustava o obi do meu quimono fazia meu coração bater mais rápido. Sua proximidade parecia uma lâmina contra minha pele: perigosa, mas irresistível.
O que começou como amizade transformou-se em algo proibido, secreto e perigoso.
Foi numa tarde de primavera, sob as cerejeiras em flor, que nossos lábios se encontraram pela primeira vez. O vento carregava pétalas entre nós, mas tudo o que eu podia sentir era o calor de sua respiração, o gosto de sua presença. Eu sabia que o que fazíamos era errado, mas também sabia que era inevitável.
Meses se passaram, e nossos encontros tornaram-se mais frequentes, mais ousados. Uma noite, em meu quarto, enquanto a casa dormia, ela veio me encontrar. A luz pálida da lua atravessava as portas de papel, criando sombras que dançavam em sua pele nua quando ela se desfez do quimono. Cada movimento seu era como uma pintura cuidadosamente traçada, e o toque de seus dedos em minha pele tinha a delicadeza de uma lâmina deslizando sobre a seda.
Nossos corpos se encontraram como se fossem feitos um para o outro, e, por um momento, o mundo fora daquela sala deixou de existir. O som de sua respiração, o calor de seu corpo contra o meu, tudo parecia conspirar para nos manter unidas. Naquele instante, eu não era a herdeira da casa Kakita, e ela não era a refém do clã Caranguejo. Éramos apenas duas almas entrelaçadas, desafiando o destino que tentava nos separar.
Mas o destino, como uma lâmina, nunca hesita em cortar o que é mais precioso.
Quando completei quinze anos, tudo mudou. Kentaro, meu primo, descobriu nosso segredo. Ele não precisou de palavras para me ameaçar. O sorriso em seu rosto quando me abordou no jardim dizia tudo.
_Você irá ao Torneio de Jade comigo – ele disse casualmente, como se estivesse pedindo um favor.
_E usará suas habilidades para garantir que eu saia vitorioso. Caso contrário... – ele não precisou terminar a frase.
Naquela noite, olhei para Tomoe enquanto dormia ao meu lado. Seu rosto parecia tão tranquilo, tão intocado pela escuridão que nos cercava. Mas eu sabia que essa paz era ilusória. O fio invisível que nos unia também nos estrangulava, e o mundo ao nosso redor estava pronto para cortar o que tínhamos, a qualquer momento.
E como a lâmina de Kakita, eu sabia que, ao final, haveria sangue.