Descoberta (Javier)

A Estalagem na Encruzilhada! Costumava ser o ponto de partida para grandes aventuras, agora é só mais um beco imundo onde bêbados contam suas mentiras e reclamam sobre a queda de Temeria, após a morte do rei Foltest. Pior é o consenso geral de que isso tenha sido culpa de um Witcher, o que não ajuda muito para ganhar bons olhos no local. E já faz um tempo em que Witchers são desprezados pela população, são o pior de todos os mundos e ali, naquele local, as coisas são bem claras.

- Olha só, hehe... Grande guerreiro aqui, duas espadas.

Bêbados? Sim, bêbados. Não havia uma maldade inerente na homem, já que seu medalhão não vibrou - em condições normais, provavelmente não falaria as mesmas coisas frente a frente contra Javier. Com seus sentidos apurados podia sentir a mistura dos álcoois no hálito do mesmo.

- Hoje não, hoje não! Tirem ele daqui!

Era o estalajadeiro, bateu com um copo de madeira no balcão e apontou para o bêbado na mesma hora, tirando a atenção do local para ele próprio e referindo-se ao homem que tentou iniciar um problema com Javier. Rapidamente e à contra-gosto, dois homens guiaram o 'corajoso' para um canto mais isolado da estalagem. Pela naturalidade em que tudo aconteceu, parece ser uma cena bastante comum no local.

- Witcher! Está procurando trabalho ou confusão? Não temos nenhum monstro perturbando a região, você precisa verificar no marcador... lá fora.

Claramente, embora não quisesse expulsar Javier de forma direta, não queria o mesmo ali. Mesmo sendo um cliente pagante, era mais fácil lidar com os bêbados quebrando alguma coisa, do que morrendo na ponta da espada. E, realmente havia um marcador do lado de fora da estalagem, talvez houvesse algum contrato esperando - especialmente agora, na virada da estação.

- Bom.

Disse o estalajadeiro, assim que conseguiu se livrar de dois problemas - voltando então para suas atividades usuais, assim como todos os demais voltaram a beber, um pouco desanimados por não terem uma briga para participar ou assistir.

Ainda estava um pouco frio e o vento do inverno começa a ir embora, apesar de soprar - os rastros de sol da primavera começavam a surgir e já era mais fácil de ver as ruas com mais pessoas, trabalhando ou apenas por estarem lá, sem nenhum outro lugar para estar. Com a guerra ainda acontecendo, muitos não tinha mais o que fazer - a grande maioria por ter perdido tudo. Sejam suas casas ou parentes.

O marcador constava no local, fora da taverna e haviam alguns pedidos. A maioria deles eram coisas de que a população local - indicada por representante, pedia aos invasores da guerra - mais comida. Mas havia um papel com um contrato que poderia ser útil.

Embora todos soubessem falar sem muitos problemas, já que a lingua falada era uma necessidade real e passada pela familia - a escrita, já nem tanto. Era raro quem soubesse ler, mais raro ainda quem soubesse escrever - geralmente, com isso, a escrita era um amontado de palavras do jeito que eram faladas, o Witcher estava acostumado com cartas em que tinha dificuldade para entender o que estavam querendo dizer, achava erros até mesmo em cartas de nobres.

O vilarejo não era muito grande, então havia uma alameda principal - com uma linha reta até seu fim que dava para uma casa bastante modesta, um pequeno estábulo, um galinheiro e algumas cabras soltas na frente da casa. Haviam dois garotos com os rostos sujos e suados arrancando ervas daninhas numa pequena horta.

Um deles percebeu a aproximação, virou a cabeça e largou o punhado de mato e terra que tinha nas mãos, cutucando o outro garoto.

- ... chama o pai.

O garoto que foi alertado, aparentemente mais novo, soltou também o que estava fazendo e correu para dentro de casa, indo atender ao pedido do outro. Não demorou muito, assim que ele entrou, um homem mais velho saiu pela porta, o canto da cabeça tinha cabelos brancos e a barba rala também.

- Witcher! Viu meu pedido?!

- Catriz!? Mas que porcaria... Uma bela de uma porcaria de uma galinha chique!

Incrédulo, por ainda achar que era uma galinha gigante - talvez mais ainda por ter que separar algum dinheiro para resolver essa situação. Limpou a testa com as costas das mãos pensando no que poderia oferecer ao Witcher que tivesse algum valor considerável. Ele sabia bem que monstros davam trabalho e não era a mais fácil das atribuições, então precisava valer a pena para o homem e assim, não teria mais nenhum animal morto.

- Ah! Ei, moleque! Pega a coisa! A caixinha!

O garoto mais jovem ergueu as sobrancelhas e sorriu, correu para dentro. Sven encarava Javier com um sorriso no rosto, como se tivesse pensado na melhor idéia que já teve em toda a sua vida. Momentos depois, o garoto voltou com uma caixinha adornada nas mãos. Javier, ao bater o olho, viu que se tratava de um filactério. Ele por si só não tinha muito valor - mas tinha algumas possibilidades.

Poderia já ter algum espírito preso ali dentro ou então, ele poderia usar para prender um espírito. Não era uma tarefa fácil, mas prender um espírito por tempo suficiente poderia transformá-lo em material de runa para uma de suas espadas. No final, compensaria.

Se o filactério estivesse intacto. Seria interessante ouvir a história de como aquilo chegou a um fazendeiro.

- Aí está! Não sei para que serve. Ele treme às vezes no inverno, hehe. Consegui... Ahn...

Vacilou um pouco antes e parece não ter pensado muito bem na explicação, mas por fim, soltou as palavras que saíram num misto de orgulho e vergonha.

- Roubei de um mercador que passou na cidade há alguns anos. Mas se você se livrar da catriz, pode ser seu.

Ele esperou ansioso a análise do Witcher sobre a caixa que foi oferecida. Ao fim, se deu por satisfeito - não precisaria dar nenhum dinheiro e aquela caixa não tinha nenhuma serventia para ele. Claro, ficaria um pouco triste de não mais ver a caixa se mexendo quando estivesse mais frio - mas tudo bem, era importante que o monstro fosse derrotado e pudesse viver em paz. Tão logo vieram as perguntas - Sven coçou o canto da cabeça enquanto pensava e organizava sua mente para que pudesse responder.

- Bem... Não tem um horário certo. Ela só apareceu duas vezes, mas matou vários animais. Parecia que tava brincando com os bixos - não brincando, mas jogando de um lado pro outro, mas comeu uns tecos. Uma vez foi de manhã na outra, no fim da tarde.

Podia ser uma Cocatriz jovem, ou pior - uma mãe com filhotes. O horário do fim da tarde era mais acertado com as descrições e livros, mas uma mãe não se importa com os horários, se tiver filhotes famintos. Mas o fato de "parecer estar brincando" era incomum. Cocatrizes eram ferozes e matavam rápido.

- Sobre a paulada... Eu não sei bem se acertou, eu acho que sim, hehe.

Sorriu, sem nenhuma vergonha da informação incompleta ou possível mentira. Javier conhecia o coração dos homens, já havia lidado com eles e muitas ocasiões - era difícil aceitar ajuda e era fácil deixar a língua se desenrolar e exagerar em seus feitos para não parecerem covardes.

- Tá bom! Vou ficar com a caixinha que treme até lá!

O local reservado aos animais tinha um pequeno celeiro, uma área um pouco mais aberta e um galinheiro. Essa área aberta parece ter sido o local alvo para a cocatriz, o chão estava rastelado e haviam manchas de sangue já seco há algum tempo. Cocatrizes eram monstros pesados geralmente, havia um rastro fraco com as pegadas saindo do local com pressa e indo em direção a um pequeno monte mais próximo. Os animais que ainda estavam vivos pareciam amendrotados com qualquer presença, sinal de que viram algo recentemente que os deixou assim. As pegadas batiam com o tipo de monstro - precisava decidir a melhor forma de se aproximar.

Não havia muita clareza com relação às pegadas, mas os olhos e sentidos treinados do Witcher conseguiam vislumbrar o caminho. Era quase como sentir um puxão na direção da qual a cocatriz seguiria. Detalhes mais específicos eram difíceis de visualizar apenas pelas pegadas, mas o tamanho indicava um monstro adulto - não era comum, geralmente se aventuravam a caçar animais selvagens, sabiam que humanos geralmente eram problemas, mas não impediu de atacar a fazenda de Sven.

O caminho seguia morro acima, até que a velocidade diminuia e as pegadas pareciam mais unidas. Um pouco mais longe, no que parecia ser uma torre derrubada de madeira, havia um emaranhado de relva, galhos e pedaços de uma tenda completamente rasgada, estava o objetivo de Javier - aquilo devia ser o ninho, se não fosse da Cocatriz, seria de qualquer outra coisa - mas tão próximo assim da fazenda, era quase impossível que não fosse.

De onde estava, ainda relativamente distante do ponto final e para onde olhava, não era possível ver a criatura.

Seguia pacientemente o rastro deixado pelo animal. Mais a frente o animal perdia a pressa e as pegadas se tornavam um pouco mais clara. 

 Ao que parece, um adulto.

Seu comportamento dos padrões, segundo seus conhecimentos, denunciava que filhotes estavam por perto.

 Uma cicatriz não correria riscos com humanos desnecessariamente, no caso, era necessário alimentar os filhotes.

Não estava vem por cento certo, mas era o que se formava em sua mente.

 Uma espécie de torre danificada surge com detalhes do que seria um ninho, o que fortalece sua análise.

 Não focado apenas na torre, mas fazendo uma varredura completa, desde ambos os francos até o solo com as pegadas e, claro, com seus sentidos atentos para identificar algo pelo olfato ou audição.

Sentiu uma pancada no chão, outra, outra, outra, outra. Em seguida, um som agudo rasgou o a calmaria da tarde, era um grito de sons misturados que doía o ouvido. A suspeita se confirmou, realmente era uma cocatriz, uma das grandes. O mosntro veio pela sua lateral, correndo pela grama e marcando seus passos com firmeza, deixando pegadas no local e mostrando estar completamente incomodada por conta da aproximação de Javier em seu ninho. Teria pouco tempo para pensar, como era típico da criatura, saltou e mirou sua queda diretamente no witcher, com o pescoço e o bico cerrado a frente.

Não foi difícil achar sua localização, já que sua apresentação foi chamativa demais, talvez numa tentativa de intimidar o bruxo. Sacou sua espada específica enquanto seu glóbulo ocular parecia brilhar em amarelo ouro.

O monstro salta e vem de cima, numa investida forte e brutal. O witcher apenas calculou a rota e o perímetro de alcance do monstro e se afastou, sem dar as costas, enquanto procurava por algo trecho onde houvesse arvore(s) para deixar aumentar a complexidade do combate e obrigar a cocatriz a fazer mais do que apenas atacar em um campo aberto.

Com a espada em punho, armada segurando com ambas as mãos, segurava alta, um pouco abaixo do pescoço com a ponta indicando o inimigo. Tentaria ver alguma brecha no pouso dela e atacar com uma investida rápida e o mais precisa possível. Uma estocada. Talvez, se tivesse um pouco de sorte, não precisaria dançar com as arvores.

A velocidade do Witcher foi suficiente para esquivar da criatura, o contra ataque mirando uma brecha, nem tanto. A criatura não era tão ágil com seus pés, mas o pescoço movia-se de forma improvável e rápida por demais, girou no próprio eixo o bico da criatura encontrou a espada, fazendo um som característico de duas lâminas se chocando. Sabia bem, os ossos e por extensão, os bicos das cocatrizes eram extremamente densos.

Era possível ver um arranhão no local atingido pela espada, mas como se limpasse uma sujeira, nada muito sério ou que pudesse interormper o combate. Não causou real dano. Seria necessário tomar cuidado com a cabeça da cocatriz e mirar em locais mais frágeis para que pudesse causar real dano.

Passando pela torre e um pouco mais a frente havia um pequeno bosque. O meio das árvores ajudaria o witcher, a cocatriz teria dificuldade para se mover e acertar, mas poderia fugir mais facilmente, também - não era do feitio de monstros, mas era uma possibilidade que precisava ser considerada.