Prólogo - Ícaro Mellia

"Viver é a coisa mais rara do mundo. A maioria das pessoas apenas existe."
Oscar Wilde

Sentado em um banco defronte, Ícaro podia observar um belo jardim, que ficava entre a escola na qual dá aula e uma universidade, repleta de azaleias, tal jardim era seu ponto de relaxamento, mas também o momento de suas reflexões mais profundas e amarguradas. Seus medos consumiam sua alma aos poucos e nada de sua filosofia parecia ter serventia, podia sentir-se como um charlatão.

"Carta à Felicidade"

Poderia pensar e se queixar do significado disso.

[...]

Um senhor senta ao seu lado e passam-se alguns minutos.

De barbas grisalhas e um aspecto de rigidez e de erudição, com sua voz grasnada, conversa com Ícaro – Boa tarde, meu jovem, não pude deixar de reparar, mas está tudo bem com sua pessoa?




Reparando na falta de interesse do rapaz em conversar, prosseguiu com a fala – Eu sou professor daquela universidade ao lado – apontou para faculdade –, chamo-me Carlos Nougué, e você?

Ícaro escreveu:– Me desculpe, estou absorvido pelos meus pensamentos, e as vezes eles ficam bem profundos e distantes. Sou Ícaro Mellia e sou professor daquela aconchegante escola.

– Entendo, nós homens carregamos um fardo enorme neste plano, desconheço sua situação, mas posso perceber que passas por um momento difícil. – Nougué pausa para respirar profundamente, enquanto seus olhos divagam pela natureza a sua frente, depois volta a olhar para Ícaro e continuou – Deus deu-nos uma vida cheia de provações para merecermos estar ao lado dele, sem ele é como voar até o sol com asas de cera; a queda é garantida... –, observara que Ícaro carregava um escapulário e prosseguiu com calma – Desculpas-me se estou sendo muito direto, mas tu tens ido a igreja católica? Já consideraste que talvez seja disso que precisas?

Uma borboleta colorida voava entre os dois durante o diálogo, talvez o suficiente para distrair Ícaro, talvez não estivesse muito interessado em desenvolver o assunto, mas, também, talvez fosse dessa conversa que precisava ter. Desde quanto tudo começou a desmoronar em sua vida, não tem tido com quem contar, teve de ser forte para sua filha e para si mesmo, as suas dores da perda, da doença e do futuro obscuro e desconhecido apertavam seu coração, espremiam sua alma.

Fazia tempo que não ia a igreja, era um católico inativo, após tudo o que havia acontecido na sua vida, a igreja e a fé tinham perdido um pouco de sentido.

Carlos Nougué percebe que já passara da hora, enquanto o jovem já havia voltado a seu âmago, então se levantara e deixando uma lição – A alma se conhece pelos seus atos, de Tomás de Aquino... Eu tenho de ir, espero encontrarmo-nos novamente, talvez em um momento melhor.

E seguiu rumo a faculdade.

[...]

Depois de um tempo, Ícaro voltara para casa, seus pensamentos ficaram reservados à conversa com Nougué. "Ir a igreja seria bom", talvez fosse pensar. Logo após abrir a porta da casa, sua filha Sofia grita de alegria ao ver seu pai de volta, pulando para os braços dele.

– Pai, como foi seu dia? Hoje fiquei brincando de pique-esconde com a babá Ariana Maria até cansar! – Com seu sorriso encantador, contava com muito animo seus feitos.

E então a babá aparece, já arrumada e pronta para despedir-se – Senhor Ícaro, sua filha se comportou, almoçou direitinho e fez a lição de casa já! –, ela é uma moça jovem e baixinha, bem comprometida, diferente da babá anterior que surpreendera sendo uma verdadeira delinquente. Já Ariana Maria conquistara a sua filha com pouquíssimo tempo.




– Ah, sabendo que iria chegar tarde, deixei comida o suficiente para que jantassem!