Garras-da-Justiça

Chaska começou a se dar conta das limitações que aquele lugar lhe impunha.

Não conseguia mais mudar de forma.

Teve que limpar sua cara enfiando-a num corpo de água e sacudindo o pêlo depois. Aquela floresta era estranha, e ele nunca estivera num lugar como aquele.

Rolando no barro, Garras-da-Justiça procurava se mesclar ao ambiente, mas os animais o evitavam, correndo para longe.

A movimentação que ele tinha visto anteriormente finalmente o alcançou, e ele viu humanos chegarem ao alcance de sua vista.

Eles diziam coisas, mas Chaska não entendia as palavras. Ele aprendera o idioma inglês, mas agora não se lembrava dele, e nem sabia dizer se aqueles sons eram dessa língua ou de outra diferente.

Os homens carregavam em suas mãos de primatas paus pretos com formatos estranhos, e seguravam-nos como armas enquanto o observavam.

Chaska não estava acostumado a fugir, mas sabia como fazê-lo.

Ele se embrenhou na floresta, afastando-se ao máximo de todos os sons humanos. Explorar a mata desconhecida não era difícil, mas ele se acostumara a mudar de forma instintivamente como os garous faziam, e a incapacidade de fazer isso era uma grande frustração.

Os animais menores daquele lugar eram mais esquivos e assustadiços que os que já conhecera e fugiam à menor visão dele. Os lobos eram temidos pelas presas, e os garous mais ainda, mas o que havia aqui era mais do que medo. O ciclo da vida, de caça e caçador, da cadeia alimentar, tudo aquilo parecia mais intenso ali.

Chaska conseguiu alcançar um pequeno recanto de árvores com galhos entrecruzados que forneciam uma boa sombra, onde finalmente pôde descansar.

Após algumas horas, a luz do sol diminuiu e a escuridão da noite predominou por todo o céu. Era a hora em que os lobos caçavam... mas faziam isso em matilha, não solitariamente.

Chaska percorreu os arredores da área da floresta onde tinha se abrigado, farejando as presas que existiam ali. 

Coelho. Esquilo. Rato. 

Os cheiros eram familiares e inconfundíveis. Ele poderia rastreá-los durante minutos ou horas, mas alcançaria sua presa mais cedo ou mais tarde. Também poderia procurar por veados ou alces, mas sem uma alcateia e sem poder mudar de forma seria muito difícil abater presas tão grandes e ele poderia mesmo correr o risco de cair em batalha.

Enquanto ainda estava ponderando qual presa ele optaria por perseguir, um raio de luz varreu as árvores próximas, um facho luminoso que não poderia ser natural. 

E os únicos que usavam coisas artificiais de todos os tipos eram os humanos.

Chaska Garras-da-Justiça, em sua obrigatória forma lupina, decidiu fazer o que podia para agir, dentro de suas limitações.

Evitando ficar muito perto dos fachos de luz, ele procurou seguir os humanos que controlavam a luz, para descobrir o que eles pretendiam fazer.

Muitos dos animais fugiam dos humanos, e por isso os homens moviam-se no maior silêncio possível para suas formas humanoides com patas falsas e pesos de couro. O esforço dos caçadores logo compensou, pois com seus paus que cuspiam fogo, eles podiam atacar suas presas de distâncias muito longas, quase no mesmo momento que os avistavam.

Em dado momento, Chaska ouviu um uivo. Um uivo de lobo, quase um ganido, mas certamente era um som produzido por lobos. Os humanos gritaram algo que ele não entendia (ele aprendera algumas palavras dos humanos, mas não conseguia lembrar-se de nenhuma agora). Os outros caçadores humanos correram naquela direção, levando seus raios de luz. Chaska os seguiu a uma distância segura.

Num trecho entre as árvores, eles tinham se reunido ao redor de um corpo quadrúpede caído. Era o corpo de um lobo, inerte como que morto, mas quase não havia sangue nele. Um estranho pássaro parecia tê-lo bicado, mas era um pássaro falso, criado pelos homens. 

OS caçadores estavam preparando o corpo para carregá-lo para fora da floresta. Parecia que não iam caçar mais.