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    Mitos e Lendas

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    Mensagem por Mandhros Sex Nov 10, 2023 11:21 am

    A Lenda da Criação de Tudo

    1. A Gênese Divina

    No princípio, havia o Nada. O Nada era escuro e frio. Era quieto. No Nada, nada havia.

    Cansado de ser Nada, o Nada desenvolveu Vontade, ainda que Vontade não soubesse que era Vontade. A partir daí, no Nada já não havia apenas nada, pois ali também estava Vontade.

    Com Vontade, Desejos passaram a se multiplicar, ainda que não soubessem que eram Desejos. E o primeiro Desejo, a primeira Magia, nascida de uma Vontade surgida a partir do Nada, tomou conciência.

    No Nada, agora havia Vontade e Desejos.

    Vontade não tinha consciência de si, e o Nada permanecia sendo Nada. Mas o primeiro Desejo, Magia, queria mais de si, e da Vontade.

    Do Nada, Magia quis luz e, com uma explosão magnífica, criou o Espaço e o Tempo.

    O Espaço se espalhava continuamente pelo Nada, salpícado de fagulhas de luz, que eram estrelas nascentes. Elas estouravam e ardiam, pequenos brilhos quentes espalhando sua influência enquanto o Tempo contava sua história e via as maiores estrelas, impregnadas de Desejo, dragarem tudo para si e explodirem em outras maiores.

    A aceleração do Espaço aumentava, e Tempo observava.

    Magia ficou maravilhada com o que tinha feito! Como era belo o Espaço, agora não mais frio e estagnado como era o Nada! Estrelas eferveciam, torciam o Espaço ao redor delas e explodiam em outras menores, em um padrão de repetição caótico!

    Era lindo!

    Magia queria ver! E, assim, imaginou ter olhos, e duas estrelas estouraram, lançando luz ao Espaço e permitindo que Magia visse tudo e soubesse de tudo no infinito!

    E, depois de um instante (ou uma eternidade, já que Tempo ainda era jovem e indeciso nessa época), Magia resolver olhar para si. E, em si, Magia viu Nada e Vontade. Magia viu Desejo, mas não viu forma.

    Querendo ter forma, Magia pensou e desejou tocar os confins do infinito, e assim surgiram-lhe mãos e dedos!

    Também desejou poder estar presente no Espaço mais distante, e assim imaginou pernas e pés!

    Maravilhada com a forma recém adquirida, Magia olhou a redor. Havia Espaço e Tempo no Nada. Havia estrelas e luz. E havia Desejos.

    Pela primeira vez, Magia se sentiu sozinha. Não era justo que apenas ela pudesse ver aquele Universo nascendo.

    E, ao pensar no que seria justo, tocou outro Desejo com suas mãos e dedos. Parte da consciência de Magia se espalhou para o outro Desejo, junto com o pensamento.

    O outro Desejo desenvolveu braços e pernas iguais, simétricos, e olhos também.

    Magia ficou supresa, e se maravilhou mais uma vez! Como queria poder compartilhar tanta alegria com o outro Desejo!

    E assim, da Vontade que habitava em Magia, criou uma boca! E, com ela, as primeiras palavras!

    O outro desejo quis entender o que era comunicado, de sua Vontade foram criados os primeiros ouvidos. Criou dois, iguais, como os olhos, para que pudesse ouvir melhor. Mas queria também, responder a Magia, e assim criou a segunda boca.

    No primeiro diálogo do Universo, Magia chamou seu irmão de Petrus. Ele era Pedra, Princípio. Já Petrus chamou Magia de Mercius, Magia e Misericórdia.

    Mercius, então, passou a vislumbrar a criação, não apenas com olhos, mas com ouvidos e toques. E imaginou cheiros, e desenvolveu narizes!

    Já Petrus postou-se ao lado de Tempo, e passou a ordenar e ajustar o caos, criando regras e leis, por eras, como Tempo denominou.

    Mas Mercius começou a se sentir sozinho. Petrus não lhe dava atenção, ocupado que estava em sua tarefa. Então o Primeiro Desejo decidiu tocar outro dos Desejos originais. E, ao fazer isso, Mercius imaginou um Amigo.

    O novo Desejo passou a se reformar. Trazia consigo uma Vontade única que tornou seu tronco grande e largo. Também tinha braços e pernas, mas eram mais curtos e fortes, já que um amigo era alguém para se ter perto.

    Embaixo de suas narinas e bocas, cresceu uma grande barba, quente e acolhedora. Mercius pensou em um nome para chamar o seu Desejo Amigo e, na língua divina que tinha inventado, nomeou-o Inerill, a Vontade Interior, a Vontade do Coração.

    Inerill era carinhoso e divertido, mas também ranzinza de vez em quando. Começou a socar e chutar as estrelas que Petrus ordenara com tanta perfeição, só porque gostava do barulho!

    Pensando nisso, achou que suas mãos e pé não eram suficientes para realizar seu trabalho com perfeição. Então, Inerill quis ter uma ferramenta, e do Nada criou seu Martelo! Ele batia nas estrelas com o Martelo até que elas soltassem faíscas!

    Quando essas faíscas esfriavam, viravam pequenas bolotas de pedra ou gás.

    Mercius, ao apreciar a cena, achou aquilo formidável!

    Olhos para todas as faíscas criadas até então e procurou a maior e mais bonita delas. Era uma pedrinha ainda em brasa, perto de duas estrelas que, depois da martelada de Inerill, dançavam uma com a outra.

    E aquela pequena faísca, aquela pedrinha, intrigou Mercius, de alguma forma. Algo começou a crescer em seu ser por casa dequele mundo tão pequenino.

    Mercius o chamou Primórdio, o Primeiro dos Mundos.

    Então, pensou no que fazer com ele.

    Por muito tempo, ficou matutando. De tão pequeno, o Primórdio não poderia abrir outros Desejos não seria uma casa para eles como era o Espaço no Nada.

    Confuso, foi conversar com Petrus, e ouviu que, se Mercius queria criar algo que durasse, deveria fazer com equilíbrio.

    Foi então falar com Inerill, que mencionou que os bons resultados tinham que vir com muito esforço e dedicação.

    Mercius se afastou dos dois, e foi até onde estavam os outros desejos.

    Ele quis muito que o Primórdio pudesse ser habitado por seres como os desejos, mas menores, mais numerosos e felizes.

    Com isso em mente, tocou outro Desejo e ele imediatamente desabrochou como uma flor e um sol. Ele não teve dificuldade em tomar forma, mas era diferente de Mercius. Não esperou ser batizado, chamou-se desde logo de Sune. Levada até o Primórdio, Sune sorriu e soprou a pedra em brasa, fazendo com que ela esfriasse e sobre ela brotasse todo tipo de floresta e bosque! O crescimento era rápido e desordenado, e pequenas criaturas surgiram. Mas Mercius não achava que se pareciam com os Desejos.

    Havia lugares, entretanto, que essas criaturinhas primordiais não consguiam alcançar, porque ainda eram muito quentes, cheios de fogo.

    Mercius pensou.

    Outra vez, foi até os Desejos e, lá, tocou outro deles, desejando que o fogo se detivesse para que o Primórdio pudesse prosperar. Uma bolha de água respondeu ao chamado do Primeiro Desejo, e recebeu o nome de Ackuous.

    Chamado ao mundo recém-nascido, Ackuous derramou parte de si nele, reduzindo as chamas a alguns poucos pontos, e cobrindo toda a superfície mais baixa daquele mundo.

    Mercius olhava para a pequena criação, mas sentia que ainda escapava algo.

    Tocou um dos Desejos com vontade de Aventura, e outro com desejo de Mudança.

    Aventura inspirou-se na forma de Mercius, mas tinha um grande chapéu de abas largas e falava de forma engraçada, com ritmo e melodia. Identificou-se como Yaba, o Viajante.

    Mudança, por sua vez, não assumiu uma forma, mas muitas! Parecia não se decidir nunca! Na língua primordial, Mercius chamou-a Crisalis, a sempre mutante.

    Apresentados ao Primórdio, Yaba cantou a primeira canção, e ventos varreram aquela criação. Embora Yaba não fosse magia, sua música carregava um pouco de magia em si mesma.

    Já Crisalis, ainda sem forma, tocou o Primórdio. E nada, nunca mais, seria o mesmo. Os minúsculos seres que viviam no novo mundo passaram a alterar e migrar pelo globo.

    Aquela mistura não podia dar certo, todavia. Ela crescia sem parar, e ocupava cada vez mais Espaço, até que Nada restasse.

    Mercius ponderou sobre as palavras de Petrus, de que precisava haver equilíbrio.

    Com isso em mente, foi até os dois Desejos restantes.

    Imaginando uma forma de equilibrar a vida, em uma maneira de libertar a energia, ele pensou em Morte pela primeira vez, e tocou um dos Desejos.

    Quando o Desejo tocado com essa intenção assumiu forma, era uma Mortalha, que roubava a luz do Espaço, apagando estrelas para que outras pudessem ocupar seu lugar. Ao seu redor, o Universo esfriava e parava. Ele era uma Sombra com uma grande foice. Não precisou ser nominado. Ele se chamava Mandhros, o fim.

    A Sombra foi até o Primórdio sem ser convidada e, para o horror de Mercius, tocou o novo mundo.

    Onde antes tudo crescia de forma desordenada, agora algo morria em contrapartida. Mandhros não conseguia, sozinho, contrabalançar toda a criação, que tinha a vontade de vida de Mercius e de Sune, juntas, como combustível.

    Então, Magia foi até o último Desejo. Com pesar, pensou em uma maneira de espalhar morte o suficiente para balancear as coisas, e apenas para isso.

    O último Desejo se chamava Belliard e não respondeu de imediato. Se transmudou em um bloco de metal com braços e pernas, com chifres e espinhos, com coisas pontiagudas e que machucavam, e flutuou até o Primórdio, tocando-o. As criaturas começaram a lutar entre si para determinar qual era a mais forte. Matavam e se alimentavam umas das outras na mesma velocidade em que nasciam e cresciam.

    O Primórdio, finalmente, estava pronto.

    2. O alvorecer das raças

    Mercius queria mais.

    Sua ideia original, de povoar o Primórdio com pequenas versões de si, começou a se encher em seu íntimo. Consultando a cada um dos outros Desejos, Magia concluiu que seus filhos necessitavam ser fortes e belos como era o universo em seus primeiros dias; precisavam conhecer e amar a justiça; deveriam ser bons amigos entre si; precisavam contar com o desejo de aventura e mudança; e deveriam ser aptos para sobreviver.

    Numa primeira tentativa, Mercius criou os primeiros dragões, insculpidos com a imagem das criaturas que antes viviam no Primórdio. Eles eram, todos, fortes e sábios, mas ainda eram poucos e não atendiam ao que Mercius desejava.
    Em uma segunda tentativa, Mercius ainda não conseguia se desprender do conceito original.

    Ele criou um povo mais numeroso e menos poderoso. Era répteis e ofícios antropomórficos, também fortes e sábios, os Norfss.

    Mas ainda não foram feitos à imagem dos Desejos.

    Os dragões se retiraram para os locais mais ermos, contemplando a criação e agindo com sabedoria, enquanto os Norfss prosperaram nos lugares mais quentes do Primórdio, criando civilizações inteiras!

    Mas não era o suficiente.

    Mercius meditou e lançou sobre o mundo uma fração de si, um desejo genuíno de perfeição. Assim foram criados os elfos, que se espalharam e viveram em harmonia com os Norfss, dragões e com o mundo recém criado.

    Inerill, então, consultou Mercius. Assim como seu irmão mais velho, ele também queria criar um povo à sua própria imagem, um reflexo de seu próprio Desejo. Mercius jamais negaria o pedido ao amigo.

    Assim, Inerill tocou uma montanha e, em seu interior, foram gerados os primeiros anões, fortes e leais.

    Yaba, por sua vez, disse que achava que os elfos imortais e os anões do interior da montanha precisavam aprender sobre aventura e canção, sobre passar os conhecimentos de um para o outro. Assim, pediu para criar filhos que vivessem pouco, mas que fossem muito bons em contar as histórias uns dos outros.

    Mercius se perguntou por que não, e os primeiros humanos pisaram no primórdio.

    Logo depois, Crisalis pensou em lançar filhos na terra também, mas não conseguia se decidir! Ela, aleatoriamente, pegou uma das feras que existia no mundo, um grande gato, e, olhando para os recém criados homens, quis que ficassem parecidos.

    Os ferlix, então, foram criados.

    Ackuous argumentou que a maior parte do Primórdio era coberta de parte de si, e Mercius permitiu, em reconhecimento, que alguns dos elfos migrassem para o mar e passassem a viver lá.

    Por fim, Belliard, o mais jovem, disse que pretendia criar guerreiros poderosos, que pudessem viver nas regiões mais difícieis e vencer todas as adversidades. Por sua vontade e com o consentimento de Mercius, nasceram os Orcs, Ogros, Goblins de Trolls.

    Mandhros, por sua vez, não quis criar nada. Ele acreditou que havia muita vida no Primórdio, e se enciumou, acreditando ter um papel menor.

    3. A primeira Guerra e a Punição de Belliard

    Mandhros era ardiloso. Ao invés de simplesmente se recolher, ele passou a notar que os Desejos se fortaleciam com a prosperidade de suas próprias obras. Logo, se houvesse muita morte no Primórdio, o próprio Mandhros se abasteceria disso.

    Com isso em mente, provocou Belliard, dizendo que seus filhos não eram tão fortes, e que não poderiam competir, em pé de igualdade, com qualquer das outras raças. Guerra, furioso e imprudente, através de seu sumo-sacerdote, reuniou seus filhos sob uma única bandeira. Agora eles eram Urgrosh, e despejariam a fúria da guerra sobre o Primórdio.

    Como Mandhros tinha calculado, Belliard passou a se alimentar do conflito, pouco importando se seus filhos venciam as batalhas ou não. Isso o colocou em conflito com os outros desejos, uma contenda que nenhum deles, isolado - nem mesmo Mercius - poderia vencer.

    Mortalha disse que tinha a solução, mas que para apresentá-la queria poder tocar alguns individuos de cada raça, criando para si um pequeno grupo de mortos-vivos. Sem saída, os Desejos aceitaram.
    Morte, então, sugeriu que os outros Desejos se unissem contra Belliard e o esquartejassem, separando seus pedaços e espalhando-os pelo Primórdio. o que foi efetivamente feito.

    Belliard perdeu seus status divino e foi esquecido durante muito tempo. O que nenhum dos outros Desejos poderia prever (exceto, talvez, por Mandhros) é que espalhar Belliard pelo Primórdio era o mesmo que espalhar Guerra no mundo. Os conflitos tornaram-se constantes entre todas as raças, que se aliavam e guerreavam umas com as outras. E, em que pese o poder de Belliard estivesse contido, o de Mandhros apenas crescia com cada alma perdida na luta interminável.
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    Mensagem por Mandhros Sex Nov 10, 2023 11:53 am

    O Panteão Primordial

    Aestus - Deus dos Mares e da Água

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    Cores: Azul e Verde.

    Símbolo: Um tubarão mordendo um tridente.

    Outros Nomes: “O Grande Azul” (Norfss e alguns povos de pescadores), “O Grande Tubarão” (Urgrosh), “Elemental das Águas” (Ferlix e Elfos), “O Grande Tridente” (Anões), "O Grande Khellus"

    Personalidade: Aestus é um deus calmo e contemplativo, possuidor de grande sabedoria e paciência, contudo também é extremamente violento quando irritado.

    Relações: Aestus evita se intrometer nos assuntos alheios como, também, não gosta de intromissões dos outros deuses em seus assuntos. Devido a um acordo com Mercius ele possui uma casta élfica sob seu acolhimento, os elfos-do-mar, estes também sendo imortais como os elfos terrestres.

    Seu contanto com os outros deuses costuma ser pouco, embora ocasionalmente ocorra. Desse modo ele se mostra neutro e alheio aos outros deuses. Muitas vezes devido a isso ele não participa de qualquer decisão do restante do Panteão, mas não gosta que outras divindades façam algo que interfira em seus domínios.

    Descrição dos Seguidores: Todos os sacerdotes de Ackous devem mostrar-se pacientes e sábios, contemplativos e pacíficos, evitando combates desnecessários. Contudo, quando uma luta se mostrar inevitável, devem agir com bravura e lutar até a vitória se mostrar impossível.

    Os sacerdotes de Aestus podem ser de qualquer raça, embora o maior número esteja entre os elfos-do-mar e os habitantes de vilas e cidades costeiras, ilhas ou próximas a rios e lagos.

    Entretanto, podem existir sacerdotes de Aestus em todos os lugares. Qualquer corpo d'água compõe seus domínios.

    Sumo-Sacerdote: Dasgus Itninvill, um elfo-do-mar de pele azul esverdeada, com cabelos negros, olhos cinzentos e um porte físico invejável. É considerada a criatura mais temível existente no Primórdio quando luta dentro d'água. Contudo, é um ser extremamente pacífico e sábio, sendo incrivelmente paciente. No entanto, quando sua paciência acaba – e ela às vezes acaba – ele demonstra fúria sem igual. Apesar de ser um sacerdote seu poder de combate é extremamente alto.

    O templo onde reside se encontra escondido no fundo do mar, entre o Continente Amarelo e o Continente Branco, e somente aqueles realmente dignos conseguem alguma vez entrar lá.

    Quando tal coisa ocorre geralmente um avatar de Aestus também aparece para saudar o escolhido.


    Belliard - Deus da Guerra e do Fogo

    Mitos e Lendas _8f5f410

    O silêncio é cortado apenas pelo uivo do vento e pelo urro do vencedor daquela batalha, que tinha sido a maior entre as maiores. O deus da guerra nunca se entregaria, nunca desistiria de uma batalha, mesmo que fosse contra o poderoso Petrus.

    O deus da justiça se recompõe, enquanto a pena de Belliard é finalmente imposta. Seu corpo, antes o do mais formidável e temível senhor da guerra, agora jazia em pedaços, espalhado pelo Primórdio com a forma de peças de uma armadura completa.

    Um triste fim... Ou não?

    Belliard é o senhor máximo da guerra, conflito e destruição. Como o fogo que se abate sobre os campos durante as épocas secas, ele devasta, queima e marca. Por lançar a maldição da guerra sobre o Primórdio, colocando povo contra povo, Belliard foi desafiado, derrotado e apenado por Petrus. Seu destino se tornou uma lenda, bem como a profecia de seu retorno ao poder máximo.

    Belliard atende por vários nomes, que geralmente são entoados como uma canção de guerra terrível de se ouvir. Dizem que simples menção de seu nome (em todas as suas variantes) é capaz de trazer tremor ao mais intrépido dos guerreiros. Interessante é a forma como os altos magos elfos costumam chamá-lo: "Dominus Belli", ou, em idioma comum, "Aquele que domina a Guerra". Há rumores de que a maldição da guerra lançada sobre o Primórdio teria o nome de Belli.

    A marca de Belliard é composta por uma espada bastarda e um grande machado cruzados, emoldurados por um escudo vermelho como o fogo. Essa era uma imagem bastante comum em muitos dos pavilhões de guerra das eras passadas.
    Belliard não é um deus bom ou mau. Como exímio guerreiro que é, mostra-se como um adorador do conflito e da emoção da batalha. Para tanto, pode auxiliar povos bons ou maus, justos ou opressores, desde que sejam belicosos.

    Seus seguidores costumam ser os maiores destaques em uma ação de campo de batalha.

    Sejam guerreiros imensos derrubando dezenas de oponentes e clamando por mais, sejam magos estrategistas ou clérigos invocadores de fogo, todos - sem exceções - são armas (afiadas) forjadas para a guerra.

    Bondoso ou maligno, ordeiro ou caótico, justo ou injusto, todo e qualquer ser que pedisse auxílio a ele em favor de uma batalha teria seu pedido atendido. O caos se espalharia rapidamente pelas terras, e nascia uma era de conflitos intermináveis. Nascia a Era de Belliard...

    Cores: Vermelho.

    Símbolo: Uma espada bastarda e um grande machado cruzados, emoldurados por um escudo vermelho.

    Outros nomes: "Grande Senhor da Guerra" (Entre Urgroshs), "O Guerreiro" (Entre os anões), "Consumidor da Natureza" (Entre druidas e alguns férlix), "Dominus Belli" (entre os elfos).

    Personalidade: Alguns poderiam definir este deus como um guerreiro enlouquecido, um viciado pelo calor da batalha. O que Belliard mais preza é a eterna guerra, que esmaga os fracos e faz ascender aos poderosos, apenas para que o processo se repita. Em seu entendimento distorcido, o deus considera que deste movimento emergirá o guerreiro que o desafiará e lutará contra ele pela eternidade. Até mesmo por esta razão, o Deus da Guerra costumava tomar parte das batalhas, observando esperançoso a fim de que alguém se destacasse tanto quanto ele.

    Relações: Desde que sofreu sua penalidade, Belliard não guarda relações com qualquer dos deuses, e se ressente de todos, desejando trazer apenas a detruição a toda a obra do resto do Panteão.

    Descrição dos seguidores: Guerreiros. Não no sentido próprio da palavra, mas no mais abrangente possível. Todos os seguidores de Belliard estão, de alguma forma, ligados à guerra e ao conflito. Sejam lutadores imensos ou arcanos estrategistas, todos encontram aceitação entre os seguidores da guerra.

    Sumo-sacerdote: Quando Belliard foi apenado, seu culto deixou de ter um líder. Na prática, cada um dos seus (poucos) clérigos atua trazendo a guerra consigo, e isso já basta.

    Entretanto, reza a lenda que, no dia em que o deus retomar seu status de direito, um lendário sumo-sacerdote tocará o Primórdio: envolto em fogo, ele espalhará o caos e a destruição apenas com a sua presença...


    Crisalis - Deusa da Mudança

    Mitos e Lendas _adbd410

    No começo a palavra era: CAOS! Mercius em toda sua criação não estabelecia leis, não gerava ordem nem lógica. Mercius simplesmente criava. Mas até mesmo em seu vasto poder e supremacia Ele teve que assistir enquanto as coisas mudavam, como um espelho que invertia tudo que Ele havia criado, Mercius presenciou o nascimento de Petrus, que com sua eterna e metódica ordem e justiça organizou a Criação.

    Assim se estabeleceu o Primórdio. Com leis, regras, ordem...Ou quase isso... Raças, culturas, diferenças, liberdade ou a falta dela... Onde há diferença há oposição, onde há oposição, há guerra! O nascimento de Belliard foi o ápice de Mandhros, a guerra e o sangue não só satisfaziam o Deus da Guerra como também enchiam as terras do Deus da Morte. E nesse conjunto sombrio e caótico houve a mudança da Ordem de Petrus para o Terror da Guerra e Morte!

    Mas tanto caos, matança e destruição desagradava à ordem e a justiça e num desafio mal pensando de Belliard à Petrus uma rajada do vento da mudança soprou. Derrotado e punido antes que levasse o Primórdio à destruição, Belliard foi dividido em vários pedaços... Pedaços de sua armadura que foram espalhados por Petrus pelo Primórdio. O mundo mudava mais uma vez... Mais uma vez o mundo muda de novo e de novo, do caos para a ordem, da ordem para o caos!

    Raças em guerra que mergulham em paz, paz que só dura até erguer-se a febril guerra instigada pela sede... de sangue! Ignorantes e insensíveis aos ventos da mudança, os mortais e outros Deuses assistem enquanto a escravidão vira liberdade, enquanto o animal evoluí e o ser retorna à bestialidade. Tão irritante quanto as risadas do Destino em sua cara, tão mutável quanto as ondas do mar de Ackous, tão aclamada e depois mandada de volta quanto os desejos que são corrompidos... A mudança! E enquanto o mundo é jogado de um lado para o outro, virado de ponta cabeça e depois atirado de volta ao chão apenas dois Deuses tão antigos quanto a mudança ouviam o nome acompanhado do vento: Crisalis.

    Do bom para o mal, do caos para a ordem, do livre para o preso, do errado para o certo, da paz para a guerra, do triste para o feliz, do emocional para o racional, do dia para a noite e tudo isso vice e versa! Sob os caprichos de uma Deusa ambígua e inconstante, sob o sopro dos ventos da mudança está todo o Primórdio. Pois tão certo quanto a Criação está envolta em ordem e caos tudo está em constante movimento e mudança, tudo está sob o sopro de Crisalis.

    “Todo ser nasce capaz de tudo, são as ações e reações que levam para um de dois extremos... Assim como nasceu capaz do que quer que fosse, vive capaz de mudar para o que quer que seja...”

    Cores: Violeta e Amarelo.

    Símbolo: Duas máscaras bipartidas ligadas (Uma no rosto e outra na nuca, ligadas pelo lado).

    Outros nomes: "A Mudança", "A Troca", "Parvaneh" (entre alguns druidas e ferlix).

    Personalidade: Crisalis não possuí uma única personalidade bem contruída. Seu ego é formado de quatro arquetipos que se interrelacionam e se sobrepõem (Ira, Mágoa, Alegria e Serenidade). Mais emocional do que racional possuí uma natureza caótica e inconstante. É tanto boa quanto má.

    Os arquetipos:

    Ira: Nervosa, má e sanguinária. Metade da máscara que demonstra raiva.

    Mágoa: Triste, egoísta e pessimista. Metade da máscara que demonstra tristeza.

    Alegria: Gentil, otimista e inspiradora. Metade da máscara que demonstra felicidade.

    Serenidade: Calculista, racional e despreocupada. Metade da máscara que não demonstra nada.

    Relações: Crisalis, apesar de sempre estar entre Mercius e Petrus devido a sua natureza caótica, quase sempre tende a rivalizar com Petrus desordenando o que este organiza. Devido ao seus vários arquetipos de personalidade, uma hora ou outra acaba concordando com todos os deuses, mas nunca simultaneamente. Uma de suas rixas mais comuns é com Mandhros, visto que a morte é sempre a morte e algo tão imutável deixa a Deusa frustrada.

    Descrição dos seguidores: Os seguidores de Crisalis se apresentam nas mais diversas raças e tendências. Entretanto a Deusa é particularmente apreciada entre os artistas e os ferlix, os último principalmente pela grande mudança de escravos para raça livres. Entre alguns bardos e dançarinas há pequenas lendas como, por exemplo, os bardos que a desagradam terão sua voz transformada em coaxo e as dançarinas seus membros em pedra para que não possam mais dançar. Mas todos compartilham uma mesma filosofia: "nos ouça quando as coisas estiverem ruins, mas nos ignore quando estiver tudo bem!"

    Sumo-sacerdote: Crisalis costumava ter quatro sacerdotes que eram sua versão de um sumo-sacerdote, pensando que a quantidade a faria não entediar-se, mas como sempre muda de opinião cansou-se deles e os transformou em máscaras, nunca mais tendo um sumo-sacerdote. Ao menos até agora.


    Inerill - Deus dos Anões

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    Cores: Marrom e dourado.

    Símbolo: Um martelo de forja e uma bigorna, inseridos em um escudo redondo dourado.

    Outros nomes: O Forjador, entre alguns povos do sul.

    Personalidade: Determinado, resoluto, fiel e cabeça dura, Inerill é o expoente máximo da média dos anões. É um deus leal às suas amizades e promessas, determinado em seus objetivos, e de um coração que é ultrapassado apenas pela barba, em tamanho.

    Relações: O Deus dos Anões tem boas relações com Petrus e Yaba, por gostar da personalidade deste e do caráter deles. Tem boas relações também com Mercius, apesar de considerá-lo estranho... E tenta evitar por completo Mandhros, Crisalis e Belliard, uma vez que não consegue entendê-los.

    Descrição dos seguidores: Todos os seguidores de Inerill são anões, sem exceção. Toda a raça venera seu deus criador, e o admira como exemplo daquilo que todo bom anão deveria ser. Alguns outros indivíduos, esporadicamente, dizem venerar Inerill mesmo não sendo anões.

    Os pequeninos os toleram, e mesmo se satisfazem com a situação, mas sabem que a verdadeira fé por este deus só existe no coração de um anão.

    Sumo-sacerdote: Andando com seu pesado martelo às costas, o velho Ghram'Tor passa dias e noites circulando pelo Palácio de Inerill, um suntuoso templo escavado sob o solo gélido do Continente Azul. Ali, o mais velho dos Tor mantém pelo menos um milhar de anões, sustentados com sabedoria e fé. Nem mesmo as incursões do General Graak foram capazes de sobrepujar as defesas que o próprio Inerill ensinou a Ghram, fato que apenas reforça a fé no Deus dos Anões.


    Mandhros - Deus dos Mortos e das Sombras

    Mitos e Lendas _3db7d10

    Uma figura sombria paira, movimentando-se rente ao chão. Seus pés - se é que tem pés - nada tocam, enquanto sua capa, uma mortalha negra e esfarrapada, balança ao sabor do negro vento da terra dos mortos. Para além daquela malha pútrida apenas um brilho verde onde deveriam ficar os olhos, surgindo sob a absoluta sombra lançada por um capuz mórbido.

    Nas mãos ossudas e decompostas, Nihil, a foice que um dia ainda ceifaria todas as vidas do Primórdio...

    Mandhros é o Deus dos mortos, o arauto do fim. Possui tantos outros nomes entre os vários povos, que seria impossível listá-los. Em geral, é invocado como uma praga pelos coléricos, ou em desafio, pelos destemidos.

    Seu símbolo é uma nuvem cinza chumbo. É uma marca que gera muitas controvérsias - os povos em geral julgam que Mandhros seria um demônio, e a nuvem é uma imagem que remete ao céu. Talvez o Deus se delicie com essa confusão, e prefira a imagem justamente por essa razão.

    O temperamento do Deus dos Mortos é "frio como a morte". Mandhros é uma entidade calculista, que tem o hábito de traçar planos rocambolescos - porém geniais - para atingir seus fins. Fins estes que nem sempre são alvo da compreensão do povo do Primórdio - o deus pode salvar um povo em determinado momento apenas para dizimá-lo pouco depois.

    Os devotos deste deus tendem a ser as piores pessoas da face do Primórdio. São, em geral, sacerdotes da morte, que realizam sacrifícios humanóides para a divindade cruel. Entretanto, há excessões... Excessões tão raras quanto pérolas negras...

    Cores: Negro e Cinza Chumbo.

    Símbolo: Uma nuvem cinza chumbo.

    Outros Nomes: “Senhor dos Mortos”, entre humanos e algumas tribos bárbaras; “Wath”, entre os elfos e altos magos; “O Rei Sombra”, entre os anões; “Senhor do Escuro”, entre os Urgrosh e Norfss.

    Personalidade: Mandhros é um deus frio, calculista, e extremamente calmo. Quaisquer que sejam seus planos, seus movimentos e suas ações, elas são fruto de deliberações demoradas.

    Este é também um Deus implacável e impiedoso. Jamais concede uma segunda chance – a não ser que isso se enquadre em seus propósitos sombrios de alguma forma. Tem um ar manipulador, e pode apresentar-se de forma amável ou bruta, dependendo das circunstâncias.

    Relações: Mandhros pode ser o melhor aliado ou o inimigo mais implacável de qualquer um dos deuses - e mortais. Tudo depende das circunstâncias e do que o Rei dos Mortos deseja. Seus planos obscuros e esse comportamento acabam tornando-o um deus que sofre a desconfiança de todos os outros, mas que é poderoso demais para ser ignorado ou para ter uma oferta de auxílio negada. O mais inflexível com relação a essas atitudes é Petrus, obviamente. Os dois tendem a passar a maior parte do tempo sem qualquer contato. Todavia, há uma lenda que conta que os dois deuses disputam um xadrez cósmico pelo destino de toda a criação, com lances aqui e ali que causam catástrofes ou salvam civilizações inteiras.

    Descrição dos Seguidores: O Deus dos Mortos conta basicamente com duas espécies de seguidores. A primeira é composta por criaturas que estudam, veneram ou demonstram um interesse prolongado pela morte, de alguma forma. Sendo assim, Mandhros é conhecido também como o patrono dos necromantes e de alguns clérigos, sejam eles bons ou maus. No fim, todos acabam servindo aos propósitos do Deus. A segunda espécie compõe-se de seres que desejam poder a qualquer preço, ou que querem realizar um objetivo sem medir as conseqüências. O Rei Sombra fica feliz em oferecer poder em largas quantidades a todo aquele que se dedicar a seu serviço. Mas, no fim das contas, sempre cobra um preço alto.

    Muito mais alto que o favor oferecido...

    Sumo Sacerdote: Em noites de tempestade, costuma vagar pelas sombras uma criatura conhecida como Argan. Em seus tempos de vivo, talvez tivesse sido um humano ou mesmo um elfo. Agora, contudo, apresenta-se como o mais poderoso lich do Primórdio. Suas magias tem o poder de aniquilar continentes inteiros, e seus planos se estendem por muitas vidas humanas. No entanto, raramente esta poderosíssima criatura faz demonstrações vãs de suas artes – assim como seu Deus (e mestre), Argan sabe o momento de esperar para obter o que quer. E sabe manter seus planos ocultos, ao menos até ser tarde demais. Com tamanho poder, sua aparência acaba se tornando algo insignificante – ele pode tomar a forma que desejar quando bem entender.


    Mercius - Deus da Magia e do Ar

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    Cores: Vermelho e Prata.

    Símbolo: Um globo, ora prateado, ora vermelho, ora com as duas cores em proporções indistinguíveis.

    Outros nomes: O Uno; O Criador; Deus dos Deuses.

    Personalidade: A personalidade de Mercius é absolutamente imperscrutável. Como o criador de todas as coisas - inclusive da personalidade - nem mesmo os deuses conseguem entender o que é Mercius. Sabe-se que por alguma razão ele cria - e cria muitas coisas - mas seus pensamentos, sensações e anseios estão muito além da compreensão mortal - ou imortal.

    Relações: O Deus da Magia é, na prática, criador de todos os Deuses. Em geral, ele evita ao máximo interferir em qualquer tipo de relação com os demais membros do Panteão, talvez por saber que seu poder supremo sempre faria a balança pender a seu favor. Mercius cria, e observa sua criação enquanto continua a criar.

    Descrição dos seguidores: Os seguidores de Mercius são as pessoas mais diversas do Primórdio. Entre eles há magos poderosos, camponeses indefesos e mesmo monstros e outros seres menos convencionais. Seu culto é o maior e menos unificado de todos. Aqueles realmente exclarecidos em relação ao deus - tanto quanto isso seja possível - afirmam que todas as entidades vivas ou não veneram a Mercius, nem que seja por via indireta: "Se Mercius criou os deuses e os deuses têm seguidores, então os seguidores dos outros deuses seguem a Mercius." Essa é uma explicação plausível para o poder mais-que-infinito deste Deus.

    Sumo-sacerdote: Não há. O culto direto a Mercius e muito pouco coeso para que haja um.


    Petrus - Deus da Justiça e da Terra

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    Além dos desejos mortais, ao mesmo tempo acima e ao lado de todas as criaturas - e mesmo seus criadores - jaz a figura mais imponente de todo o Primórdio. Uma estátua de pedra, sólida, perfeitamente acomodada em seu trono rústico. Um cavaleiro de armadura, um proteção absolutamente lisa e impecável, cujo único desenho é uma balança dourada: de um lado, a luz tão forte como a do sol; do outro, a mais negra escuridão. Petrus, mesmo tendo apenas órbitas vazias onde deveriam estar os seus olhos, leva sua atenção a cada ato de injustiça que ocorre no mundo. E aqueles que provocam sua ira acabam vítima de Jus, a formidável espada longa que sempre adorna a mão direita do deus.

    Petrus é o Deus da Justiça e dos justos. Sua neutralidade e perfeito arbítrio são lendários, assim como a fúria despejada contra aqueles que recusam a ordem. Petrus possui uma peculiaridade interessante: todos os povos o chamam pelo nome correto. Isso se deve ao fato de o deus despertar a idéia de que a justiça e o duro caminho dos justos são unos em si mesmos.

    O símbolo de Petrus é uma balança dourada, contendo, em um dos pratos, um sol, e, no outro, uma caveira. Este símbolo, em especial, tende a mudar de cultura para cultura, e de raça para raça. A única característica alterada é a forma da caveira - que assume caracterísiticas do povo em questão.

    Petrus é um deus absolutamente calmo e controlado. Tem uma paciência tremenda para ouvir histórias, especialmente quando há partes em conflito. A própria idéia de justiça emana do temperamento do deus, tamanha a sua imparcialidade. Dizem que Petrus arrancou os próprios olhos para que jamais fosse capaz de ver aqueles a quem julgava. Dizem também que os olhos de Petrus são a mais poderosa relíquia do Primórdio...

    Seus devotos tendem a assumir posições de magistratura ou próximas a esta, e normalmente, são as pessoas mais justas da face do Primórdio. Entretanto há exceções - que quando descobertas são punidas com um vigor que assusta até mesmo os seguidores de Belliard e Mandhros.

    Cores: Preto e Dourado.

    Símbolo: Uma balança dourada, contendo, em um dos pratos, um crânio e no outro um sol.

    Outros nomes: Não há. O culto a Petrus é tão organizado e unificado que todos os povos conhecem o deus pelo seu nome original. Muito raramente seus sacerdotes se referem a ele pela alcunha de "O Supremo Juiz dos Deuses".

    Personalidade: Petrus é o expoente máximo da ordem e da justiça. Não se pode dizer com certeza que seja um deus bom, mas como as criaturas boas tendem a ser mais justas em relação às más, Petrus normalmente protege aqueles de tendência benigna.

    Relações: Este deus é absolutamente metódico e organizado, motivo pelo qual conflita com Crisalis - apesar de alguns dizerem que ele seria filho, ou talvez amante da Deusa - e afrontaria Mercius, se tivesse poder para tanto. Na prática, é Petrus o detentor da palavra final com relação a qualquer conflito que haja entre os deuses - mesmo que o próprio deus da justiça esteja envolvido. Sua imparcialidade e seu senso de justiça são tão grandes que isso o impede de favorecer a si próprio.

    Descrição dos seguidores: Todos os seguidores de Petrus, sem exceção, são defensores fervorosos da ordem e da justiça. Isso faz com que a maioria dos paladinos do Primórdio sejam seus devotos, e com que seus clérigos assumam freqüêntemente o cargo de magistrados entre os seus.

    Sumo-sacerdote: A cada sete anos um conselho da Ordem de Petrus se reúne para decidir os rumos da igreja da justiça e que ações serão tomadas no Primórdio. Isso também ocorre quando o cargo de sumo-sacerdote, líder deste conselho, fica vago, por qualquer razão que seja. É o que acontece neste momento...


    Yaba - Deus dos Humanos e dos Viajantes

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    Cores: Marrom e Branco.

    Símbolo: Um bordão de madeira escura, com a cor marrom que lembra o chão batido das trilhas silvestres. Na ponta, uma pedra preciosa que emite luz branca para guiar viajantes.

    Outros nomes: "Bardo", "Viajante".

    Personalidade: Um viajante. Yaba não aprecia regras muito fixas, e quase nunca se apega a algo específico. Adora longas conversas e boa música. Seus seguidores acreditam que a primeira melodia surgiu em uma oração.

    Relações: O deus viajante não implica com nenhum de seus companheiros. Ao contrário, ele é capaz de enxergar virtudes e defeitos em todos eles. O Bardo adora as conversas com Crisalis, as obras de Mercius, as discussões com Petrus, os jogos com Mandhros, os passeios com Ackuos e as brigas com Ineril. O relacionamento com Belliard também era "pacífico", antes de seu destino trágico.

    Descrição dos seguidores: Os seguidores de Yaba amam a vida acima de qualquer coisa. Seus paladinos evitam lutar, e possuem como principais inimigos criaturas que mancham a vida com a não-vida. Vampiros, zumbis e aqueles que cultuam e almejam a morte terão sempre inimigos formidáveis. Os clérigos de Yaba fazem um difícil voto de vida nômade, que serve para lembrá-los que, apesar de bela, a vida é fugaz e mutante. Logicamente, os bardos possuem Yaba como patrono, e os mais místicos acreditam na interferência constante do deus em assuntos terrenos.

    Sumo-sacerdote: A lenda diz que 3 grandes bardos se aproximaram tanto de Yaba que adquiriram parte de seu aspecto divino. Mas essa é uma outra história...
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    Mensagem por Mandhros Sex Nov 10, 2023 12:01 pm

    As relíquias dos deuses - parte 1

    O Tridente de Aestus

    Aquele era mais um dia de calmaria, já passava do meio da tarde e ele não pensava em nada além do balanço do mar, nunca entendeu essa história de barcos animados quando os que flutuavam eram tão mais divertidos, podia ficar de bobeira ouvindo Molly gritar para voltar pra praia, a garota acabava desistindo depois do décimo grito e ia embora batendo o pé e chutando a areia. Tudo que ele queria era relaxar, onde ele estava e não ter que ouvir ninguém o chamar de incompetente por desde que saiu da vila de manhã ainda não ter pescado nada.

    -Peixe... – Murmurou olhando o formato gordinho com nadadeiras de uma nuvem que encobria o sol – Nuvem de peixe...

    Seu nome? Não importava, todos os chamavam de Minhoca desde que tinha apenas 5 anos e não sabia a diferença entre o peixe e a isca, os motivos de tão destrambelhado apelido também não importavam. Se sentou no pequeno bote, foi dar uma olhada naquela coisa que ele espetou na ponta do barco e amarrando uma cordinha na ponta usava de vara de pescar.

    Como era o nome mesmo? Tridente? Era, isso mesmo... Fincou num dos banquinhos do bote e amarrou uma cordinha que jogou na água e estava esperando até agora algum peixe bem grande morder a isca, mas aparentemente nenhum quis nem saber do pão velho que ele pos na ponta da corda.

    -Bando de peixe chato... – Minhoca resmungou puxando a cordinha de dentro da água, o vai e vem das ondas não ajuda a equilibrar o pequeno barquinho, quando finalmente chegou no gancho viu que o pão tinha sumido. – Espertos! – comeram tudo e só deixaram a corda e o gancho.

    Uma sombra passou por debaixo da água e ele sabia ser um peixe, segurou no tridente e tentou soltar da madeira sem virar o barco, com alguma dificuldade conseguiu decidido a tentar ao contrário, ia acertar o peixe com aquele troço e puxar pela cordinha! Perfeito.

    Perfeito pra dar tudo errado, depois de arremessar o tridente visando acertar a sombra que se mexia debaixo da água Minhoca caiu do barco que virou, foi afundando e engolindo muita água até se enroscar em alguma coisa, as ondas o empurraram pra praia, tossindo como um louco todo enroscado e com a garganta e narinas ardendo da água salgada.

    -O pedaço de madeira estúpido! Quando eu te pegar você vai ver! – resmungava bravo com o tridente se remexendo numa rede que se enroscou em suas pernas já no raso. Puxava a cordinha em busca do tridente pra quebrar aquela vareta em três.

    -Quero ver pegar aquele barco agora! – era Molly, os cabelos loiros presos em duas tranças, as mãos na cintura fazendo cara de brava pensando que assustava alguém! O menina mandona!

    -A maré trás de volta depois... – Minhoca resmungou se desenroscando e colocando a rede e o graveto chamado de tridente debaixo do braço.

    -Trás? Criatura imbecil, a maré puxa e não empurra! – e lá foi Molly demonstrar dando um empurrão que o derrubou de costas no chão. – Vai buscar antes que vá longe demais!

    -E você quer que eu nade com o barco nas costas pra cá?

    -Pensa um pouco. Vai lá, desvira, sobe e vem remando. – a outra explicou impaciente.

    -O remo caiu, olha ele lá boiando longe! – apontava com preguiça.

    -Usa essa coisa ai então! – e ela apontou pro tridente depois saiu andando – E não se atrasa pra janta!

    -Faz isso... Faz aquilo! Não se atrasa...Oooo menina chata! – ficou sentado onde estava.

    Com um olhar na direção do barco cruzou os braços sobre as pernas dobradas, ficou encarando aquele amontoado de madeira flutuante esperando ele voltar pra praia sozinho.

    Normalmente Minhoca faria aquilo pelo simples fato de ser preguiçoso sem esperar dar certo, mas aquele não era um dia normal, então ele se enganou abraçado no tridente e na rede de que aquilo realmente ia funcionar.

    -Vem barquinho, vem! – e as ondas batiam contra o barco o empurrando. – Isso! Pra cá!

    Vem... Vem! – e mais ondas batiam. Aquilo estava mesmo acontecendo? O barco estava vindo, empurrado pelas ondas na direção da praia – Bagre, bacalhau e tainha! Não é que o diacho ta funcionando? MOLLY! VEM VER ISSO MENINA! – e se levantou num pulo conforme as ondas batiam no barco o empurrando para lá. – MOLLY!

    -QUE FOI? – a outra perguntou de longe.

    -VEM CÁ! DEPRESSA! – o outro chamou aos pulos.

    -Que foi agora cérebro de minhoca? Já falei pra buscar logo o barco e larga isso antes que machuque alguém... – a outra falando tirando o tridente da mão dele.

    -A onda ta trazendo o barco! Olha lá – apontou com a rede – Vem barquinho!

    -Minhoca, você andou tomando muito sol de novo. – ela tirou sarro olhando pro barco, a maré o levava pra longe, puxando pra alto mar. – Ele ta se afastando, não se aproximando.

    -Sua cara feia que assustou ele! Tava vindo até agora... – ele se virou pro barco chamando com gestos largos – Vem barquinho! Você consegue!

    -Para de viajar e vai buscar logo! – Molly mandou batendo com o cabo do tridente na cabeça do amigo.

    A contragosto Minhoca pegou de volta o tridente e andou na direção do mar, pensou em laçar o barco, mas estava muito longe e a corda não era grande o bastante. Podia jogar a rede quem sabe? Antes que pudesse se decidir se ia embora ou não levou uma lambada de um peixe e caiu no meio das ondas, engoliu mais alga salgada e se levantou procurando ao redor o autor traiçoeiro da rasteira! Viu a sombra entre as ondas e arremessou a rede, por incrível que parecesse, alguém inapto como ele conseguiu aprisionar o peixe e que peixão! Até esqueceu do barco e começou a dar pulinhos no meio da água segurando a rede e o peixe que se debatia, uma onda mais alta lhe deu um tapa na cara e irritado apontou o tridente pro mar enquanto segurava a rede agora vazia já que o peixe fugiu na onda.

    -Dá pra parar?! – gritou com o mar irritado. De repente era como estar num lago gigante, as ondas não existiam, apenas os movimentos do vento na água. – Ué? Cadê as ondas?

    Ondinha? – uma marola se formou vindo na sua direção. Olhou ao redor, será que mais alguém tava vendo aquilo? – Ondinha? – outra marola. – Onda? – uma pequena onda se formou correndo na direção da praia. – Maneiro! Barquinho vem cá!

    Novamente as ondas empurravam o barco em sua direção e cada vez mais ele se convencia que a cara da Molly que assustou as ondas, subiu no barco e se arrumou com a rede no colo e o tridente nas mãos, ficou olhando ao redor na água procurando o peixe enquanto falava: onda, ondinha, ondão! E as ondas empurravam o barco pra lá e para cá ao seu pedido. Viu o maldito peixe que lhe escapou e nem reparou que já estava em alto mar e sua vila quase sumia lá longe!

    -Agora eu te pego seu peixe! – exclamava de pé no barco, as ondas agitando tudo o desequilibravam – Chega de onda! Quero cair não! – e sacudia o tridente e a rede, o mar se acalmou e Minhoca já com o nariz pra fora do bote apertava o tridente e a rede vendo a sombra se mexer no mar. – Agora eu te pego!

    Como ele fez aquilo? Não tinha certeza, mas conseguiu prender o peixe na rede e lhe perfurar com o tridente tendo isso feito só restava puxar o dito cujo para dentro do barco, mas isso era a parte mais complicada. Minhoca tinha um físico invejável para qualquer cabo de vassoura! Por mais que puxasse e ficasse roxo de tanto fazer força, não conseguia puxar o peixe, depois de um bom tempo tentado e já exausto deixou o rede escapar da rede que o prendia, rangeu os dentes e ficou de pé no bote nervoso como nunca!

    Depois de ser chamado de inútil a vida inteira quando você finalmente consegue fazer algo dar errado assim no fimzinho é a gota d’água! Na raiva até mordeu os fios que formavam a rede e pegou o tridente pensando em jogar tudo longe, nem lembrava mais que estava em alto mar, num bote pequeno e sem remos, só queria mesmo era que tudo fosse por água abaixo e o céu escuro da noite estava carregado de nuvens. Na verdade, ele tinha quase certeza que tinha gritado aquilo:

    -Vá tudo por água abaixo também!

    Estava espumando de raiva? Não, era água escorrendo pelo seu queixo. Água caindo na sua testa, ondas se formando às suas costas, demorou algum tempo pra entender o que estava acontecendo, enquanto desejava que tudo fosse por água abaixo estava, chovendo? Se jogou no bote agarrado no tridente e na rede, as ondas enormes que se formavam, a tempestade que caía do céu depois do por do sol, fechou os olhos morrendo de medo enquanto as ondas levavam seu bote pra longe, e lá estava ele engolindo água de novo.

    As ondas viraram vários barcos, a tempestade inundou metade da sua vila, muitas casas ficaram destruídas, incluindo a de Molly, mas ele num viu nada disso, estava engolindo água aos montes e afundando, afundando e estava tudo escuro. Não sabia respirar debaixo da água e logo-logo ia parar de respirar. Viu uma sombra se movendo por perto, como ele via sombras na escuridão ele não sabia, mas via... Um par de olhos, azuis, como cristais, ou estrelas coloridas para variar.

    -Então foi você que chamou a tempestade... – era uma voz grave que parecia tremer sua cabeça por dentro. Foi a última coisa que ele sentiu, tentou nadar para cima, mas a corrente o puxou para baixo, tudo que viu foi aquele par de olhos e então... Mais nada.


    O Arsenal de Belliard

    Alguns exércitos são conhecidos por sua eficiência, outros pelos seus números absurdos, mas não era o caso desses soldados num acampamento modesto e movimentando. Eles não eram conhecidos de forma alguma, afinal durante os três anos de sua campanha não haviam deixado ainda nenhum sobrevivente. Apesar da eficiência de seus soldados, nesse momento o capitão estava tenso dentro da sua armadura, qualquer com soldado fica tenso quando a batalha é tão perto do mais conhecido lugar que cercava as lendas de Belliard.

    -Os batedores voltaram capitão, não havia nada nas planícies, nem nas colinas. Mas segundo os cavaleiros que acabam de se juntar a nós a marcha em menos de uma hora vai chegar através das colinas... – o mensageiro parou para recuperar o fôlego, ainda muito novo para entender tudo que envolvia uma batalha – Disseram que são tantos que o chão treme, capitão...

    -Então é melhor nossos soldados valerem mais... – o capitão respondeu colocando de lado os mapas, já era tarde para mudar sua estratégia ou repensar seus atos.

    -Bem que podíamos achar um item mágico de Belliard em nosso reconhecimento... – antes que pudesse terminar suas palavras o mensageiro levou uma porrada do capitão na cabeça e quase caiu para o lado.

    -Você é um mensageiro não um sacerdote. Não se iluda garoto. Magia? Belliard é o senhor da Guerra e não da magia... – O Capitão pegou sua espada e a encarou, a lâmina reluzindo e refletindo a luz do sol que nascera há pouco tempo – No final a Guerra é feita de pessoas e sangue, mais nada...

    -Diga isso pra quem está fechando o céu... – o mensageiro resmungou olhando o horizonte, na direção das colinas.

    As nuvens começavam a se formar, outrora límpido o céu fazia caretas de tempestade, em breve o som dos trovões começaria a tocar a marcha do exército inimigo. Covardes... Elfos covardes escondidos atrás de suas mágicas e flechas, sem nunca olhar nos olhos aqueles que iriam matar. Pois que assim fosse, luzes e ventos não iam assustar o capitão.

    -Preparar armas... – foi tudo que ele disse.

    Antes que a batalha comece sempre tem aquele momento em que tudo parece atrasado e inacabado, a tensão estica a mente de todos e eles começam a correr de um lado para o outro como se estivessem prontos para partir, mas não partem, não aqueles homens que o capitão comandava. Espadas e escudos, arcos e flechas, manguais e martelos, lanças e cavalos, todos são meios para atingir um único fim: a vitória.

    -Arqueiros na colina! Que as flechas achem as brechas nos escudos e armaduras!

    E logo as aljavas estavam cheias, as mentes limpas e a tensão só ficava presa nas cordas dos arcos sendo puxadas por mãos firmes, flechas não eram lançadas, voavam com vida própria se atiradas pelos arqueiros certos. Era a missão deles facilitar o trabalho daqueles que ficavam na linha de frente, era preciso ser rápido e para garantir a rapidez faziam seu trabalho sem armadura para lhes proteger fosse de relâmpagos vindos do céu tempestuoso ou das flechas atiradas pelo inimigo. O chão tremia da marcha, mas a mão deles não ia tremer na hora de atirar.

    -Cavaleiros! Vamos apostar uma corrida até Mandhros!

    Os animais eram tão obstinados quanto quem os montava, batiam os cascos no chão fazendo assim o som da marcha daquele exército, balançando a crina contra o vento que soprava vindo do inimigo, galopando sem desviar o olhar do alvo. Se preciso caindo em batalha junto a seus cavaleiros. Aqueles cavaleiros tinham as lanças para acertar o inimigo sobre seus cavalos e as espadas caso o combate acabasse no chão sem seus companheiros animais. A velocidade dos animais e a técnica dos homens montados neles devia ser uma combinação perfeita ou todo o ataque falharia.

    -Senhores! Meus amigos, meus soldados! Metade de nós vai morrer nesse campo! Mas vai levar consigo todos aqueles que marcham do outro lado dessa planície!

    E os soldados levantavam as armas e escudos com gritos de guerra e sangue pulsando, preparados para marchar se preciso na terra do Deus da Morte. Nenhum deles rezava por ajuda divina, se Belliard é o Deus da Guerra poderia agraciar qualquer um dos lados, era melhor confiar em suas espadas do que no que não podiam sentir atravessar o corpo inimigo.

    Antes de a batalha começar há um único instante de paz e silêncio, onde os soldados vislumbram o que foi e se despedem para partir para o que vai ser.

    -Ao meu sinal! – grita o capitão, a voz da liderança que leva seus soldados à vitória e glória, ou a derrota e ruína.

    Depois desse momento tudo se acelera, correm pelo campo de batalha tão selvagens que os soldados parecem animais... E o inimigo tinha animais com eles, monstros domesticados e tão bestiais que dilaceravam os homens em várias partes e uma única flecha não os parava!

    Monstros de dois metros com presas e garras sendo ordenados por gritos e chicotes estalando.Os jubatus são a maior ameaça física seguida pelas flechas que vêm cruzando os céus...

    Relâmpagos descem dos céus e queimam os soldados os jogando ao chão, tão poderosos se comparados as pequenas flechas atiradas. Mas os arqueiros são firmes e os destemidos cavaleiros logo irão encontrar e silenciar a fonte dos relâmpagos! Espadas se encontram e se separando numa dança que alguns apreciam com sorrisos considerados sádicos no rosto, outros enlouquecem depois de ver as espadas encontrarem a pele e fogem.

    -Capitão! Eles estão avançando! – um grita no meio da multidão ensangüentada e atarefada, quase inaudível no meio de tantos barulhos metálicos.

    -Então os empurre de volta!

    Os soldados se organizam, aproveitando a pausa dos relâmpagos, talvez os cavaleiros tivessem sido bem sucedidos. As bestas que os elfos enviaram estão mortas no chão, agora é algo pessoal, homem a homem, nada de magias ou bestas vagando naquele campo sagrado.

    Os punhos das armas são apertados com mais força, os olhares se estreitam por segundos que parecem uma eternidade e a situação que parece igualada retorna ao caos dançante da batalha. Pessoas e sangue, mais nada...

    O capitão não entende nada que o outro exército fala, mas não precisa, tudo que precisa entender é que seus soldados estão onde deveriam estar e fazendo o que fazem de melhor! A música do campo de batalha enche seus ouvidos, gritos e batidas, passos e golpes, o som metálico das armas em que ele confia, brados enfurecidos de vozes que ele conhece bem...

    Então o irreconhecível...

    Uma visão distorcida e colorida pelo sangue do que devia ser um campo de batalha, corpos caídos, ele também o estava. O céu uma vez tempestuoso novamente aberto, apesar uma visão escarlate de um campo de batalha vazio, uma vitória incerta ou uma derrota não notificada. Seu sangue escorria, sua cabeça latejava, uma forma andando entre os caídos.

    -Belliard... – a voz do capitão quase não sai da garganta.

    O homem de armadura se vira para o débil e semi-morto capitão caído no chão entre lanças e seus soldados, o rosto escondido atrás do elmo não sorri nem demonstra qualquer coisa que possa ser sentida. A arma ensangüentada parece arder em chamas, os olhos do homem de armadura parecem chamas, é como se tudo queimasse na glória da batalha tão forte quanto o sol que já ganhava o topo do céu.

    -Um bom aquecimento... – a voz que saía de dentro do elmo era forte como os tambores de um batalhão em marcha.

    -Meus... soldados... – o capitão perguntou, mais mentalmente do que com a voz, afinal homens a beira da morte tem uma certa dificuldade em falar.

    -Amadores, mas fizeram sua parte...

    Como dizer que aquilo dentro da armadura era um homem e não fogo, como dizer que o amaldiçoava pela insolência e toda aquela péssima atitude quando ele refletia a essência de um Deus. Belliard... O capitão nunca teve fé em nenhum Deus, mesmo agora na presença do mais perto que chegaria de uma divindade acreditava ser um delírio que antecedia a morte, nada mais... Até mesmo a morte era algo irreal para alguém como ele, sua vida, morte, destino, existência ou o que quer que fosse era junto aos tambores e a marcha dos soldados.

    Mas aquilo não era a morte ainda, não... Ainda podia sentir um gosto amargo na boca mesmo depois que tudo escureceu, abriu os olhos apenas para ver um de seus soldados lhe segurando a cabeça e enfiando goela a baixo um liquido amargo que ele sabia ser remédio pelo gosto ruim e cheiro pior. Estava numa das barracas simples do acampamento.

    -Bem vindo de volta Capitão... – o soldado falou com um sorriso, tinha um curativo no pescoço e perdera uma orelha. – Sabia que não ia deixar a guerra tão cedo.

    -Qual o resultado final? – o Capitão perguntou com dificuldade para se sentar, descobriu segundos depois que a causa eram duas flechas ainda cravadas em seu corpo.

    -Só temos um terço dos homens que tínhamos antes da batalha, desse terço a maioria está ferida e precisa de cuidados. – o soldado falou indicando uma pilha de pergaminhos – O nome dos mortos para depois avisarmos as famílias...

    -O inimigo?

    -Depois que nossos cavaleiros destruíram os magos foram derrubados pelos arqueiros, mas isso nos deu a chance de revidar na linha de frente, depois que o senhor caiu no duelo um dos soldados do nosso lado começou a causar tanto estrago que o inimigo se assustou. – o soldado fez uma pausa – Ainda não descobri quem era, primeiro achei que você fosse capitão, pois era o único que usa armadura completa entre nós... Matou tantos elfos que os que restaram acabaram fugindo, o perdi de vista no campo de batalha, mas vou descobrir quem era.

    -Nem tente... – o Capitão falou e já que ninguém parecia querer fazê-lo arrancou ele mesmo as flechas – Mande o mensageiro atrás das famílias e cuide dos que precisam.

    -O garoto, quer dizer... O mensageiro desceu ao campo de batalha e tentou lhe ajudar no choque dos soldados, ele não resistiu aos ferimentos. – o soldado baixou o rosto em sinal de respeito, imaginava que o capitão gostasse do garoto já que quase sempre estavam juntos.

    -Então mande um batedor... – O capitão falou se levantando e tomando toda a água de um cantil próximo.

    -Capitão eu... – o soldado se levantou.

    -Faça o que eu digo!

    -E quando as tropas se recuperarem? – o soldado ousou perguntar.

    -Vamos fazer tudo de novo é claro...


    As Máscaras de Crisalis

    -Cavem mais fundo! Cavem mais fundo seus imprestáveis! – Exércitos de pilhagem não foram feitos para adentrar ruínas e enquanto o capitão gritava seu braço direito, um goblin franzino e com apenas uma orelha corria para lá e para cá. – CAVEM!

    -Chefinho! Encontrei chefinho! Na parede leste... – e o goblin apontava com a tocha em mãos, dando saltinhos de alegria.

    -Então leia seu estrupício, miséria da minha vida. – O Ogro cuspiu a menos de dois palmos do goblin que iluminou a parede de rochas trincadas onde haviam entalhes que muito lembravam a letra de uma criança.

    -Uma face para outra pessoa ser... Uma face para outros olhares manter...Uma face para de coração trocar... Uma face para todo esse caos reinar! – O goblin deu risadinhas histéricas –
    É o templo perdido da mudança chefinho!

    -Os camponeses estavam certos...hehehe... – O ogro cuspiu de novo.

    Alguns dias mais cedo ele não acreditava, matara quase todos daquela região de fazendeiros e desocupados, gente simples que vive do que planta e se alegra com o que canta. Apenas algumas mulheres que foram escravizadas e um bardo velho sobreviveram, foi o bardo velho que contou a história daquelas terras. Um templo que caíra como uma fogueira que se apaga e a lenda de uma magia tão antiga que vinha de um dos Deuses.

    -Qual Deus? – foi a pergunta óbvia do capitão, bem que queria encontrar uma arma abençoada por Belliard que o fizesse conquistar todas as terras. Talvez quem sabe a magia de Mercius para sobrepujar seus inimigos.

    -As faces das estátuas foram arrancadas...O templo caiu e não é mais possível ler as escrituras... Ninguém entra lá... O rosto foi apagado e o nome se perdeu!

    E NADA fica como um segredo para Grumm, ele que aprendera desde cedo a lutar e a arrancar a verdade junto com carne e sangue de suas vitimas, achou as velhas ruínas, encarou com uma careta as estátuas sem rosto e desceu ao subterrâneo levando sua nova leva escrava para cavar junto ao velho bardo. Enquanto cavavam o velho cantava, e era isso que ele cantava até mesmo depois da leitura do goblin quando Grumm foi olhar seus escravos:

    -Mercius que tudo cria, Petrus que a ordem nos trás... Aestus lave nossas terras, até que Mandhros chegue ao caís... E que para outro mundo me leve, longe da guerra e da fome... Paz pra quem trabalha e vive pobre até que morre... – Nesse trecho da música o chão sob os pés das mulheres e do velho bardo desabou.

    -O salão principal chefinho! - O goblin gritou dando pulinhos – O templo não caiu, ele afundou... Estávamos nos andares mais altos, mas veja as colunas que o sustentavam...

    Grumm ponderou por um momento, não vivera tanto tempo indo na frente, mandou dois soldados irem até o salão primeiro. Nenhum ser com o mínimo de inteligência no primórdio pisaria perto do que acaba de desabar, a menos que seu capitão ameaçasse degolá-lo. O salão era amplo, cheio de colunas, mas no altar principal nada havia além de pedra, escombros e pó.

    -Chefinho! Chefinho! – o goblin gritava enquanto Grumm olhava a enorme estátua sem face atrás do altar. – CHEFINHO ESTAS AQUI TÊM FACES!

    -O que? – Grumm foi até um dos cantos do salão.

    -Deviam ser os guardiões, emissários, ou sacerdotes... Em cada canto há uma estátua, todas com esse manto religioso e uma mascara no rosto! – O goblin apontou, a estátua dava três dele, mas para Grumm não pareciam tão grandes. – Todas são diferentes chefe e tem essas palavras estranhas na base.

    -Você é o estudioso, descubra o que quer dizer ou eu te mato e acho alguém que consiga!

    A espera não foi longa, com um Ogro enorme e armado gritando por perto é difícil trabalhar com calma, o goblin não estava certo do que estava lendo na base das estátuas, mas decidiu que iria ser aquilo mesmo antes que Grumm quisesse abrir uma vaga ao seu lado. A iluminação das tochas tremulava enquanto o pequeno goblin e o enorme ogro no meio do salão olhavam na direção da estátua sem rosto.

    -No altar há um tipo de poema que faça sobre as transições...Estações, mudanças na lua e vida e morte dos seres... – o goblin falava muito devagar, como se esperasse a reação de cada silaba para saber se corria ou continuava – Fica na esquerda da inscrição Mercis, a primeira. – o goblin foi até a estátua com seu chefe o seguindo de perto – Creio que seja uma menção à Mercius o primeiro dos deuses, se você notar, chefinho, a máscara não faz parte da estátua...

    De fato Grumm não havia notado antes, acontece que a máscara estava empoeirada, fazendo Grumm achar que era parte da pedra que formava a estatua, foi só o goblin agitar um tecido que a poeira escorrer como água deixando reluzir a máscara. Era uma máscara prateada que cobria do alto da testa até a ponta do nariz, os olhos reluziam escarlates como dois rubis prontos para serem retirados pela ganância de Grumm, que só não o fez por que viu a máscara piscar para ele.

    -Creio que seja mágica, chefinho, mas não há instruções em lugar algum... Venha, vou lhe mostrar as outras... – e o goblin se virou – Se seguirmos o ciclo a próxima fica aqui seguindo pela direita... O nome em sua base é Mirage, a Enganação... Deve possuir poderes de ilusões e alucinações, mas seu funcionamento é um mistério – novamente o goblin expulsou a poeira com seu trapo que chamava de tecido.

    A máscara se iluminou, parecia muito com vários pequenos cristais espelhados grudados uns nos outros que formavam uma máscara lisa que só não cobria os olhos e a boca, o detalhe que mais surpreendeu o goblin foi que não havia espaço para o nariz, então ninguém conseguiria vesti-la direito, para Grumm o que surpreendia era pensar no valor daqueles cristaizinhos.

    -Continuando temos Persis, a Troca... Não faço idéia de que tipo de poder essa máscara pode guardar... – o goblin agitou a poeira e depois de tossir contemplou junto ao seu chefe a máscara que só cobria os olhos e a metade esquerda do rosto, parecia feita de carvão e diamantes, que davam um efeito intercalado que o goblin achava sombrio e o Ogro fascinante. – Chefinho...aquela mais ao canto se chama Mandera, a Última... Creio que seja uma indicação ao Deus dos Mortos... é melhor mantermos-nos afastados...

    -Mandhros, é? Hehehe...

    Grumm caminhou até a última máscara enquanto seus soldados retiravam as outras das estátuas e as depositavam no altar com ordens do goblin, o goblin as olhava e pensava em tudo que vira no templo caído, tentava desvendar os segredos daquela magia. Pegou Mirage aproveitando-se da distração de seu chefe e começou a examiná-la, enquanto isso no canto do salão Grumm soprou a poeira de Mandera e encarou a Última. Sua forma lembrava a face de um demônio de dentes afiados e boca aberta num grito, os olhos eram como fendas, se o manto de mandhros fosse sólido ele seria muito similar ao material que constituía aquela máscara negra.

    -Me dê seu poder Mandhros... – Grumm falou pegando a máscara da estátua ela pareceu mudar de tamanho nas suas mãos, não muito distante dali o goblin pensou a mesma coisa sobre Mirage – Me dê!

    Uma vez a cada ano no primórdio duas pessoas muito próximas fazem coisas estúpidas ao mesmo tempo, como por exemplo vestir um artefato velho e enterrado há muito tempo, foi o que Grumm e o goblin fizeram ao vestir Mandera e Mirage. Os outros guerreiros que estavam no templo não continuaram lá por muito tempo, saíram correndo ao ver na frente do altar um enorme dragão que ocupava quase o salão inteiro, nem quiseram saber que fim iria levar o capitão no canto do salão e saíram correndo.

    -Onde vocês vão seus imprestáveis? – o goblin jurava que tinha dito isso, mas tudo que ecoou pela sala foi um som estrondoso que fez as pedras menores se moverem saindo da boca de um dragão negro e cheio de cicatrizes estranhas.

    -Hahahah!Hahahahahaha!HAHAHAHAHAHAHAHAHA! EU ME SINTO TÃO FELIZ!

    Grumm não parava de rir, parecia drogado ou talvez alguém que tivesse levado muitas pancadas na cabeça, seus olhos dentro da máscara brilhavam num tom metálico, podia sentir como se a máscara grudasse em seu rosto, estava quente e quanto mais quente ficava mais não sabia por que estava rindo.

    -Chefinho? Chefinho? – o goblin tirou a máscara e a colocou no altar, saiu correndo na direção do Ogro que gargalhava como um insano depois de muitas horas de tortura.

    -Não o toque! – a voz encheu o salão, o goblin se virou procurando onde ela estava a tempo de ver uma humana de longos cabelos castanhos e armada como uma guerreira de pé na frente das outras máscaras. Ela própria usava uma máscara que lembrava a face de um cachorro. – Se tocar o portador de Mandera caíram sobre você seus poderes caóticos!

    -Quem diabos é você? – o goblin perguntou se afastando alguns passos do Ogro que agora rolava no chão rindo.

    -Aqueles que guardam este templo não precisam de nomes, assim como Crisalis não precisa de uma face! – a humana ergueu a mão e o goblin notou outras três mulheres atrás dela, uma ferlix com uma máscara de pássaro, uma elfa com máscara de peixe e uma norfss com uma máscara de gato. – Ele profanou o tempo da Deusa da Mudança, e agora será transformado de conquistador a conquistado!

    -Que diabos vocês fizeram? Da pra me explicar o que ta acontecendo aqui?

    -Você não soube interpretar o aviso no andar acima. Uma face para outra pessoa ser é Mercis, a máscara da personalidade que muda sem aviso a mente de seu portador. – falou a ferlix com máscara de pássaro. – Assim como aquele que a veste muda... Pode mudar o que as pessoas ao seu redor são... Mentes frágeis são facilmente alteradas pelo meio e a dádiva de Crisalis muda tudo!

    -Uma face para outros olhares manter é Mirage, que muda sua forma para o que bem desejar. – começou a explicar a elfa com máscara de peixe – Somos o que somos, não o que os outros vêem... Apenas os sábios e de mente forte reconhecem e podem controlar os poderes desta máscara!

    - Uma face para de coração trocar é Persis, cujo extremo do poder vire a própria alma do avesso e sua maior característica se tornará o exato oposto. Talvez lhe desse mais sabedoria e menos humilhação, goblin servil! – exclamou a norfss de máscara de gato.

    -Calem a boca suas cadelas imundas!

    -Aqueles que profanam o templo pagam por isso... Mandera, a última e única que reina sobre todo o caos! A máscara que reúne os poderes de Mercis, Mirage e Persis com a malicia de Mandhros e a inconstância de Crisalis! Mandera a obra prima da Deusa da mudança já puniu seu mestre... Ele agora é vestido pela máscara que fará dele o que bem quiser assim como a todos que o tocarem, quanto a você...

    -Você que o seguiu cego até as profundezas terá outro castigo! – as quatro falaram em uníssonos ficando lado a lado – Mudaremos teu destino, estampando no seu rosto a máscara de tormento que você ajudou a estampar no de outros!

    O goblin gritou, mas ninguém poderia ouvir, ninguém que importasse uma vez que o capitão, o bravo Grumm vitorioso de muitas batalhas nada conseguia fazer além de rir de maneira maníaca. Mercis, Mirage e Persis foram embrulhadas e levadas embora, ali não era mais segudo... Mas Mandera permaneceu no rosto do qual se apossou, pois ninguém poderia tocar Grumm sem sofrer um dos reveses da máscara.

    O templo em ruínas foi trancado, mas correntes e barreiras não seguraram o enorme ogro por muito tempo, de períodos em períodos o ogro era sobrepujado e transformado em algo novo... Horas humanos, horas norfss, horas elfo... As vezes frio, as vezes sádico, as vezes traiçoeiro, regularmente audacioso e raramente gentil. Nunca mais lhe viram a face, por trás da máscara de demônio que grita, só viam a mudança constante de uma alma maldita.

    -HahahahahaaaaHAHAHAHAHAHA! Eu sou o rei do mundo! – gritaria Grumm décadas mais tarde, com aquela sensação de felicidade sem cabimento, com as mãos estiradas para o céu. – Nem os Deuses podem me deter agora...hahahahahaha!

    -Não blasfeme... – Grumm se virou para a origem da voz, enraivecido ao ver os quatro vultos de mulheres com máscaras – Seu mundo acaba hoje, escravo de Mandera!

    -Eu uso a máscara! Eu vou governar o mundo! – Grumm gritou pegando seu machado colorido por completo de sangue.

    -A máscara o usa, mortal imundo!

    Uma flecha humana, um relâmpago élfico, uma agulha norfss e uma adaga ferlix foram necessárias serem atiradas para que Grumm ficasse parado, mais três flechas, três relâmpagos, três agulhas e três adagas foram necessárias para matá-lo. O poder maldito de Mandera o mandava continuar a lutar, mas já era tarde e a terra jogada pelas guardiãs das máscara já lhe cobria o rosto que não era mais dele. Alguns anos depois iriam procurar por aquele lugar, aquela máscara, aquele Grumm que morreu misteriosamente depois de espalhar terror e discórdia, mas já não havia mais nada o que achar. E tanto a faces da mudança quanto a verdade se perderam.


    A Força de Inerill

    -Anda, garota, malha logo esse ferro antes que eu use essa marreta na sua cabeça! – Turman era um bom anão e apesar de um pouco rude nas beiradas, também tinha um bom coração. – Cadê a espada nova?

    -Na bancada, cérebro de cerveja! Na bancada! – Larissa também era uma boa garota, apesar dos bons modos lhe faltarem depois de ter sido criada por um anão beberrão como Turman.

    -Se eu soubesse que você não teria nenhum respeito por mim teria te deixando na rua pra morrer de fome!

    -Aí quem ia fazer as armas que você vende, barbudo? – ela riu-se por trás do rosto sujo e suado de um dia de trabalho – Por Inerill, pai-tampinha, você está mais sujo que eu vá tomar um banho!

    -Já falei pra não me chamar assim! – ele gritou socando a mesa, depois que cresceu ela tinha umas duas cabeças a mais de altura que ele – Vá comprar um martelo novo, esse velho não serve pra mais nada...

    -Sim, senhor... – ela falou deixando de lado a lâmina inacabada e o martelo velho que lhe acompanhou por muito tempo. Ficou feliz em deixar o calor da forja pelos corredores de construções da cidade. – Martelo, martelo, martelo...

    Entrar na loja não era problema, conseguir se mover dentro dela era, mas claro que isso não era problema para uma humana acostumada a malhar os músculos enquanto surrava o ferro. Um empurrão aqui, um sopro para tirar os cabelos ruivos da cara ali, alguns passos e pisões no pé alheio e pronto! Cá estava Larissa na frente do vendedor.

    -Quero um martelo de forja... – ela falou com uma careta ao ser acotovelada por outro cliente.

    -Eu cheguei primeiro!

    -Sinto muito Larissa, era meu último bom martelo... – o vendedor falou entregando o pacote ao brutamontes idiota – É urgente?

    -Baaa...Meu martelo não molda nem pão velho mais...Não tem nada?

    -Só um martelo velho que nunca vendeu... – o vendedor apontou para um banco não muito distante.

    -É de dar pena...Isso é mesmo um martelo?

    De fato não parecia um martelo, parecia um pedaço de carvão numa forma esquisita e deformada, além de tudo devia estar juntando pó faz anos. Mas quem sabe se depois de limpo não serviria para alguma coisa. A jovem ficou com o rosto apoiado nas mãos por um tempo pensativa.

    -Se levar o martelo te dou o escudo que veio com ele de brinde...

    -Acha que eu vou pra guerra? Que eu ia fazer com um escudo?

    -Seu pai não coleciona armas e armaduras?

    -Agora que você falou... O cabeça de cerveja tem mesmo uma coleção...Baaa, quer saber vou levar esse martelo velho mesmo. Pior que o meu não pode ser.

    O caminho de volta foi levemente acidentado, apesar das aparências o martelo era tão pesado quanto seu antigo e o escudo parecia desajeitado e pesado demais pra qualquer um que não fosse um anão, em contrapartida estava em igual estado ao martelo, sujo, velho e parecendo um carvão deformado. Já podia até ver Turman gritando e babando cerveja ao mesmo tempo dizendo que fora uma péssima compra, se fosse rápido tinha tempo de limpar o martelo e o escudo, então saiu correndo tanto quanto pode.

    -Água, água, água... – repetia enchendo o balde e depois – Lima, lima, lima... – e pegava a ferramenta – Pano, pano, pano... – e corria para todos os lados procurando um limpo. – Nada que meia hora de trabalho não resolva, hehehehe...

    De fato o martelo parecia bem melhor, tirada a crosta de carvão Larissa arriscou algumas batidas na lâmina inacabada, o martelo fazia um som harmônico toda vez que acertava o metal diferente do somzinho irritante comum. Era um belo martelo, grande e pesado, mas belo... Tinha u símbolo de Inerill em sua base e a cor do metal era diferente, Larissa não sabia que metal era, mas era bom.

    -Que raios de barulho é esse?

    -Não mandou comprar outro martelo, pai-tampinha?

    -Martelo, não instrumento musical! E NÃO ME CHAME ASSIM!

    -Veio com um escudo pro senhor, cabeça de cerveja. Não tive tempo de limpar, mas é um escudo...

    Turman deu um pontapé no escudo jogado num canto, aquela massa suja disforme, recoberta de poeira e carvão não podia ser um escudo e se fosse seria partido na primeira batida que levasse. Olhou para Larissa esperando um riso histérico de uma piada com ele, mas ela estava séria... Ela achava que aquilo realmente era um presente?

    -Isso é um lixo...

    -Só precisa de um pouco de limpeza, igual você assassino de calcanhares.

    -PARE COM ESSAS BRINCADEIRAS! Por Inerill se não tivesse te criado arrancava sua língua...

    -Aí voltaria a conversar com as armaduras vazias... – Larissa virou o rosto e voltou ao trabalho.

    O dia passou sem maiores tumultos, mas de noite a curiosidade apertou Turman de um jeito estranho e ele saiu do quarto e foi encarar o escudo horrendo, virou de ponta cabeça, segurou pro alto... Nada, parecia um lixo mesmo. Então um reflexo estranho bateu nos seus olhos, virou o rosto para o trabalho de Larissa. Três espadas em um dia? Ahhh ela ia se ver com ele, ele já tinha dito que precisava trabalhar por muito tempo até ficar direito e não acabar rápido e fazer algo inútil. Pegou a primeira espada que veio na mão e olhou de cabo à ponta, nada parecia errado na aparência, mas devia ser fraca que nem uma faca de cozinha.

    -Larissa...Larissa... – Turman exclamou levantando a espada e com toda força que ainda tinha nos braços acertou o escudo. O barulho foi estranho, era o mesmo barulho harmônico que o martelo que ela comprou fazia, a espada não quebrou, mas o golpe mais forte de Turman só serviu para arrancar um pedaço da crosta de sujeira que cobria o escudo. – Pelas barbas de Inerill...

    O anão não dormiu aquela noite, ficou limpando o escudo e Larissa o encontrou na manhã seguinte abraçado no enorme escudo que era do mesmo metal estranho do martelo e tinha o símbolo de Inerill. A garota sorriu e foi comprar algo pro café da manhã, por algum motivo que ela não sabia direito qual era levou o martelo junto, andava assoviando com o martelo no ombro, até que um brutamontes bloqueou seu caminho e o sol da manhã.

    -A... É você de novo... – ela falou dando um passo pro lado e fazendo uma careta quando ele parou na sua frente de novo – Que você quer filhote de cruz-credo?

    -Esse martelo é meu! EU paguei pelo melhor martelo daquela loja e você pegou ele!

    -Escuta aqui miséria da minha vida, você pegou seu martelinho brilhante e eu peguei o velho, não venha reclamar comigo se sou a única que já ouviu falar em limpeza nessa cidade! – isso foi golpe baixo, por um acaso o brutamontes na sua frente era o Ogro mais fedorento da cidade e ele era um tanto quanto ‘sensível’ a quem falava do seu cheiro.

    -AAAAAAAAAAAAAHHHHH!

    Levar um grito de um Ogro Larissa admitia que podia ser amedrontador, mas era ainda pior e mais enervante quando ele babava em você com aquele hálito podre. Mas ela não tinha tempo pra ficar enojada quando ele estava prestes a esmagar sua cabeça com um martelo, sorte sua poder sempre pular pro lado.

    -Quer brigar é? Pode vir seu estrupício! – a humana segurou firme no martelo com as duas mãos, por algum motivo ele pareceu mais leve agora do que antes – MAAAADEEEEIRAAAAAAAA! – Larissa gritou dando uma martelada na canela do Ogro.

    O efeito foi bem parecido com uma árvore gigante caindo na floresta, o Ogro derrubou não apenas metade da barraca de frutas que estava ao lado deles, mas também causou a queda de vários transeuntes. Larissa nem prestou atenção no fato de não ser forte o suficiente para fazer aquilo normalmente, estava ocupada apontando e rindo da cena, recolocou o martelo no ombro pegou uma fruta e voltou assoviando para casa.

    -PELAS BARBAS DE INERILL QUE FOI QUE VOCÊ FEZ AQUI!? – Larissa quase caiu pra trás ao ver que sua casa, loja e forja tinham virado algo muito parecido com uma construção abandonada e prestes a desabar.

    -É maravilhoso, Lari! – Turman não a chamava assim desde que ela era menor que ele – O escudo de Inerill é maravilhoso! Você não vai acreditar no que aconteceu...Lembra daquele mago que nos roubou e quase te matou? Ele apareceu aqui... Você precisava ter visto, Lari!

    -Está bem, pai-tampinha...Acho que você bebeu demais. – ela falou o fazendo sentar-se no escombro mais próximo.

    -Não bebi coisa nenhuma! Acordei e você não estava aqui e aquele mago safado veio nos roubar de novo e enquanto pegava o dinheiro me disse como ia te achar e lhe dar choques até seus olhos saltarem... Você sabe que só eu ameaço você, não é? Fiquei puto da vida com o desgraçado e comecei a tacar coisas nele...

    -Ótimo! Aí destrói tudo e ficamos ainda mais miseráveis do que se tivesse deixado ele ir!

    -Escuta a história inteira! – Turman falou sorrindo como uma criança – O desgraçado veio pra cima de mim, com aqueles raios dos infernos que não sei da onde ele tira, maldito elfo de olhos estranhos... Achei que eu ia ficar de cama por um mês que nem da outra vez, mas não...Dessa vez o escudo de Inerill estava comigo!

    -Ta dizendo que aquele escudo velho parou os raios?

    -Você precisava ver, Lari! Foi raio pra todo o lado! No mago, na forja, na loja...HEHEHEHE! Me senti no meio de uma maldita tempestade elétrica e sai sem nenhum arranhão graças a Inerill.

    -Inerill podia ter protegido a casa também... – Larissa resmungou.

    -Você não vê, Lari? Você conseguiu itens mágicos! Itens de Inerill! Fomos abençoados pelo Deus, fomos abençoados...

    -Lenhador de grama, você ta viajando... Deve é ter tido um ataque de sonambulismo. Agora me ajuda a arrumar essa bagunça...

    -NÃO ZOMBE DE INERILL! – de infantilmente feliz ele passou pra possuído raivoso.

    Larissa não entendeu por que ele ficou possesso, mas assim que percebeu ele já estava a atacando e ela tentando parar os ataques com o martelo que definitivamente não fora feito para defesa. Chamar seu nome não adiantou, pedir que parasse também não, Turman tinha ficado louco, talvez um raio o tivesse atingido na cabeça e o deixado demente.

    -Mais nada pode me parar, eu tenho a força de Inerill comigo! – ele gritou com o escudo em mãos – Você vai se arrepender de ter zombado de Inerill, garota!

    -Engole Inerill então! – Larissa gritou levantando o martelo.

    Não dá pra explicar o som do choque entre o martelo e o escudo, era como tambores de batalha e ao mesmo tempo como o destino sendo forjado. Saiu faísca pra todos os lados, Larissa ganhou cicatrizes nos braços, mas Turman levou o maior azar... Seus olhos queimaram com as faíscas da colisão, agora cego já não sabia da onde vinha o que.

    -Inerill! Inerill! – ele gritava apalpando o escudo.

    -Agora já chega pai-Tur. – Larissa falou como quando era uma criança o segurando pelo braço – Vêm eu vou cuidar de você...

    -Não! Você quer afastar Inerill de mim!

    -Pai-Tur! – Larissa gritou e viu o rosto do anão se contorcer em dor e tristeza.

    -Lari... Minha Lari...

    -Está tudo bem...Vem...Vou cuidar dos seus machucados...
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    Mensagem por Mandhros Sex Nov 10, 2023 12:02 pm

    As relíquias dos deuses - parte 2

    A Foice de Mandhros

    A morte tem muitas faces, se Crisalis tivesse pego o caos emprestado com Mandhros esse teria pedido em troca os disfarces que usa cada vez que uma pessoa conhece sua obra prima: a morte. Não se engane com esperanças de anjos e luzes brancas, a morte raramente é tão bela ou romântica. Algo tão raro que vale a pena ser procurado e almejado, e assim foi por Aleit.

    Por mais que não tivesse a imortalidade dos elfos, Aleit ainda era jovem e tinha tempo o bastante para se aperfeiçoar numa arte que aprendera ainda pequeno, criado num prostíbulo onde sua mãe lhe sussurrava para ficar quietinho no armário enquanto ela estava ocupada.

    Aleit nunca pensou mau de sua mãe, cada um fazia o que precisava para viver, no caso dela era se vender, no dele matar... Matar como seu modelo paternal fazia, Luc era a versão simpática dos assassinos. Sempre gentil com as mulheres, sorridente com os amigos e implacável com seus trabalhos. Matava em nome das mulheres da casa aqueles que passavam dos limites ou não pagavam.

    -Sempre segure assim, dá mais leveza e agilidade ao punho... – Luc explicava com uma adaga sem fio ensinando Aleit a maneja-la – Não importa se o estrago das espadas e machados é maior, Aleit. O importante é entrar e sair, rápido e silencioso. Para ninguém saber além de você o que aconteceu...

    -Nem quem morre? – Aleit perguntava com seus belos e gelados olhos azuis brilhando.

    -Se possível, nem quem morre!

    Esse era o tipo de ensinamento que Aleit levaria por toda a vida e que no fim dos seus 26 anos ainda estava fresco em sua memória. Tanto tempo, tanto sangue e ainda não tinha alcançado o que ele julgava uma bela morte. Limpa, rápida, sem dor, sem noticia e sem bagunça... Deixar uma dama deitada na cama como se ainda dormisse um sono morno e tranqüilo, permitir ao velho senhor que repousasse a cabeça na poltrona como se tivesse adormecido lendo as últimas cartas. Mal manchar o cenário de sua composição de sangue, nenhum ruído maior que uma agulha caindo em outra sala. Ainda não tinha conseguido...

    -Da próxima tente furar na garganta... – era uma voz baixa, mas tinha força, era rouca e fria como uma brisa na nuca que lhe faz arrepiar.

    -Que? – Aliet se virou, sabia que o morto na cadeira não tinha dito nada, estava morto com um corte na lateral do pescoço. Mas tinha mais alguém ali. Quem? Tinha procurado na casa antes de fazer seu trabalho. – Quem está aí?

    -Não se incomode comigo, por favor... Só parei para apreciar. Foi muito interessante o jeito que você destrancou a porta sem nenhum barulho...

    Aliet teve que piscar algumas vezes para entender o que estava vendo, na frente da janela, ao lado da cortina e sendo chacoalhado pelo vento como a mesma um manto escuro como céu de tempestade e rasgado como trapos de mendigo, o vento levou parte do manto até seu rosto, não era tecido... Ao lhe tocar virou cinzas como papel queimado.

    -Por Mandhros... – Aliet murmurou olhando as cinzas na mão que levou ao rosto.

    -Por Mandhros, de Mandhros... – uma mão de pele pálida e ossuda apontou para o morto ali do lado – Para Mandhros...

    -Quem é você? – Aliet deu um passo para frente, por algum motivo sentia uma certa empatia naquela voz e naquele ser.

    -Já tive muitos nomes desde que Mandhros inventou a morte. Muito prazer, assassino, pode me chamar de Nihil, a Foice de Mandhros. – havia barulhos na rua, alguém estava chegando.

    -Veio me matar? – Aliet perguntou sem nem tremer a voz.

    -Não... Apenas dar os parabéns, você realmente facilita meu trabalho... – Se Nihil tivesse um rosto por baixo daquele manto, o rosto estaria sorrindo – Adoraria ficar e conversar, mas eu tenho coisas a fazer e você pessoas a receber... – Nihil sumiu só restando a cortina tremendo ao vento.

    -Gerard! Gerard! Cheguei! – uma voz gritava.

    Aliet não se alterou, primeiro por que não era devoto nem supersticioso, segundo por que não tinha medo de morrer, terceiro por que desde que ficasse calmo sairia dali sem problemas. Foi o que aconteceu, mas nos dias seguintes não conseguiu trabalhar. Ficava puxando os cabelos negros como se quisesse arrancar junto com eles alguma conclusão de sua cabeça.

    -Desistiu de achar sua ‘bela morte’? – era a voz de novo, Aliet se levantou num pulo da cama e encarou, ou pelo menos pensava estar encarando, Nihil sentado na cadeira. – Olá...

    -Você... Que quer comigo? – Aliet perguntou impaciente.

    -Conversar... E você o que quer? – Nihil parecia ligeiramente mais dissimulado que o mais dissimulado que Aliet já conhecera. Mas o que mais poderia esperar de algo que não era humano e aparecia quando queria onde queria. – Minha aparência lhe incomoda, Aliet?

    -Me parece muito comum para a foice de Mandhros... A aparência que qualquer criança imaginaria ao ouvir uma história de terror...- Aliet respondeu notando que Nihil se chamava de foice, mas não carregava nada. – Como uma foice mata sem lâmina alguma?

    -Eu sou a lâmina... – Aliet olhou maravilhado enquanto um foice aparecia firme na mão de Nihil, a lâmina ensangüentada. – Talvez outra aparência lhe agrade mais...

    Aliet se não estivesse acostumado com pouca roupa e mulheres lindas ficaria de queixo caído ao ver a aparência de Nihil se tornar uma jovem morena de olhos verdes e roupas justas segurando a mesma foice. A jovem sorriu abraçada a foice, mais um anjo da morte que um ceifador.

    -Ou talvez algo mais sério... – a voz era a mesma, e a Nihil voltou a mudar se tornando um senhor de trajes sacerdotais, longa barba branca, só a foice não mudava – Que rosto você quer que a morte tenha, Aliet? O seu? – o rosto do senhor se tornou seu próprio rosto e Aliet pegou a adaga pensando em finca-la na cabeça de Nihil para que parasse de piadas. – Talvez não... – Nihil voltou a forma de criatura de manto negro e capuz lhe encobrindo o rosto.

    -Pode matar qualquer um?

    -De qualquer jeito... – Nihil respondeu.

    -Há qualquer hora?

    -Não importa o lugar... – Nihil parecia se divertir com aquilo.

    -Pode me ensinar? – os olhos azuis de Aliet brilhavam como os de uma criança que pedia por um pedaço de doce, a inocência reluzente neles era completamente oposta a vida que levava, mas ali estava.

    -Claro que não... – O brilho de Aliet despencou até que ele foi tragado para um abismo de decepção, mas Nihil continuou a falar como se não ligasse ou não tivesse notado nada de diferente – Mas posso lhe ajudar a alcançar o que você deseja...

    -Como? Duvido que a foice de Mandhros fosse boa o suficiente para ajudar qualquer um sem um preço... Só por admirar meu trabalho... – Aliet riu.

    -Claro...eu cobraria com sua alma, mas acho um preço bem razoável para que você possa usar a arma mais letal de todo o primórdio.

    -A arma mais letal? – Os olhos de Aliet tornaram a brilhar.

    -E mais silenciosa...

    -Qual?

    -Temos um acordo?

    -De que serve minha alma mesmo? Temos um acordo... – Aliet sorriu.

    -Xeque-mate... – Nihil falou se levantando da cadeira – Xeque...e mate!

    O movimento da foice foi tão rápido que Aliet não conseguiu acompanhar, antes que se desse conta já sentia seu peito ser cortado pela lâmina sangrenta, teria amaldiçoado Nihil se pudesse falar, mas nas atuais circunstâncias apenas caiu na cama. Mais tarde abriria os olhos com dor no peito onde ganhara uma cicatriz, passou os dedos sobre a marca da foice, mas não demorou até outra coisa chamar mais sua atenção.

    -Nihil... – Aliet passou os dedos com suavidade pela lâmina ensangüentada, segurou com curiosidade o cabo negro enquanto lia as inscrições: Nihil. Uma adaga, nada mais adequado para alguém como ele.

    Jogou sua adaga velha fora e colocou a nova no bolso, saiu de casa sem se importar com a camisa rasgada onde a cicatriz aparecia como se fosse um ferimento velho de batalha.

    Invadiu a primeira casa que dava sinais de isolamento, entrou sem problemas, ficou num canto do quarto admirando os lençóis da cama, a posição da mesa que servia de penteadeira, sentiu o perfume das cortinas e esperou.

    -Que dia... – vitima boa, tinha a voz baixa e suave. Largou o casaco na cama e se sentou na penteadeira, atividades marcadas pela rotina, sem olhar para os cantos, para o escuro, para o visitante indesejado. – Uma...duas...três... – ela contava enquanto penteava o cabelo.

    Ele deu passos curtos e discretos, admirava como ela segurava firme o cabelo e a escova, talvez a posição não mudasse depois de sua morte. Chegou bem perto, ela não notou, cheirou o perfume de seus cabelos, a contagem chegou ao vinte. Sorriu e tirou a adaga de Nihil do bolso, uma perfuração rápida atrás do pescoço. Os olhos dela continuavam abertos, a mão esquerda no cabelo, a direita na escova. A perfuração foi pequena e não escorreu nenhum sangue, a lâmina o bebeu como um miserável sedento.

    -Linda... – Aliet murmurou depois beijou a lâmina em agradecimento.


    A Capa de Mercius

    Ser um ladrão já foi mais difícil, na época em que as cidades ainda eram vilas e aglomerados de pessoas perdidas ao redor de templos e adorações quando um ladrão era pego seu futuro era ser espancado até a morte pela multidão enraivecida. Elmeric viveu nesses tempos, mas que podia fazer se era pobre e a comida chamava enquanto o ouro reluzia. Vivia na periferia do que poderia ser chamado o centro dos orelhudos, um enorme templo de adoração a Mercius onde ou você era elfo ou trabalhava para eles.

    -Me desculpe... Ahh, é só um bicho... – exclamou nosso herói aliviado depois de ter tropeçado numa daquelas bestas que os elfos usavam para cargas, o animal grunhiu, estava machucado de chibatadas. – Judiaram mesmo de você...
    Por mais que fosse um animal, não dava para não ter pena, ferlix... Era esse o nome? Sempre tão maltratados e escravizados, alguns trabalhavam até morrer sendo mais tarde substituídos por outros. Elmeric viu os elfos se aproximarem e se afastou, era um humano perdido no meio de um lugar ao qual não deveria ter visitado. Mas fazia tempo que saíra de casa e prometera voltar com todos os meios para tirar suas irmãs e o pai velho da miséria, não importava o que tivesse que roubar... ou quem.

    O Deus da magia e de toda criação deveria lhe perdoar o furto, afinal não precisava de ouro nem de jóias, de comida nem de água, já tinha tudo que poderia querer e o que não tinha poderia criar. Elmeric entrou no templo pelos fundos, como os servos que levam a comida e encomendas dos sacerdotes. Era uma construção alta, com abóbadas e torres pontiagudas, com esculturas e obras de arte, bela e ao mesmo tempo estranha, como algo que foi criado sem se pensar muito no que resultaria da combinação.

    -É você o novo carregador? – uma jovem elfa de olhos profundos perguntou ao flagrar Elmeric entrando no salão do templo pela porta dos fundos.

    -Sou. – mentiu por falta do que fazer.

    -Estão precisando de você na Biblioteca, vá logo para lá. – a elfa mandou com ar de superioridade tão nítido que chegava a ser uma ofensa.

    -Claro, minha dama. – Elmeric se curvou, mais para esconder o riso de deboche do que para mostrar submissão, assim que a elfa sumiu de suas vistas entrou correndo nas escadas que levavam até o subterrâneo. – Maldito vendedor de mapas, aqui não é a sala das oferendas só tem papel!

    Um barulho de queda fez Elmeric levar um susto e se esconder atrás de uma pilha de pergaminhos, era uma humana provavelmente mais pobre que ele pelas roupas rasgadas que vestia e o modo animalesco que seus cabelos se encontravam. Ela tinha derrubado livros e agora os empilhava para voltar a carrega-los, tossia muito, talvez pela poeira e talvez por doença.

    -Não acredito que você derrubou esses tesouros de novo! Mais uma vez e será castigada , Aimee! – um elfo gritou, mais babando do que falando.

    -Perdão, senhor, mas a pilha está muito pesada. – a humana franzina e de olhos baixos se escusava.

    -Não me venha com desculpas, sua destrambelhada! – Elmeric temeu que o elfo que erguera a mão fosse espancar a pobre moça, então saiu de seu esconderijo. – Quem é você?

    -O novo carregador... – e piscou para a moça pegando mais da metade dos livros que ela carregava – O que faço com eles?

    -Ela vai te mostrar, agora saíam da minha vista!

    Ela não falou nem mais uma palavra, baixou o rosto e foi seguindo com os livros nos braços, morta de vergonha enquanto era seguida pelo ladrão que se fingia de carregador, desceram mais escadas. O mapa malfeito que ele comprara estava errado, no mapa só havia um nível subterrâneo, ali haviam de fato dois, um onde ficavam guardados os pergaminhos, grimórios e mapas e este segundo que Elmeric contemplava com curiosidade.

    -Do que é feita essa sala? – ele não se resistiu a perguntar.

    -Não é para nós saber, basta que saibamos que pertence aos elfos e ao seu Deus. Venha temos mais coisas para pegar. – ela chamou indo até a porta. – Vamos, não fique aí parado.
    Elmeric não se moveu, estava encantado, a parede parecia ser formada de várias pedras preciosas empilhadas e grudadas umas nas outras e havia uma enorme mesa que lembrava muito ouro onde eles haviam colocado os livros. Elmeric só ouvira falar de tal sala nos contos mais estapafúrdios, uma sala de riquezas onde o Sumo Sacerdote do templo se senta para estudar as palavras de Mercius, a sala seria um presente do Deus para seu mais devoto servo.

    -Parece ouro... – o ladrão deslizou a mão pela mesa, julgando que sonhava.

    -Não toque! Aí se nos pegarem aqui perdendo tempo, esfolam você e eu... – Aimee se adiantou até Elmeric o pegando pelo braço – Vamos antes que o Senhor do Templo chegue!

    -Você não tem vontade de pegar pra você? Aposto que uma dessas pedras a tiraria para sempre da servidão... – Elmeric falou encarando a garota que só agora ele notou chorava.

    -Por favor, vamos embora... Se nos pegam aqui na cobiça nos arrancam os olhos... E se você pegar algo lhe cortam as mãos! – ela parecia amedrontada. Pulou de susto ao ouvir o som de passos – Aí de nós dois, tem alguém vindo... – ela se jogou contra a parede de olhos fechados, rezava baixinho, mas ele não ouviu para quem.

    Os passos ficaram cada vez mais próximos, ele quis que a parede fosse de ar, poderia atravessá-la e puxar a garota junto para que os temores dela não se tornassem reais. Estava tranqüilo, sempre estivera, achava que tudo tinha uma solução, podia se safar, deu uns passos para trás, logo era ele e Aimee encostados na parede, ela rezando e ele esperando...

    Uma desculpa na ponta da língua. E então... Continuaram indo para trás, agora a parede estava na frente, podia vê-la, mas não via mais a sala, virou o rosto para trás achando que tinha se virado e não notou, mas não, não estava no mesmo lugar.

    -Aimee... Aimee! Abra os olhos, você conhece esse lugar? Onde estamos? – ele perguntou olhando ao redor, era uma sala simples, com uma única porta na parede oposta e uma caixa de madeira enorme no centro.

    -Nunca vi esse lugar... Onde você me meteu? Ai de mim! – ela resmungou e a cada resmungou ele a achava mais medrosa e exagerada. – Preciso voltar pra biblioteca, antes que me punam! Preciso, preciso... – e ela saiu correndo pela porta a deixando aberta atrás de si.

    -Que diz aqui...? – Elmeric encarou a caixa, não entendia élfico muito bem. Na verdade só aprendera o necessário para sobreviver – Mercius... ? – era a única palavra que reconhecia na caixa, tentou achar a tranca ou a divisória da tampa – Vamos lá... O que tem aí dentro...

    Tateou, bateu, chutou e encarou... Nada mudava, não havia fechadura, tampouco tampa, tampouco conseguia levantar a caixa ou movê-la. Deu risada de sua própria teimosia e inutilidade, imaginou que se a caixa fosse um pão comeria o bastante para ver o que tem dentro. Teve que piscar várias vezes para acreditar que a cor da caixa mudou diante de seus olhos, adquirindo um tom marrom claro, deu alguns tapas na caixa e viu que textura também havia mudado. Conseguiu arrancar um pedaço com a mão...

    -Ta de brincadeira... – levou à boca, era pão... Morno e saboroso, derretia na boca e enchia a barriga. Continuou comendo e achou que era um tipo de caixa dos desejos, mas então comeu uma grande parte do tampo e percebeu que era oca por dentro. Seu estomago agradecia e os olhos brilhavam curiosos. – Vem com o papai...

    O que estava lá dentro brilhava como prata, brilhava tanto que Elmeric julgou que fosse pó de estrelas, mas era sólido e macio, deslizava por suas mãos como seda. De pé admirou aquela prata que formava o tecido mais brilhante que já vira, seu brilho foi diminuindo até se tornar um pano prateado que aparentava ser comum. Virou a capa ao contrário, vermelho como um rio de sangue por dentro e prateado como as estrelas por fora. Preso nos cordões prateados um pequeno bilhete com uma letra bonita dizia: me vista para criar o que sua mente desejar, mas perca a razão e nada conseguirá.

    -Magia de Mercius? – Elmeric era um ladrão e como qualquer ladrão cobiçava a magia, mas não sabia usá-la nem entendia as instruções de grimórios ou bilhetes como aquele, então jogou o bilhete fora e vestiu a capa dando risada e se achando invencível. – Agora... Aonde estão os tesouros? – pegou mais um pedaço da caixa de pão e saiu andando pelo templo.

    Elmeric era bom em passar despercebido, mas com uma capa chamativa como aquela isso era fisicamente impossível, não demorou muito para perguntarem quem ele era e o que estava fazendo ali. Com a maior cara lavada ele sorria e dizia ser um visitante do templo que se perdeu, disse isso tantas vezes num período tão curto que quase se convenceu disso, até ver uma procissão de sacerdotes correndo para todos os lados e gritando.

    -O BAÚ DE MERCIUS! ABRIRAM O BAÚ! – essas palavras o fizeram apertar a capa como se temesse que ela lhe fosse arrancada, se sentia bem com ela, se sentia importante.

    -ACHEM O INTRUSO QUE PROFANOU O BAÚ DE MERCIUS! MATEM-NO!
    Elfos invejosos, só por que ele fora mais esperto e conseguirá abrir o baú, saiu correndo pelos corredores e escadas e assim que notaram essa estranha fuga começaram a persegui-lo. Seu coração queria pular para fora, não iriam lhe tomar a capa, era dele! Ele abrira a caixa de madeira, ele leu o bilhete de me vista. Encurralado e temeroso, tudo que queria era que as paredes fossem de água, que pudesse atravessá-las e correr pelo campo aberto.

    -Não há escapatória... Você será condenado por profanar o baú de Mercius. – era um elfo com ar de importante, cabelos brancos e olhos negros.

    -Anda parede... Me deixa atravessar de novo, que droga! – Elmeric esmurrava a parede, não entendia por que a capa não funcionava.

    -Você não entende, não sente, não domina os poderes do Deus-Maior. – o elfo deu um passo a frente – Me entregue a capa e se renda... – ele estendeu a mão.

    -NUNCA! – se embrulhou na capa como um mendigo se abraçaria a um trapo velho no frio congelante.

    -Me entregue a capa e pouparei sua vida... – a mão se manteve firme no ar.

    -ELA É MINHA! EU RECEBI O BILHETE! E EU VOU CRIAR UMA VIDA COM ELA! – Elmeric gritou, sabia que não iam fazer nada, tinham medo de estragar a capa, a capa era sua, era sua...Era isso! Por que estava nervoso? Não iriam lhe fazer mal para não danificar a capa. Não podiam tomá-la a força, ela era mágica...e era dele. – Vocês não são donos da magia, seus orelhudos senis.

    As paredes ficaram num azul cristalino que lembrava os riachos da terra de Elmeric, atravessou as paredes e saiu correndo para a estrada, para a liberdade, ele nunca iria tirar a capa, era dele! Fora um presente de Mercius para ele! Para mais ninguém... Conseguiu fugir, em seus trancos e barrancos aprendeu a usar a capa, a colorir de forma diferente as coisas ao seu redor e fazer delas algo diferente. Conseguiu fazer uma vida nova, mas não lhe ensinaram que a magia tinha seu preço...

    -ELMERIC! NÃO!!! – foram as últimas palavras que ele ouviu de suas irmãs que nunca mais passaram fome, enquanto ele sentia um frio e a respiração dos ceifadores em seu pescoço. Estava... morrendo...

    -Minha... – suas mãos ainda apertavam a capa quando morreu anos mais tarde , pode-se dizer que sem arrependimentos. Ninguém nunca conseguiu despir a capa de Elmeric, mesmo depois que seu corpo se transformou em ossos e os ossos em pó. – É um presente de Mercius...para mim...


    Os Olhos de Petrus

    Não há muito barulho num campo de batalha quando esta já se encerrou, os ganhadores comemoram e então partem levando os feridos para a devida assistência, mas uma vez ou outra uma cena peculiar acontece no meio dos animais carniceiros que vêm aproveitar a comida a disposição. Este era um daqueles momentos em que um troll com um tipo de cajado retorcido com vários ossos presos com fios de corda batia em outro aparentemente mais jovem enquanto gritava.

    -Acha logo meu pé!

    -Ai, vô! Para com isso! – o outro falava empurrando o cajado e velho juntos os derrubando em meio aos cadáveres e o solo barrento cheio de sangue – Já falei pra esperar que eu vou achar a droga do seu pé!

    -E não esqueça dos seus dedos! – o outro gritava com sua boca com apenas três dentes balançando o cajado pra lá e pra cá, os ossos fazendo um barulho que lembrava um chocalho de criança.

    -Não vem com essa velho, depois cresce outro!

    -Zurk seu idiota! – e o velho batia novamente no troll mais novo com seu cajado de maneira frenética – Não aprendeu nada comigo? Nunca deixe pedaços seus por aí! Alguém pode pegar e usa-los contra você!

    -Que nem você faz com os outros... – o neto resmungou.

    -Exatamente! Agora ache logo meu pé!

    Trabalhar para os outros nunca é agradável, trabalhar para seu avô é pior ainda. Enquanto Zurk procurava entre braços, cadáveres inteiros e pedaços de armas quebradas pensava numa maneira de seu avô sofrer um acidente e morrer no auge dos seus duzentos malditos anos, mas sabia que gente ruim não morre fácil. Entre os xingamentos e protestos de seu avô acabou encontrando seus dedos que haviam sido arrancados num golpe de espada, quase os entregou para o avô segurar, mas então se recordou do que seu avô fazia e guardou consigo.

    -Quanta incompetência, acha dois dedos, mas não acha um pé! – o velho reclamava – Você puxou mesmo o vagabundo do seu pai, não fazia nada direito.

    -Não mesmo, a prova disso é você estar vivo... – Zurk resmungou levando uma paulada na cabeça pelo comentário.

    -Olha ali! – o velho falou apontando com o cajado.

    -Onde criatura?

    -Do lado daquela cabeça!

    -Ta louco velho? Aquilo é pé de moça, olha o tamaninho!

    -PÉ DE MOÇA? AQUELE É MEU PÉ SEU FILHO BASTARDO DE UMA CATINGUENTA! – o outro berrou arremessando o cajado no neto.

    Discussões familiares e filosofias sobre que tamanho é grande e que tamanho é de moça para um troll, depois que a ‘paz’ retornou ao campo pós-batalha Zurk teve que voltar a procurar seus dedos que se perderam na briga enquanto o avô guardava o próprio pé na mochila.

    Enquanto procurava suas partes perdidas tudo que o troll mais queria saber era se era pior com seu avô ou sem ele no mundo, quer dizer... Se ele morresse o pior que podia acontecer era nem Mandhros querer e mandar de volta, ou não? Amigos ele não tinha, parente ele era o único, pelo menos ninguém ia lhe perseguir por vingança e foi escorregando nela que Zurk conseguiu a resposta.

    -Filho duma @!$#¨@# $¨!

    Zurk já tinha visto muitas partes corporais desmembradas, também já tinha visto gente perdendo todo tipo de coisa estranha numa batalha, mas era a primeira vez que conseguia escorregar num olho! Devia ser de um Ogro ou Troll julgando pelo tamanho, Zurk pegou o maldito pensando em arremessá-lo no avô, mas ao invés disso ficou encarando ele na frente de seus olhos imaginando como alguém o tinha perdido, para sua surpresa o olho girou na sua mão e ele pode ver o avô e a resposta para a pergunta se era pior com ele ou sem foi respondida na hora, como uma iluminação de seus pensamentos. Sem se dar conta Zurk já estava de pé com o olho guardado consigo e o avô na sua frente.

    -Que foi garoto? Achou o que queria?

    -Sim.

    -Ótimo, já cansei daqui... – o avô se levantou apoiado no cajado e começou a caminhar, até que ouviu o barulho de espada sendo desembainhada. – Que foi garoto?

    -Não vá perder a cabeça vovô...

    O mundo era melhor sem aquele velho lhe enchendo a paciência, batendo em sua cabeça, procurando malditas partes corporais toda hora que uma parte caía por aí e foi isso que Zurk viu e foi assim que acabou arrancando a cabeça do seu amado avô. Que Mandhros se preocupasse com ele agora, depois de esquartejar devidamente as partes de seu avô com medo do velho voltar a vida se deixasse algo inteiro queimou os restos por garantia. Foi caminhando pensando em parar na taverna mais próxima, beber muito, comer mais ainda e depois fazer tudo que queria da sua vida, seja lá o que isso fosse. Zurk nunca pensara muito nesse tipo de coisa, estava ocupado demais ouvindo os resmungos do avô. Mas por algum motivo que Zurk não podia imaginar tinha uma multidão de pessoas enfileiradas andando entre ele e a taverna mais próxima.

    -Me esperem, eu também quero ver o Sumo-Sacerdote! – um pivetinho que pelos cálculos do troll podia ser morto com um pisão gritava correndo entre a multidão.

    -É verdade que ele guarda itens mágicos vindos do Deus? – outro comentava andando pra lá e pra cá.

    -Eu ouvi falar numa história de batalhas entre os Deuses, parece que Petrus e suas armas da justiça vão nos livrar da guerra! – uma outra comentava causando gargalhadas no Troll. – Quem está rin...? – a mulher puxou sua companhia para longe do asqueroso troll que ria babando.

    Mas nem que Belliard usasse o dedo mindinho um Deus almofadinha, cegueta e ainda por cima
    que se acha muito esperto ia acabar com a guerra, aquele povo devia ser muito idiota pra pensar isso! Mas Zurk não ia tirar a doce ilusão de paz da mulher, foi abrindo caminho entre a multidão até que o som de tambores o deixaram alerta, estava acostumado com tambores de batalha e quase arrancou a cabeça de uns três desembainhando a espada, muitos se afastaram enquanto um rapaz saia correndo aos berros:

    -OS SACERDOTES ESTÃO A PROCURA DE UMA RELIQUIA! RELIQUIA DE PETRUS FOI ROUBADA!

    -Mal chegaram e já estão perdendo as próprias coisas... – Zurk resmungou guardando a espada e olhando para a mão sem dois dedos, deu risada enquanto caminhava ouvindo os comentários.

    -Eu soube que é um livro mágico da justiça e ordem! – falava um.

    -Nada disso, é um escudo que protege os justos! – respondia outro.

    -Dizem que o ladrão fugiu pelos campos, será que foi pego na batalha? – isso sim fazia sentido!

    -Eu conheço um dos sacerdotes, eles estão muito preocupados. Dizem que quem tiver as duas relíquias será oniclemente...

    -Onisciente, sua burra!

    -E o que é isso, coisa esperta? – isso Zurk também não sabia, mas ainda achava aquela gente idiota.

    -É... É... Não sei!

    Já sem paciência pra tanta falação o Troll saiu empurrando a multidão para poder chegar a taverna, onde sem a menor intenção de pagar começou a beber e comer a vontade, deixando cair mais coisas no chão do que dentro da própria boca. Enquanto se alimentava não pode deixar de notar que entrava na taverna um senhor de roupas modestas usando um galho com cheiro de mofo pra guiar o caminho, uma vez que uma venda lhe cobria os olhos, ou quem sabe falta deles. Zurk achava que aquilo era uma perda de espaço útil no primórdio e como quem lê seus pensamentos o cego apontou o galho na sua direção.

    -A justiça é cega, mas exata! – Mas eim? Se é cega vai acertar o cara errado, isso era um raciocínio simples. Cara mais estranho.

    -Cala a boca e deixa os outros comerem... – Zurk mandou atirando um osso na direção do outro, em nenhum universo a frase dele faria sentido, uma vez que é cego não pode ser exato... Ou pode? Não, não, não... Enquanto ia pegar qualquer coisa achou novamente o olho, por que ainda estava com aquela coisa?

    Coisa mais macabras andar com partes dos outros por aí, isso era coisa do seu avô. Atirou o olho por sobre o próprio ombro e voltou a comer enquanto lá fora os passos, gritos e sussurros sobre especulações do item mágico perdido continuavam, mais tarde naquele dia um gato iria brincar com o olho e ser expulso pelo taverneiro, o olho ia rolar e ir passando de um lugar para outro até parar em... Em qualquer lugar. Mas quem liga? Era só um olho e Zurk, ou quase qualquer outra, não ia perder tempo pensando nisso.


    O Cachimbo de Yaba

    As fogueiras do acampamento estavam altas e a lenha crepitava, ciganos, vagabundos e ladrões eram do que os chamavam conforme os nômades iam de um canto para outro sempre com música, dança e risadas altas. As faíscas que saíam das fogueiras lembravam vaga-lumes, ou talvez pequenas fadas para os que já tinham o cérebro encharcado pela bebida e não sabiam mais se o chão estava sob seus pés ou acima de suas cabeças onde brilhavam aquelas pequenas jóias que chamavam de estrelas.

    -Cristian, venha cá... – o homem mais velho chamou, a barba mal feita e um cachimbo na boca ainda apagado conforme se sentava perto da fogueira. – Não tinha dito que ia viajar?

    -E vou, estou esperando o acampamento adormecer... Se minha mãe notar que me vou faria uma cena. – o jovem respondeu, nem barba tinha, mas tinha uns olhos verdes que herdara da mãe que dançava há duas barracas de distância – Não contou pra ela, contou?

    -Não, claro que não... Você sabe que ninguém gosta mais de viagens do que eu...

    Ele riu por trás da barba mal feita, os pequenos olhos escuros como dois besouros na escuridão enquanto procurava nos bolsos por algo, sempre sumia algo naquele grupo de pessoas. Ciganos, vagabundos e ladrões, alguém sempre pegava o que não era seu para suprir a fama do grupo nômade. Já que não achou mordeu a ponta do cachimbo impacientemente conforme o batia de leve contra os dentes pensativo.

    -Julius... Me conte outra vez como ganhou esse cachimbo. – Cristian pediu sentado ao lado do outro homem, enquanto mais velho fitava a fogueira o outro fitava o cachimbo de maneira curiosa.

    -Eu já contei cem vezes...

    -Conte cento e uma... Como um presente de despedida! – o jovem insistiu.

    -Eu era tão jovem e chato quanto você, só que viajava sozinho desde que me lembrava... Fiz uma parada numa dessas cidades movimentadas para encher a cara na taverna mais tranqüila que tivesse... – o homem parou e mais uma vez revirou seus bolsos, encontrou o que queria e apertou uma caixinha preta na mão.

    -A Boca do Ferlix... – o jovem falou com olhar sonhador.

    -A Boca do Ferlix... – o outro concordou com a cabeça – Um desses lugares que pessoas normais tem medo de beber achando que tem veneno nas canecas...

    Ele fez uma pausa, seus olhos se moviam nas chamas como se enxergasse dentro delas a taverna que visitou há tanto tempo. Ainda mordia o cachimbo, parava de morder e o batia de leve nos dentes amarelados pelo fumo, olhos de besouro e barba mal feita, as chamas dançavam como as dançarinas da taverna. Cristian parecia buscar essas memórias dentro dos olhos de Julius, mas então cortou o silêncio.

    -E depois?

    -Depois acabei que bebi demais e fui parar na mesa de um bardo, ficamos jogando cartas e rindo... Nossas risadas enchiam a taverna...

    -E ele gostou de você...

    -Ficamos amigos sim... Éramos dois pobres numa taverna, causando muito barulho e sem lugar para ir quando amanhecesse. – Julius parou para olhar a caixinha e deu uma risada baixa de saudades – O taverneiro nos expulsou aos berros!

    Mais uma pausa, dessa vez para deixar dois homens que se esmurravam passar e retornar a música ambiente da fogueira crepitando, das chamas que dançavam e de grilos que pareciam se entreter uns com os outros não muito longe. A noite era tranqüila, as pessoas que a agitavam como pedras caindo na água. Cristian deitou na grama, os olhos verdes refletindo as estrelas no anseio por ter também histórias para contar um dia.

    -Ele me convidou para um trago... Disse que como eu amava viajar... – Julius continuou e abriu a caixinha, só restava um fundinho de ervas que ele socou dentro do cachimbo enquanto narrava sua história – Me fale o que é viajar para você e lhe dou meu bem mais precioso, foi o que ele me disse. Eu falei...

    -Viajar é acordar e dormir nos braços de sua amante sabendo que ela não irá pedir satisfações quando você chegar atrasado. – Cristian citou a frase que já conhecia rindo enquanto Julius enchia seu cachimbo.

    -Ele também riu...E me deu o cachimbo e esta caixinha... – Julius jogou a caixinha vazia para Cristian que a apanhou no ar.

    -Queria ter histórias para contar de minhas viagens também... – Cristian falou com uma pontada de inveja enquanto rodava a caixinha em suas mãos.

    -Você vai ter garoto e para garantir isso... Pode ficar....
    Cristian não acreditou em seus olhos quando viu Julius esticar a mão lhe entregando o cachimbo, piscou algumas vezes enquanto colocava a caixinha no bolso e pegava o cachimbo que cheirava a pó de estrada a e ervas queimadas. Incerto do que fazer por nunca ter fumado ficou um tempo só olhando o cachimbo, reparando como havia o desenho de pequenas rodas dos dois lados.

    -Tem certeza? É seu último fumo...

    -Eu já tive minhas histórias e viagens... – Julius deu um tapinha no ombro de Cristian e se levantou indo se deitar.

    Entre a gratidão e a incerteza Cristian acendeu o cachimbo, sentiu o cheiro do fumo lhe invadir os pulmões e o fazer sentir-se um tanto quanto leve. Sentia uma vontade maluca de sorrir, não apenas por ter ganho um presente, mas também por algo estar dizendo para seu cérebro que a vida era linda e ele era feliz. Levou o cachimbo à boca, a fumaça saindo e entrando, as estrelas brilhando no céu noturno. As fagulhas da fogueira realmente pareciam fadas.

    As chamas dançavam e as fadinhas também, dançavam tanto que Cristian imaginou que pudesse dançar com elas, com outro trago soprou a fumaça que também dançava, todos dançavam como as dançarinas da Boca do Ferlix. Deu risada de si mesmo, estirado na grama com o cachimbo na boca, os olhos verdes brilhando felizes como uma criança, prontos para pisar no mundo e dançar encima dele. Piscou por um momento e jurava que os astros no céu piscavam também, os sons da noite foram ficando mais baixos e tudo se agitou, risos, danças, passos na terra, cantoria alta!

    -Minhas viagens... – Murmurou com o cachimbo entre os dentes.

    Quando piscou de novo viu que o resto de fumo tinha acabado, a fumaça estava se dissipando tão rápido quanto subiu para seu cérebro, desapontado bateu o cachimbo entre os dentes, então sentiu uma mão em seu ombro, poderia ser sua mãe o mandando ir dormir, ou talvez Julius tivesse voltado. Pisou na realidade e ao olhar a origem da mão notou que seu redor estava mesmo mais barulhento e que a grama virara madeira.

    -Posso lhe ajudar senhor? – Uma ferlix perguntava com duas canecas de cerveja na mão livre.

    -Quem é você? – Cristian perguntou se levantando e notando que estava deitado encima de um balcão.

    -Quem é “você”, estranho?” – a ferlix perguntou o encarando ferozmente por trás de um sorriso de presas afiadas.

    -Cristian... Onde eu estou?

    -Na Boca do Ferlix... – ela apontou o redor, dançarinas, bêbados, homens jogando cartas, mesas que pareciam prestes a cedes e cadeiras com pelo menos uma perna quebrada.

    -Por Yaba que viagem... – Cristian levou as mãos a cabeça, como quem jurava ter adormecido na grama e estar sonhando, foi andando entre as mesas, até parar na frente de uma em especial e distraidamente pegar o cachimbo, será que era sonho... Olhava o cachimbo perdido.

    -Belo cachimbo... Foi Julius que lhe deu? – um bardo perguntou embaralhando algumas cartas velhas.

    -Desculpe, eu lhe conheço? – Cristian perguntou com uma dor de cabeça que só podia ser comparada a uma ressaca brava.

    -Não. Mas eu conheço meu cachimbo... – ele sorriu, com um sorriso brilhante e jovem que fez Cristian sentar-se desajeitadamente encima da mesa. – Surpreso?

    -Isso faz anos... Você....Você não devia ser mais velho? Claro que não, eu estou sonhando...hehehe... Sonhando... – Cristian estava dando aquelas risadas nervosas típicas de quem acaba de enlouquecer e isso só fez o Bardo sorrir gentil. – Prazer, senhor bardo... É uma honra sonhar com você...

    -Não se preocupe garoto, você se acostuma depois de algumas vezes... – O bardo se levantou e entregou para Cristian um pacotinho com algumas ervas dentro – Manera com isso, viu garoto? Fumar faz mal pra saúde...

    -Claro... Não se preocupe senhor, quando acordar eu vou lembrar disso... – Cristian riu apontando para o bardo, com o saquinho nas mãos, ele parecia tão borrado e surreal.

    -Se cuida, garoto... – o bardo se virou para a taverneira – Até mais, Celia...

    -Até, Yaba... – despediram-se.

    -Do que você chamou ele? – Cristian perguntou aos berros para a ferlix.

    -Garoto, se você bateu a cabeça devia ir à um curandeiro não pra taverna... – ela respondeu dando as costas.

    -Yaba...hehehe claro...Yaba... Eu queria estar sobre a grama fofa agora...

    Cristian continuou rindo nervosamente, seus olhos viraram nas órbitas e seu corpo caiu desmaiado no chão duro e sujo de madeira da taverna. A Boca do Ferlix era uma história, Yaba era um Deus...e ele... Ali caído no chão era só mais um bêbado, maluco... Cigano, vagabundo e ladrão, mais tarde ele se acostumaria ou enlouqueceria de vez e morreria na estrada.
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