Capítulo 1: O Toque da Praga

- Você não se lembra de mim, não é mesmo?

Perguntou a voz. Barbarossa olhava para os lados, tentando ver o dono da voz, mas a escuridão não o permitia enxergar nada. De repente, ele sentiu uma perturbação no ar a sua frente, como se alguma coisa tivesse passado por ali numa rapidez incrível. Desta vez ele sentiu o ar às suas costas se movimentando. Quando se virou, deu de cara com um rosto translúcido e perturbado, que emitia um leve brilho branco, assim como o resto de seu corpo fantasmagórico. Embora sua fisionomia estivesse alterada, ele reconheceu o rosto como sendo do homem que ele assassinara nas grades das prisões da Ilha de Ferro. O fantasma tinha uma gaita pendurada em seu ombro direito.

- É hora de você saldar a sua dívida para com o mundo dos mortos - esbravejou o fantasma de Lewellin, flutuando a pouco centímetros do chão e aproximando-se ainda mais de Barbarossa, com ambas as mãos em riste, preparadas para o ataque...

A lâmina atravessa completamente o corpo do espectro, como se ali não tivesse nada além de uma massa de ar. O fantasma solta uma risada debochada, e continua o movimento para o seu bote, mas o capitão mostrou destreza ao se esquivar dele. O fantasma volta a se virar pro seu alvo, desta vez com um maquiavélico olhar vermelho a encará-lo.

- Você não tem como escapar de mim! - urra o espectro, preparando-se para uma nova investida.

O capitão percebeu que havia uma grande diferença entre enfrentar um fantasma e enfrentar zumbis e esqueletos. O fantasma não podia ser golpeado por armas mundanas, e era isso que tornava tão assustador enfrentá-lo. Barbarossa abdicou de atacar para se defender, mas o fantasma ignorou suas defesas e sua mão trespassou o peito e o coração do capitão. O pirata não sentiu propriamente o toque do fantasma, pois ele era etéreo, mas sentiu um cansaço invadir o seu peito assim que o fantasma realizou o ataque preciso. O capitão começou a arfar, sentindo-se debilitado de alguma forma, como se o espectro tivesse lhe roubado a força.

- Sinta o toque da praga corroendo o seu coração! - bradou o fantasma. - Este toque o acompanhará até o resto de seus dias, e este é só o começo de seu infortúnio, hahahaha.

De repente a forma espectral do fantasma se desvaneceu, e tudo ficou novamente às escuras e em silêncio.

Alguns minutos se passaram até que a tripulação voltasse a si. Eles retornaram para os dormitórios, muitos deles com expressões confusas e envergonhadas sobre o que tinha acontecido. Uns nem sequer tinham coragem de encarar o seu capitão, que os observava com um olhar repugnante. O calishita Salih Hassam foi o único que teve coragem para dizer algo.

- O barco esta amaldiçoado, capitão, isto é fato. Primeiro o nosso vigia adoece, e agora um.. aquilo era um fantasma mesmo? - pergunta.

Neste momento, Hendrik surge descendo a escada da escotilha. Ele estivera dormindo em sua própria cabine, nos deques superiores, e não havia participado do tumulto que se acometera sobre todos.

- Que barulheira foi essa? Capitão, está precisando que eu ponha alguns marujos na linha?

Hendrik começa a ralhar com a tripulação enquanto Barbarossa retorna à sua cabine. O capitão sentia-se exausto, como se não comesse há dias. Depois de muito se revirar na cama, ele conseguiu adormecer e ter um sono tranquilo...

Porém, o dia seguinte começou com um novo desafio: passar pelos recifes para alcançar a ilha do oráculo. Throlf Barba Salgada estava receoso por seguir por um determinado curso, pois haviam rochedos submersos que poderiam atingir o casco do navio e soçobrá-lo. As águas ainda eram tomadas por uma camada de corais, dificultando a visão das pedras traiçoeiras. O anão resolveu desistir daquele curso, e tentou tomar um caminho alternativo pelo outro lado da ilha. Novamente, os corais e os rochedos mostravam-se um adversário difícil de ser superado, e já era quase de noite quando Throlf perdeu a paciência.

- Capitão, isso não estar tendo progresso. A ilha estar tão perto, e tão longe ao mesmo tempo. - De fato, eles conseguiam avistar a ilha a algumas centenas de metros, mas estava impossível de se chegar até lá. O anão continuou falando a Barbarossa. - Eu lembrar de uma história antiga sobre esse oráculo... As pessoas dizer que aquele que procura as respostas dever ir sozinho se encontrar com o Oráculo de Nasmen. Se levar alguém com você, você não encontrar nada na ilha além de árvores, montanhas e animais. Você dever ir sozinho até lá, capitão.

- Descer o bote, o capitão ir nele! - grita Throlf para os marujos, que por sua vez se movimentam para colocar o bote na água, enquanto Barbarossa vai até sua cabine pegar suas coisas e se preparar para a expedição que faria à ilha.

Ao retornar para o deque principal, ele é interpelado por seu imediato, Hendrik, que se oferece para remar o bote e levar o seu capitão em segurança até a praia. Sendo assim, os dois descem pela murada externa do navio e pulam para dentro do bote. Hendrik, com uma força equivalente a de um gigante, começa a remar, e eles logo alcançam a proximidade da ilha de Sumbar.

- É aqui que o deixo, capitão - disse Hendrik. - Boa sorte em sua procura pelo oráculo, estarei aguardando o seu retorno até a meia-noite.

Barbarossa desce do bote e inicia o seu caminho. Sumbar possuía uma cadeia de montanhas que precisariam ser submetidas. Ele avança por uma trilha de pedra - a única que havia - pela encosta de uma colina. A subida é cansativa e exaure ainda mais as forças do capitão, já debilitado pelo ataque do fantasma na noite anterior. Finalmente, ele alcança o topo da montanha e então percebe em seu caminho o primeiro obstáculo: uma ponte interligando a montanha em que ele estava a outra. A ponte era antiga e podre, com várias tábuas faltando ou quebradas, e a corda que a sustentava já estava bastante gasta e atrofiada. Barbarossa dá uma olhada para baixo e vê que a queda pelo precipício seria grande e certamente mortal.

Barbarossa prefere não arriscar e procura por uma outra rota. Porém, tudo o que ele consegue é perder tempo e cansar as pernas. Não havia outras pontes interligando as duas montanhas, nem outros caminhos visíveis que pudessem levar o velho capitão até o outro lado. Aquela ponte de madeira podre e antiga parecia ser a sua única opção.

Ao colocar o primeiro pé sobre a ponte, uma lasca de madeira podre se quebra e é levada pelo vento precipício abaixo. Barbarossa consegue manter-se equilibrado, e tenta novamente, pondo o pé em outro ponto. Desta vez a madeira não cede, e o capitão inicia a travessia, colocando o segundo pé e se segurando nas cordas laterais. Conforme avança, o capitão vê a ponte sob seus pés balançar, causando rapidamente um efeito de tontura. Apesar da sensação de mal estar por estar a uma altura de mais de duzentos pés e sem as minimas condições de segurança, Barbarossa conseguia calcular com cautela cada passo dado, proveniente de um esforço exaustivo.

A tensão trespassava pelo seu corpo e a ansiedade começou a bater em seu peito quando ele alcançou exatamente a metade do trajeto. Não faltava muito agora, e ele logo estaria do outro lado, são e salvo. A ansiedade para chegar ao outro lado fez com que ele se descuidasse por um segundo e uma tábua inteira se desprendeu da ponte. O capitão chegou a cair, mas os seus braços fortes se agarraram às cordas e o mantiveram seguro. Ele olhou para baixo e sentiu vontade de vomitar. Quando voltou seu rosto em direção à ponte, viu que do outro lado da ponte uma figura etérea bastante familiar havia surgido.

- Você não parece mais tão corajoso aí - diz o fantasma, com a voz habitual de Lew. O fantasma retira uma harpa e começa a dedilhar na ponta dos dedos um som fúnebre e melancólico, enquanto que ao mesmo tempo assiste os esforços do capitão para voltar a pisar na ponte com os dois pés.

{role um teste de Força}

Com uma força e determinação inabalável, o capitão conseguiu se pôr de pé novamente sobre à ponte. Ainda faltavam percorrer pelo menos 10 metros até alcançar o outro lado, que era onde o espectro de Lew tocava sua harpa. Barbarossa voltou a andar, mas logo estagnou ao ouvir um piado forte vindo dos céus. Uma ave de aspecto aterrador havia sido atraída para o local, talvez guiada pela canção do fantasma ou simplesmente pelo seu olfato apurado: a criatura tinha um corpo sinuoso e semelhante a de uma serpente, com um pescoço comprida e uma cauda mais longa ainda; dois pares de asas projetavam-se de seu corpo, um na parte inferior e outro par na parte superior; a ave-serpente ainda parecia ser revestida por escamas azuis que brilhavam com o brilho do sol; seu bico negro e serrilhado somado aos seus quatro olhos eram o que tinha de mais assustador em sua aparência voraz.

Seus quatro olhos sanguinários miraram uma investida em Barbarossa, mas antes o capitão viu a criatura abrir seu bico serrilhado e por ele lançar um raio carregado de energia elétrica  que por pouco não atinge o capitão. A criatura estava a nove metros de distância e só agora iniciava sua investida derradeira.

O capitão Barbarossa tinha duas escolhas: lutar em cima da ponte ou correr para longe dela e da criatura. Ele tentou a segunda opção, iniciando uma corrida desesperada para alcançar o outro lado e não tomando os cuidados necessários; logo quando ele pôs o segundo pé, a tábua em que ele pretendia se apoiar quebrou-se por completo, e o seu pé adentrou o buraco, fazendo o capitão se desequilibrar por inteiro. Ele tentou se agarrar às cordas laterais, mas elas escaparam-lhe por entre seus dedos, e o corpo de Barbarossa lançou-se para fora da ponte; contudo, num ato instintivo e de puro reflexo, ele entrançou a sua segunda perna - aquela que não havia pisado em falso - em uma tábua firme e conseguiu manter-se suspenso no ar, mas o seu mundo estava todo de cabeça para baixo.

Ele conseguia ver a correnteza de um rio lá abaixo do precipício, a muios metros de distância; se ele tivesse caído, teria sido um mergulho direto para as profundezas obscuras da morte. E não dava tempo nem para ele comemorar a sua sorte, pois ainda havia uma ave horripilante e faminta atrás dele. A queda abrupta de Barbarossa havia freado a investida da criatura, mas ela agora dava a volta e se posicionava num novo ângulo, pronta para abocanhar a sua presa. Não restava tempo para o capitão tentar voltar a ficar de pé sobre a ponte; ele teria que arriscar uma luta ali, suspenso de cabeça pra baixo e apoiado apenas numa de suas pernas.