Abraço da Paz - Remy Hyrrule

- Erika, você sabe com quem podemos falar quando chegarmos no hotel? - Perguntou para Chang, quebrando o silêncio. Presumia que, por ela ser de posto mais alto, teria uma noção melhor da onde estavam se metendo - Vocês têm algum contato com os parentes de lá. Pelo o que Justo-Conselheiro disse, acho que será uma parada rápida para seguirmos para House on Lost Lagoon, né? Vocês acham que devemos pedir a gentileza de um parente deles nos acompanhar?

Elena disse:

- Acredito que os Presas de Prata tenham colocado seus Parentes em posições-chave para essa crise. Não conheço pessoalmente nenhum deles, mas não deve ser difícil passar a mensagem certa para eles entenderem.

Erika ajuntou:

- Provavelmente os Parentes vão nos escoltar até os anciões. Como somos enviados diplomáticos, devemos seguir os protocolos de segurança que eles impuserem...

- Olá, Layla! Meu nome é Remy e essas são minhas colegas, Elena e Erica - Apresentou-se, com um tom simpático. Colocou as mãos no bolso, em um movimento involuntário de timidez - Viemos do outro extremo da província. Estamos aqui para tratar sobre a questão do pacto. Poderia nos levar até seu superior, por favor?

Remy percebeu apenas o mais leve sobressalto na recepcionista, que escondeu muito bem qualquer outro sinal de surpresa.

- São garous, certo? A quem devo anunciar? Nomes completos, de tribo, por favor.

Após a confirmação deles, Layla anotou as informações e fez um telefonema, falando sem que eles pudessem ouvir. Ao terminar, ela fez um sinal para uma outra recepcionista ficar em seu lugar e dirigiu-se ao trio:

- Por favor, me acompanhem.

Ela os levou para uma saída lateral do hotel e depois para fora, margeando o lago e passando por baixo da ponte até um local de aparência bucólica e histórica, a House on Lost Lagoon.

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Ela entrou no corredor que margeava a água e abriu a porta da Nature House, um local com uma exposição permanente e variável sobre o meio ambiente local.

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Embora a placa na entrada anunciasse que o local estava fechado, eles encontraram mais de 20 pessoas lá dentro. Até Remy era capaz de dizer que eram garous, e de várias tribos diferentes. Todos com postos acima do dele. Todos os olhares convergiram para o trio recém-chegado.

Mas Layla atravessou o salão ignorando todos até um homem no centro da sala.

Montgomery Abercorn era uma figura dominante. Com cerca de 1,80m, seu corpo esguio o fazia parecer ainda mais alto. Mesmo que seu rosto e mãos mostrassem que ele estava na casa dos 70 anos, ele se movia como se fosse duas décadas mais jovem. As feições eram finamente esculpidas, com um nariz aristocrático e maçãs do rosto salientes. Sob suas sobrancelhas grossas, seus olhos escuros brilhavam como obsidiana. Ele usava um terno caro de corte europeu e se parecia com o arquétipo do aristocrata inglês. Mas Remy pôde reparar no brilho de inteligência e determinação em seus olhos com um quê de frenesi e ansiedade.

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- Muito bem, sua presença foi admitida nesse conselho de guerra. Apresentem-se e declarem o motivo de sua vinda.

- É... - Começou a gaguejar - Nós - Pigarreou - Viemos do outro lado e...missão diplomática - Respirou fundo uma, duas, três vezes e recomeçou - Senhor, eu sou Abraço-da-Paz, philodox e cliath, dos Filhos de Gaia. Essas são Estrela Dançarina, galliard fostern e Esperança de Paz... - Remy então se deu conta que não sabia o augurio de Érica, não vendo outra saída a não ser olhar para ela, a fim que terminasse a fala.

Érica entendeu a hesitação de Remy e acrescentou:

- Ragabash cliath! Ao seu dispôr!

O sorriso aberto e simpático da menina alta e magrela pareceu destoar completamente do ambiente tenso e pesado que a audiência tinha, mas ela não pareceu se importar. 

- Somos emissários dos Filhos de Gaia que se encontram aqui na Colúmbia Britânica. Viemos até o senhor com anuência da Voz da Deusa e do Braço da Deusa para... - Remy não conseguiu encontrar as palavras para dizer que o trio estava ali para tentar sucesso onde eles falharam, de forma que concluiu - Para saber se podemos ajudar de alguma forma a restaurar o pacto.

Abercorn levantou uma sobrancelha e comentou:

- Ora, vejam só! Sua tribo finalmente abandonou a neutralidade? O Pacto permanece, e as ameaças desses rebeldes não vão comprometê-lo. Se vocês querem ajudar, por que não vieram todos para cá? A melhor forma de acabar com esse impasse é esmagar os dissidentes. Estão prontos para tomar parte nisso?

- Senhor, antes de nos manifestarmos se tomaremos parte nisso ou não, se importa de conversarmos em particular?

Abercorn negou rapidamente com a cabeça.

- Estamos num conselho de guerra, e todos os que aqui estão têm o mesmo valor. Qualquer coisa que discutirmos será feito na presença de todos. Prossiga.

Os olhos dele se fixaram na face de Remy, que também sentia todos os olhares da sala cravados nele. Ao lado dele, Erika e Elena mantinham-se como apoiadoras, embora fosse sentir no ar que elas também estavam intimidadas naquele ambiente.

Remy falou tudo que queria sem ser interrompido, com um silêncio pesado pontuando cada pausa das palavras dele.

Quando ele terminou, Montgomery começou a falar pausadamente, pronunciando cada palavra com exatidão no seu sotaque britânico.

- Acho que sua tribo se mostrará útil usando vocês como emissários aos rebelados. Portanto, vou lhes esclarecer algumas coisas. Ouçam bem.

O ancião disse:

- Os motivos que levaram à criação do Pacto com os vampiros foram o desmatamento contínuo das florestas nos arredores de Vancouver e a ameaça iminente ao Grande Caern do Stanley Park. Para cumprir os mandamentos da Litania de Não violar nenhum caern e Combater a Wyrm onde ela estiver e sempre que proliferar, fizemos esse acordo. Ficou decidido  que nossas ações nos limites urbanos de Vancouver seriam sempre não-violentas em troca de acesso garantido e exclusivo ao Stanley Park, preservação de padrões de reflorestamento e preservação das florestas já existentes e o direito de exterminar quaisquer vampiros em áreas selvagens reunidos ou viajando acima de dois. Os vampiros concordaram em não criar nenhum novo vampiro dentro de Vancouver, o que proteger nossos Parentes e impede que eles se proliferem além do controle. Qualquer ataque aa vampiros dentro da cidade violará esse Pacto, o que nos obrigaria a caçar o infrator para justiçar esses desvios.

Abercorn passou metodicamente a um segundo ponto:

- O Pacto das tribos de Vancouver criou a atual organização dos garous aqui, que é diferente de outros lugares. O Conselho é composto de 13 representantes, um de cada tribo, e todas as decisões são tomadas democraticamente por maioria de votos. Essas decisões tomadas no Conselho deveriam ser obedecidas por todas as seitas na região da Grande Vancouver. Mas alguns anciãos, da minha tribo e de outras, divergiram de várias decisões recentes do Conselho, e mesmo sendo minoria em suas próprias tribos, decidiram atacar o Pacto e derrubá-lo. Mesmo que eles sejam superiores em suas próprias seitas, eles não tem o direito de romper o Pacto que outros garous ainda respeitam.

Montgomery se tornou menos professoral e sua voz adotou um tom mais direto e ameaçador:

- Nunca antes foi necessário lutar para manter o Pacto, nenhuma vez nos últimos 30 anos. Não deveríamos gastar energia para proteger os vampiros, pois além de nossa própria ação violenta, mesmo que defensiva, ser uma violação dos termos do acordo, nós nem sequer sabemos onde estão todos os vampiros dessa cidade. Como vocês irão até os rebelados, devem informar-lhes o seguinte: Como não podemos evitar que eles ataquem os vampiros em qualquer lugar dessa cidade, nós faremos um ataque preventivo contra os líderes desses insurgentes, até que aprendam a obedecer a Litania e a não desafiar seus líderes! Eles tem apenas mais uma noite para se renderem e voltarem à paz do Pacto. Podem ir agora, e fiquem longe do território deles na noite de amanhã! 

A licença foi concedida, e Remy virou-se para sair. Elena assentiu e seguiu Remy, mas Érica fez uma mesura de bailarina para os Presas de Prata antes de se retirar. A recepcionista Layla os acompanhou de volta à frente do hotel, onde despediu-se com brevidade formal. 

Já de volta ao carro, o trio de Filhos de Gaia pôde conversar.

Remy escreveu:- Ele pareceu...sensato? - Olhou para Elena e Erika quando já estavam de volta no carro da theurge - Eu compreendo o raciocínio dele. Ele acha que a forma de evitar derramamento de sangue inocente é cortar o mal pela raiz. Mas toda história tem dois lados. Vamos até o centro comunitário.

Érica acomodou-se no banco de trás, deixando Remy no banco do passageiro. A ragabash disse:

- Presa de prata sensato? Não mesmo! Você notou o jeito dele falar? Ele tem uma coisa meio megalomaníaca, uma tendência de manter as coisas como estão não porque são boas, mas porque estão sob o controle dele, seja o que forem.

Enquanto ligava o carro e procurava entrar no trânsito de Vancouver, Elena comentou:

- Érica não está de todo errada. Em outros lugares, as seitas são lideradas por conselho de anciões, e um Grande Ancião é a figura de poder central, o que o torna também alvo de desafios quando alguém discordar dele. Mas no Pacto das tribos aqui em Vancouver, eles criaram o Conselho das tribos, com cada tribo indicando um representante para falar em seu nome nesse parlamento. A decisão é tomada sempre pela maioria, o que acaba abafando qualquer voz discordante. Não sei muito sobre as discussões políticas internas desse conselho, mas imagino que não deve ser difícil para um presa de prata como Abercorn negociar para ter maioria e assim manter o status quo que ele prefere... De qualquer forma, o outro lado deve ter muito a falar sobre isso.

O trajeto de carro entre a House on Lost Lagoon e o Lions Gate Community Recreation Center em North Vancouver oferecia um passeio turístico espetacular com muitos elementos paisagísticos e panorâmicos que tornavam a viagem memorável. A jornada começava dentro do majestoso Stanley Park, um oásis verde no coração da cidade de Vancouver. Ali a Wyld era forte e mesmo os três cliaths percebiam a proximidade do Grande Caern, o mais poderoso de Vancouvder. Enquanto eles saíam do parque, tinham vistas deslumbrantes das árvores centenárias, das trilhas cênicas e, claro, do Lost Lagoon, um refúgio de aves aquáticas e vida selvagem.

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À medida que se afastavam do Stanley Park, seguiam pela West Georgia Street, que era cercada por arranha-céus imponentes e arquitetura impressionante. A rua era uma fusão de natureza e urbanidade, com muitas árvores alinhando as calçadas. Os garous viam uma cidade amigável à vida natural, e um Andarilho do Asfalto sentiria-se deliciado naquele ambiente.

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Quando se aproximaram da Lions Gate Bridge, foram recebidos por vistas espetaculares de Burrard Inlet, uma entrada de água majestosa cercada por montanhas e litoral pitoresco. A própria ponte era uma estrutura de tirar o fôlego, com suas torres altas e cabos suspensos.

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Enquanto cruzavam a Lions Gate Bridge, podiam apreciar as vistas panorâmicas de Vancouver, incluindo o horizonte da cidade, as águas cintilantes do Burrard Inlet e as majestosas Montanhas North Shore ao fundo.

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Após a travessia da ponte, eles chegaram a North Vancouver. Aqui, o cenário mudava para uma paisagem mais suburbana, com montanhas cobertas de floresta exuberante ao redor. À medida que se aproximavam do Lions Gate Community Recreation Center, podiam notar as montanhas, as trilhas para caminhadas e os parques naturais que davam à área seu charme característico.

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O Lions Gate Community Recreation Center estava localizado perto do Parque Capilano, famoso por seu incrível Parque Suspenso de Capilano, onde se pode caminhar em passarelas suspensas entre as copas das árvores em uma floresta temperada tropical.

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Na viagem,  eles experimentaram uma transição fascinante da natureza exuberante do Stanley Park para a paisagem urbana de Vancouver, antes de chegar a North Vancouver, onde a beleza natural das montanhas e da floresta era uma parte integrante da experiência. Este trajeto fôra repleto de oportunidades para fotos espetaculares e era uma excelente maneira de explorar a rica paisagem natural e urbana que Vancouver tem a oferecer. 

Mas o objetivo dos Filhos de Gaia naquele dia era outro.

O Centro de Recreação Comunitária Lions Gate (LGCRC) oferece uma variedade de recreação, educação, artes e cultura e programas sociais nesta nova instalação operada pela North Vancouver Recreation & Culture, com serviços comunitários adicionais fornecidos pela Sociedade de Serviços Comunitários Capilano  e Biblioteca Pública do Distrito de North Vancouver.

Na portaria, uma mulher de meia-idade de aparente etnia nativo-americana com cabelos longos e negros que fluíam como um riacho. Seus olhos castanhos brilhavam com sabedoria e compaixão, refletindo sua conexão com a natureza. Ela tinha uma presença calma e tranquilizadora que atraia as pessoas ao seu redor. Ela usava um crachá onde se lia o nome Luna Riverwind.

Ela virou-se para o trio e seus elaborados brincos artesanais brilharam, e ela pareceu surpreender-se. Mantendo a compostura, ela indagou:

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- Filhos de Gaia? Vieram falar com os anciãos?


O jogo de palavras era um bom disfarce para os humanos normais, embora ela falasse de modo bastante direto com os garous.

Elena e Erica não questionaram as impressões de Remy, pois tanto as opiniões delas quanto as dele eram percepções pessoais, e os Filhos de Gaia tinham por hábito respeitar o pensamento do outro.

Elas o seguiram quando ele foi falar com  Luna Riverwind.

- Oi. Eu sou Remy e essas são Erica e Elena - Diferentemente de Layla e, principalmente, de Abercorn, a presença da indígena transmitia uma sensação que deixou Remy confortável - Nós estamos aqui para falar com os anciãos, por favor.

Ela sorriu e respondeu:

-  Já os esperávamos. Aguardem um minuto. Eu vou fazer uma ligação e já volto para falar com vocês.

Ela se afastou e pegou um telefone, discou um número e conversou por algum tempo com alguém antes de desligar e retornar para falar com Remy e suas companheiras.

- Escutem com atenção. Vocês devem ir ao restaurante do Hotel Wolfwood e pedir pela mesa 16. O maítre lhes perguntará o que desejam e vocês devem responder que vieram provar o prato da Salvação de Gaia. Ele vai lhes dizer que vocês são familiares e que poderiam ser Parentes dele. Aí vocês respondem que são Filhos da mesma Mãe. Depois disso vocês esperam até que os anciãos se juntem a vocês. Entenderam?

As instruções eram bem específicas e mostravam um cuidado cauteloso dos anciãos daquele lado. Restava a Remy seguir as regras dispostas.

O Hotel Wolfwood ficava bem no interior de North Vancouver, à beira de um lago cercado de montanhas. Já estava anoitecendo quando Remy chegou ali.

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O enorme hotel construído em madeira brilhante também oferecia serviços de spa mediante reserva, mas o acesso ao restaurante Wolfwood era feito de maneira separada e recebia clientes que não precisavam estar hospedados no hotel. Logo na entrada, um enorme lobo entalhado em madeira sob um tronco recebia os visitantes, cercado por um círculo de fogueira que dava um aspecto majestoso e bonito.

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A localização era esplêndida, com uma vista magnífica para o lago. Podia-se pegar mesas tanto do lado de dentro quanto de fora, mas a mesa 16 estava no canto mais recôndito do terraço. 

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Assim que cumpriram os passos dispostos para o encontro, Remy, Elena e Erica tiveram de aguardar alguns minutos até que a parte externa do restaurante fosse fechada para outros clientes e duas pessoas viessem até a mesa deles.

Eram um rapaz e uma moça, tão parecidos que poderia se dizer com muita certeza que eram irmãos. Eles eram bonitos, mas havia mais do que beleza neles, e Remy percebeu a Raça Pura forte que possuíam.

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O homem sentou-se silenciosamente e fitou os três Filhos de Gaia de modo penetrante, um de cada vez, sem pressa. Ao fim, assentiu para a moça, que começou a falar numa voz agradável e melodiosa:

- Sejam bem-vindos, Filhos de Gaia! Meu nome é Victoria Corte-Real, galliard athro dos Presas de Prata, que me chamam de Uivo de Prata. Este é meu irmão Victor Juízo de Prata, phillodox athro de nossa tribo. Estamos autorizados a negociar com vocês. Vieram falar sobre o impasse com Abercorn e seus apoiadores, não? Pois falem à vontade, estamos aqui para ouvi-los.

- Sei que existem desentendimentos que precisam ser resolvidos, e nossa intenção não é fomentar conflitos, mas tentar encontrar uma solução que mantenha uma relativa harmonia. Então gostaríamos de ouvir as preocupações de vocês e compreender suas perspectivas.

Victoria Corte-Real olhou para seu irmão Victor, que acenou positivamente com a cabeça num movimento mínimo de concordância.

Ela então tomou a palavra:

- O que eu vou lhes dizer já foi dito aos representantes do Conselho das Tribos, mas talvez essas informações não tenham chegado a vocês. Desde a chegada dos primeiros colonizadores, o Grande Caern no que hoje é o Park Stanley ficou muito próximo do centro das cidades humanas. Os Wendigo e Uktena, guardiões originais do caern, queriam expulsar ou chacinar os colonos, mas as outras tribos se impuseram, tentaram mediar uma paz e por fim foram acuados pelos vampiros e as madeireiras sob seu controle. O Pacto acertado entre o Príncipe dos vampiros e Abercorn dispõe que a ação das madeireiras deveria seguir leis rígidas para impedir o desflorestamento desenfreado, e isso tem sido cumprido até certo ponto. Porém...

Victoria parou para respirar pensativamente antes de continuar:

- Nosso acesso ao Grande Caern continuou garantido, mesmo com a cidade de Vancouver tão perto e em franco crescimento. Mas o centro da cidade ainda está muito perto da divisa do caern, e os theurges dos uktenas detectaram recentemente uma mancha de corrupção da Wyrm na Penumbra próxima da divisa. Como sabe, um dos maiores mandamentos da Litania é "Não tomar nenhuma ação que viole um caern". Esse assunto foi levado ao Conselho das Tribos, mas foi recusado fazer qualquer ação que desrespeitasse o Pacto com os vampiros, o que inclui agirmos dentro da área urbana. E aqui talvez eu precise explicar um pouco da política garou a vocês.

A galliard presa de prata falou mais lenta e didaticamente aos três Filhos de Gaia:

- O Conselho das Tribos é formado por 13 representantes, um de cada tribo presente em Vancouver, e as decisões são tomadas por maioria simples. Isso difere do que é feito tradicionalmente no resto do mundo inteiro, onde um Conselho de Anciãos responde por uma seita e pode-se desafiar pela liderança da seita, até mesmo por combate, e essa mudança de poder ocorrer instantaneamente. No Conselho, como num parlamento humano, quem conseguir influenciar a maioria detém o poder para acionar ou vetar qualquer ação. E politicamente, Abercorn é muito forte, tanto dentro da tribo dos Presas de Prata quanto entre outras tribos. O que ele tem feito nos últimos dez ou vinte anos é basicamente bloquear qualquer ação dos descontentes, deixando os garous inertes perante ameaças que estão crescendo em Vancouver sem serem sequer investigadas. Nós somos parte desses descontentes, e finalmente articulamos uma frente unida com outras tribos para fazer o que deve ser feito. 

Agora o tom dela era mais exultante, quase triunfante:

- Não reconhecemos mais a autoridade desse conselho manipulado pelo Abercorn, e vamos fazer o que for necessário para proteger o Grande Caern. Se forem os vampiros que estiverem por trás disso, então vamos matar os que estiverem envolvidos, e dizer ao Príncipe deles que estão passando dos limites. Se for outra coisa da Wyrm, vamos "Combater onde ela estiver e sempre que proliferar". E se algum garou leal a Abercorn ficar em nosso caminho, vamos combatê-lo como traidor de Gaia.

Victor falou pela primeira vez, com uma voz profunda e ponderada:

- Vocês já falaram com Abercorn. Já sabem que ele não vai abrir mão do poder dele, e por isso não vai recuar de sua obstinação. Não há mais negociação possível. Os Filhos de Gaia já ficaram neutros por tempo demais. Quando chegar a hora, qual será a posição de sua tribo?

- A mancha de corrupção da Wyrm próxima do Caern de fato é um motivo para preocupação. Contudo, pelo o que compreendi, ainda não existem elementos suficientes para concluir que se trata de uma ação dos cainitias. Sei que o pacto proíbe uma ação direta dentro da área urbana, o que dificulta uma investigação mais apurada. No entanto, devem existir outras formas de tomar conhecimento sobre sua origem. Vocês já levantaram e discutiram essas possibilidades?

Remy estava usando o máximo de prudência para discutir a questão, mas era bem difícil discutir com dois presas de preta com uma raça pura tão alta.

Victor suspirou profundamente, mas Victoria respondeu:

- Os vampiros são uma preocupação secundária, mas o pacto com eles é o principal empecilho para descobrirmos o que está ameaçando o Grande Caern. Pelas regras do pacto, qualquer atividade garou fora do Parque Stanley é considerada uma violação. Nossos theurges e ragabashes, nossos phillodoxes e ahrouns, nenhum deles pode fazer mais do que já fez sem quebrar essas regras velhas. Se há décadas elas eram úteis, hoje elas são obstáculos que só nos atrapalham. Não vamos mais tolerar isso, temos que agir.

Victor falou novamente com sua voz profunda:

- Você não respondeu minha pergunta, o que já é por si só uma resposta. Deduzo que sua tribo decidiu pela manutenção do pacto. Vocês, Filhos de Gaia, não são nossos alvos principais, mas se ficarem no nosso caminho, serão considerados transgressores da verdadeira lei dos garous, a Litania, e serão considerados como tais. É melhor ficarem longe do grupo de Abercorn.

O phillodox presa de prata se levantou e se afastou, sumindo por uma porta que levava ao hotel.

Victoria ainda ficou para trás e disse:

- Não sei se vocês e o resto dos garous que apoia Abercorn estão desinformados, se tem laços de lealdade com ele ou se são apenas covardes. Gostaria de ter tempo para convencer cada um de vocês, um por um, mas não temos nenhum segundo a perder. Há uma ameaça crescente a um caern de Gaia e nós vamos agir para protegê-lo.

Victoria Côrte Real sorriu para Remy com condescendência:

- Você não sabe muito sobre vampiros, não é mesmo?

Ela cruzou uma perna torneada sobre a outra e alongou suas costas contra a cadeira, falando despreocupadamente:

- Os vampiros sofreram durante a Inquisição da Idade Média, e desde então eles ocultam sua presença da humanidade. Nós garous causamos o efeito do Véu e a lei da Litania nos impõem um sigilo semelhante. Tudo isso me faz duvidar que os sanguessugas façam uma guerra aberta nas ruas de Vancouver. Se eles forem a principal fonte das emanações da Wyrm, exterminaremos todos os que estiverem envolvidos. Mas se alguns humanos forem pegos no fogo-cruzado, isso não nos assombrará. Ao contrário do que os Filhos de Gaia pensam, os garous não são defensores dos humanos, mas sim de Gaia.

Ela levantou-se para se retirar.

- Não permaneçam aqui mais do que o necessário. Este negócio da minha família  têm sido lucrativo há anos, e não queremos comprometer essa bem-sucedida fachada para nossas atividades garous.


Ela seguiu pela mesma passagem que seu irmão usara.

Com a partida dela, Elena comentou, ironicamente:


- Presas de prata, encantadores, como sempre!


Erika pareceu não entende a piada e exclamou:


- Tá brincando? Eu tava quase tremendo de medo só de falar com eles! Esses caras, além de raça pura, têm postos altos! Poderiam esmagar a gente sem esforço!

Elena bufou e disse:


- Era uma ironia, Elena! E então, Remy, o que faremos agora?
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