O Jogo dos Tronos - A Patrulha da Noite

O machado era erguido e descia com força. As mãos de Eyvon, firmes, mal sentiam o impacto quando as toras de madeira eram partidas, desprendendo-se uma da outra com violência. O frio, o maldito e onipresente frio, era afugentado a cada golpe, mas insistia em retornar, intercalando seu gélido beijo entre o subir e descer da ferramenta.

- …

Seguiu dessa forma até que dissessem ser suficiente. Durante toda sua vida havia sido assim: um militar disciplinado. Moldado pelo pai, pelos Drinkwater ou mesmo pelos Dyeend e Dayne. Não importava. Esculpido para cumprir ordens.


Nas lutas, não intimidou-se pelo ambiente hostil ou por adversários que não conhecia e mesmo brandindo uma simples espada de madeira, conseguiu não só ser superior aos demais recrutas como também parecia saber manuseá-la tão bem quanto se fosse de aço. Era um atleta nato. Técnica e força eram empreendidas, derrubando qualquer um que se colocasse à sua frente. Não com o furor de antes, pois não era seu desejo machucar ninguém ali, mas não deteve nenhum golpe contra nenhum de seus adversários.


O arco e flecha, por outro lado, poderia ser uma dificuldade. Tinha a noção da arma mas, não necessariamente, a técnica necessária para ter um boa pontaria. Ainda assim, Eyvon mostrou competência em cada um dos disparos que realizou,


Eyvon havia demonstrado sua força e sua técnica em cada uma das provas. Sentia o cansaço acumular-se em seu corpo. Estava ligeiramente ofegante. No entanto, sua postura firme e focada parecia intocável em relação a alguns dos outros recrutas. Ele sabia que sua performance havia sido notável, mas mantinha seu semblante fechado e distante. Não se tratava de vanglória para ele; não era o que buscava ali. Havia sido calejado por desafios muito maiores em sua vida, e os testes ali, embora difíceis, pareciam apenas mais um passo em seu caminho.

Observou, com certa curiosidade disfarçada, os êxitos de Daemon nas provas de força e luta. Sabia que o rapaz, com o tempo, poderia se tornar um excelente guerreiro. Talvez, se não estivesse condenado àquele inferno gelado, poderia ter sido um bom cavaleiro, ou ao menos um competente escudeiro. Sua mente, no entanto, não deteve-se muito tempo nessas reflexões.
Ajeitando suas luvas após a última prova, observou Harkon, em cima de seu feroz urso, que reunia os recrutas através de sua forte e imponente voz.

Sandinus escreveu:"Vocês, todos, deram o que tinham. Mas aqui, na Muralha, dar o que se tem nem sempre é suficiente. O que conta é quem pode continuar dando quando não resta mais nada dentro de si. E eu vi isso, vi claramente quem vocês são."

Em seguida, Harkon o encarou.

Sandinus escreveu: "Eyvon, você é como a lâmina de um machado afiada e implacável. Não há obstáculo que você não supere, e sua força é inegável. No campo de batalha, precisamos de guerreiros que liderem pelo exemplo, que inspirem os outros. E você, recruta, faz isso. Você será o machado que abriremos caminho quando não houver outro caminho a seguir."

Ele não era um líder. Ao menos, não se via assim. Não era um exemplo a ser seguido ou um homem pelo qual outros deviam se inspirar. Seu silêncio indicava sua concentração, mas, por mais que tivesse mostrado eficiência e força e Harkon fizesse questão de salientar sua valências, seu olho esquerdo, o único que ainda lhe restava, não guardava qualquer brilho de admiração que outros talvez esperassem. Sua apatia era um retrato de sua queda. Não estava ali pela glória ou reconhecimento. Afinal, o que lhe restava? Talvez nem mesmo ele soubesse…

Jeor Mormont. O Lorde Comandante. Diferente de Thorne e Harkon, ele detinha uma autoridade que lhe parecia natural. Sua postura indicava uma experiência que os outros não pareciam ter. Era alguém talhado para estar ali. Preparado para comandar e aceitar as consequências e fardos de sua posição. Eyvon o olhou com uma discreta admiração.

Alexyus escreveu:

- Vocês foram aprovados para se tornarem irmãos da Patrulha da Noite. A noite se aproxima e sua vigília começará, e ela não terminará até sua morte. Vocês não tomarão esposas, não terão terras, e nem gerarão filhos. Não usarão coroas e não conquistarão glórias. Viverão e morrerão no seu posto. Serão a espada na escuridão. Serão o vigia nas muralhas. Serão o escudo que guarda o reino dos homens. Prometerão sua vida e sua honra à Patrulha da Noite, por esta noite e por todas as noites que virão. Este é o juramento que farão. Vocês devem se preparar para fazer seu juramento esta noite.

As palavras do Lorde Comandante eram duras. Deviam abrir mão de suas vidas, em outras palavras. Não haveria legado a ser deixado, a não ser seus ossos em mortalhas negras cobertos pela neve.

Alexyus escreveu:

- Aqueles de vocês que veneram os Sete Deuses dos ândalos farão sua vigília no septo de Castelo Negro e farão seu juramento diante do altar deles, guiados por Sor Alliser Thorne. Os que crêem nos Deuses Antigos acompanharão Harkon esta noite até os nove represeiros da Floresta Assombrada onde farão sua vigília e dirão seus votos. Para a maioria de vocês, essa é a oportunidade de continuar vivendo como Irmãos da Patrulha da Noite. Para os poucos de vocês que têm a escolha, esta será sua última oportunidade de recusar essa honra e voltar a viver sob o sol quente do do sul como aqueles que não são fortes o bastante para carregar esse fardo. Aprontem-se para iniciar sua vigília ao pôr do sol!

Não se livraria de Thorne tão cedo, pelo visto. Embora fosse um adepto d’Os Sete, Eyvon nunca fora um religioso do tipo adorador ou temente. A espada e o aço, e por consequência O Guerreiro, eram os quais tinha mais afinidade, de fato. Ele se lembrou do pai, um homem não tão devoto, mas que que lhe ensinara desde cedo os valores de honra e justiça que o Guerreiro representava. Embora Eyvon sempre tivesse sentido que não pertencia completamente àqueles ensinamentos, as doutrinações de seu pai ecoavam em sua mente como grilhões. A imagem do Guerreiro, o aspecto dos Sete que simbolizava a força e a bravura, pareciam acenar para ele naquele momento. Seu pai havia forçado o filho a seguir o caminho da cavalaria, e agora, apesar de todo o ressentimento que Eyvon ainda carregava, havia um desejo de prestar um último tributo à memória de um homem que, apesar de tudo, sempre buscou moldá-lo para ser forte.

- Farei meu juramento no Septo. - anunciou ele com a voz firme.

Talvez aquilo pudesse fazê-lo reencontrar algum pedaço do homem que foi antes de ser transformado pelas circunstâncias. Ou talvez aquela fosse sua chance, a última, de se libertar. De traçar um novo caminho a partir daquele juramento. De abrir mão do que foi e do que era. Do que havia sido construído para ser. De enterrar demônios e esquecer o passado.

- …

Enquanto se afastava para se preparar, sentiu o peso de sua escolha. Não era uma questão de fé, mas de identidade. Ele não era um devoto fervoroso, mas algo naquela velha tradição parecia ser o caminho certo para finalmente aceitar seu destino. Não haveria glórias, nem coroas, nem filhos para ele. A vida que conhecera estava atrás dele, como as ruínas de um castelo esquecido.
Como Dorne.
Como Alto Ermitério.