#Capítulo 02 - Pesadelo

Após serem atingidos pelo movimento desajeitado da criatura grotesca, os investigadores se levantam rapidamente buscando prosseguir sua descida sem perder tempo. Selene utiliza um de seus feitiços para acelerar sua recuperação enquanto Lanthys segue na frente, logo avistando o grande corpo da fera que enfrentavam instantes atrás, por muito pouco não tropeçando no mesmo devido a pressa em seguir pelos degraus em meio à ,não sendo acompanhado imediatamente pela sacerdotisa que ainda conjurava seu feitiço...

A criatura estava apenas quatro degraus abaixo e tinha seu crânio torcido ao contrário, o que indicava que muito provavelmente havia quebrado o pescoço durante a queda. Seus três membros restantes ainda esboçaram pequenos espasmos, mas já não parecia haver vida nos olhos da fera. Apesar do sangue negro que escorria através dos ferimentos causados pela amputação de seu membro superior esquerdo e o corte na lateral de seu pescoço se misturarem com a rocha negra que formava a escadaria, o forte odor nauseante incomodava os investigadores que se viam obrigados a deixar o local o quanto antes, continuando sua busca.


Prosseguindo pelos degraus ciclópicos que serpenteavam a estrutura rochosa da torre sem nenhum sinal de encontrarem o que procuram, os investigadores perdem completamente a noção do tempo que se passa durante sua descida. Selene tem de refazer seu feitiço de iluminação em diversos momentos, no entanto, a sacerdotisa não se recorda exatamente quantas vezes o faz.

Após muito prosseguirem os investigadores notam uma baixa luminosidade a algumas dezenas de metros a frente, logo notando que a escadaria terminava em um imenso salão que aparentava ocupar apenas uma pequena fração do diâmetro total da torre que misteriosamente parecia ser bem mais larga do que o cogitado anteriormente. O salão era parcialmente iluminado por uma fraca luminosidade que adentrava no mesmo através dos grandes portões negros que se encontravam ligeiramente entreabertos. Os massivos portões de aço negro deviam possuir cerca de oito metros de altura, possuindo alguns símbolos misteriosos gravados nos mesmos, o maior destes no formato de um retângulo do qual escapavam quatro linhas verticais na parte superior, cada uma destas terminando em um pequeno círculo, ao centro do retângulo havia também a representação de um olho aberto e ainda um pequeno traço diagonal na ponta inferior esquerda. Ou seja, símbolo era bastante semelhante ao avistado na placa de pedra que fechava a passagem para o submundo, estando apenas um pouco mais detalhado talvez devido a condição precária em que se encontra a placa rochosa.

Além dos portões metálicos que aparentavam dar passagem para o lado externo da torre, no interior do salão que possuía mais de dez metros de altura, os investigadores avistam diversos fragmentos de ossos em pedaços, rochas esmigalhadas e estranhos símbolos gravados nas paredes e no solo rochoso. Havia também uma abertura na parede contrária aos portões metálicos, no entanto, a passagem estava parcialmente bloqueada por pedaços de rocha negra que aparentemente haviam se destacado da própria estrutura,  provavelmente devido a algum abalo estrutural. Por entre as rochas dava pra se observar que a passagem se tratava de um corredor que dava acesso a um segundo salão, o qual não se podia mensurar de imediato.

Após adentrarem no salão, Selene toma iniciativa e utiliza um de seus feitiços para restaurar a vitalidade do colega, o efeito curativo é mais efetivo do que o esperado pela sacerdotisa, fazendo com que alguma escoriações no corpo do cavaleiro desapareçam de imediato.

Lanthys, por sua vez, analisa rapidamente as rochas que bloqueavam a passagem e decide tentar abrir caminho. O cavaleiro tem de escalar algumas das rochas para alcançar a que se encontrava mais ao topo, utilizando de sua força para movê-la, fazendo com que a mesma deslize para o interior do túnel. Apesar do peso descomunal da rocha, Lanthys consegue forçá-la para o interior, todavia, a mesma vai de encontro ao solo, colidindo-se com este com grande força devido a altura em que se encontrava, ao ponto de se partir em vários pedaços, gerando muito mais ruído do que o planejado.

Era possível adentrar através da abertura gerada, saltando para o interior do corredor, mesmo sem remover as demais rochas. No entanto, caso tentem deixar o local rapidamente, ter de escalar novamente pode ser um empecilho, pois as rochas que ainda bloqueavam a passagem somavam quase quatro metros de altura...

Após empurrar o grande pedaço de rocha Lanthys observa o corredor que se estendia por cerca de cinco metros, terminando em outro salão adiante que dá a impressão de estar iluminado de forma um pouco mais intensa, no entanto, o corredor aparentava dar acesso a uma das extremidades do salão, não sendo possível ver o que havia em seu interior. Buscando encontrar uma forma de remover as pedras de forma segura para adentrar no corredor, o cavaleiro não consegue imaginar nada efetivo a não ser removê-las manualmente.

Observando de uma distância maior, a sacerdotisa também busca uma solução para liberar o caminho e percebe diversas possibilidades. Como já observado, Lanthys poderia facilmente cortar os pedaços de rocha com sua espada, fragmentando-as de modo a abrir caminho, o colega também poderia tentar removê-las cuidadosamente uma a uma, liberando o caminho sem fazer muito ruído, ou até mesmo fazer uma rampa removendo os pedaços mais altos, apoiando-os nos mais baixos facilitando a travessia. Parecia possível apenas remover algumas rochas que estavam na parte mais baixa sem remover as superiores e provocar a queda das mesmas, mas certamente exigiria cuidado redobrado*. Infelizmente a sacerdotisa não se via capaz de contribuir em remover manualmente as rochas, pois visivelmente cada uma destas passava dos cem quilos.

Algumas das soluções observadas por Selene pareciam levar mais tempo do que outras e cabia a ela decidir qual a melhor opção. Todavia, enquanto raciocinavam a respeito de como executar a travessia, os investigadores podem ouvir ruídos que aparentam ser algum tipo de impacto distante de onde se encontram...

Seguindo as instruções de Selene, o cavaleiro utiliza-se de sua lâmina do CABAL para triturar os pedaços de rocha negra que bloqueavam a passagem. Com um golpe vigoroso e extremamente preciso do cavaleiro, a espada garou de Lanthys desliza sem dificuldade entre as rochas, abrindo caminho para o corredor à frente dos investigadores, o qual dava acesso a um segundo ambiente, que não se podia observar com clareza de onde se encontravam.

Os estranhos sons semelhantes a fortes impactos persistem por algum, mas não pareciam se aproximar da torre, se mantendo ao longe. Passados alguns instantes os ruídos cessam de forma tão abrupta como iniciaram, não deixando pistas a respeito do que se tratavam. Só restava aos investigadores prosseguirem em busca do espírito...

Os investigadores cruzam o corredor agora desobstruído até adentrarem no próximo salão, sendo este bem maior que o primeiro, tendo algo em torno de cinquenta metros de diâmetro. O ambiente era dividido em dois níveis, sendo o inicial no mesmo nível do corredor, cerca de dez metros adiante o piso estava em torno de dois metros acima, havendo uma espécie de rampa rudimentar nas laterais interligando a parte mais baixa à superior. Ao redor do salão haviam chamas de baixa intensidade e coloração azulada, produzidas por estranhas esferas suspensas junto às paredes por correntes negras. Apesar da luminosidade gerada pelas esferas, os investigadores não podiam mensurar exatamente a altura do ambiente cuja extensão se perdia em meio a escuridão acima deles.

Até se posicionar no interior do salão, o cavaleiro que buscava notar qualquer ruído preocupante não consegue perceber nada de alarmante, certamente haviam ruídos se propagando pela torre negra, mas nada parecia próximo aos investigadores. Entretanto, Lanthys logo nota algo que lhe chama atenção, ao centro da parte mais alta havia um estranho altar de quase dois metros de altura que aparentava ter sido construído a partir de dezenas de fragmentos metálicos retorcidos e pontiagudos, estando adornado por algumas esferas azuladas semelhantes as que se encontravam ao redor do ambiente. Posicionado ao topo do altar havia um crânio metálico de feições idênticas ao do anel espiritual possuído pelo jovem cavaleiro, todavia, suas dimensões são significantemente diferentes, sendo muito maior do que um crânio humano.

Após adentrarem no salão, os investigadores observam as esferas azuladas que iluminavam o local, o estranho altar e o grande crânio metálico buscando fazer sentido a tudo aquilo, todavia, apesar de já terem uma ideia do que encontrariam, ambos não conseguem racionalizar a respeito, não conseguindo chegar a nenhuma conclusão imediata de como proceder.

Eis que ambos são surpreendidos pela relíquia sobre o altar, a qual abre suas pupilas metálicas, revelando um intenso brilho avermelhado em seus olhos. O crânio idêntico ao do anel espiritual de Lanthys parece se mover levemente, passando a fitar os dois visitantes e, logo em seguida, uma voz metálica e ressoante se propaga como uma navalha entrecortando o ambiente.

- Além de perturbarem meu sono, o que fazem seres humanos nas profundezas do submundo?... Se chegaram até aqui por acaso é melhor que se retirem, agora.

A voz do misterioso ser dá a impressão de fazer com que as chamas azuis que rodeiam o salão diminuam de intensidade, estremecendo como se ressoassem com suas palavras.

A face metálica permanece direcionada à Lanthys enquanto este faz suas colocações, em seguida movendo-se levemente passando a fitar Selene quando a jovem se apresenta, batendo suas pálpebras metálicas uma ou duas vezes enquanto permanecia em silêncio. Logo após concluírem o que tinham de dizer, o misterioso ser torna a se pronunciar com o mesmo timbre metálico de antes, fazendo sua mandíbula se mover e estalar enquanto retruca com um certo sarcasmo.

- Bela história garoto e você tem um bom gosto para anéis, mas não tenho ideia do que diabos estão falando. Tenho residido nesta torre negra por tanto tempo quanto posso me recordar, alguns milhares de anos provavelmente, apesar de já ter perdido a conta... mas isso não importa. Sou conhecido como Guardião da Sabedoria e vez ou outra um humano como você vem até aqui me questionar algo, geralmente a respeito do submundo ou mesmo da superfície, então se quiser perguntar algo faça-o, caso o contrário dê a volta e deixe este lugar antes que perca sua vida. Horrores bem menos sociáveis do que eu espreitam no exterior e provavelmente já notaram sua presença aqui.

A voz metálica do autoproclamado Guardião da Saberia ecoava nas negras paredes rochosas do ambiente, assim como na mente dos investigadores que muito provavelmente não esperavam ouvir o que acabara de ser proferido por aquele que provavelmente seria o espírito que outrora residia no anel herdado pelo jovem cavaleiro Garou.